Quarta, 27 Novembro 2024

Clemente Ganz Lúcio é sociólogo e diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese)

O São Paulo é uma cidade muito grande e reúne a complexidade das virtudes e dos problemas que afetam o País. A Rede Nossa São Paulo (www.nossasaopaulo.org.br), organização social que reúne e articula entidades e movimentos para tratar do desenvolvimento do município, tem realizado um trabalho muito interessante para pensar o futuro e intervir no presente. Nesta semana, lançou mais uma pesquisa sobre “Trabalho e renda – viver em São Paulo”, produzida pelo Ibope Inteligência, com informações relevantes.

Atualmente, a cidade de São Paulo tem uma população economicamente ativa de 6,3 milhões de pessoas, das quais 5,3 milhões estão ocupadas e 1 milhão desempregadas (15,8%, taxa de desemprego média de 2018, PED, Seade/Dieese). Os empregos estão concentrados no setor de serviços (63%), depois no comércio (18%), seguido pela indústria (13%) e pela construção civil (6%).

Os assalariados com Carteira assinada são 52% dos ocupados. Cerca de 18% são autônomos, 8% são assalariados sem Carteira assinada, 7% são trabalhadoras domésticas e outros 7% são servidores públicos. Perto de 1/3 da força de trabalho vive na informalidade, sem proteção laboral e social.

A cidade vive as consequências da desindustrialização precoce da economia brasileira. O dinamismo do mercado de trabalho sofre com a estagnação ou regressão da atividade industrial. As mudanças indicam crescimento da precarização e da informalidade.

O município é um centro dinâmico capaz de mobilizar e alavancar a base industrial do País, pois conta com uma estrutura complexa de serviços, acúmulo de capital e força de trabalho altamente capacitada. Desgraçadamente, os governantes e a elite econômica abandonam nossa indústria e entregam ao estrangeiro a soberania do desenvolvimento.

A pesquisa da Rede Nossa São Paulo analisa dezenas de aspectos interessantes. Um deles, confirma que alimentação, moradia, transporte e saúde são os itens que mais pesam no orçamento dos trabalhadores. Quatro questões sobre as quais as políticas públicas podem e devem atuar de maneira intensa e extensa.

Uma alimentação barata e de boa qualidade pode ser produzida e distribuída com uma política de apoio à agricultura familiar e ao pequeno produtor rural, com estratégia e suporte para o abastecimento alimentar. Uma política de construção de habitação de interesse social, ou de reforma de prédios abandonados, anima a atividade econômica, gera empregos e propicia qualidade de vida aos trabalhadores, aumentando o salário disponível devido à economia com o aluguel. A oferta pública de saúde, com serviços de qualidade e de baixo custo, impacta positivamente múltiplas dimensões da vida e aumenta a produtividade do trabalhador. Há muito o que fazer para que o crescimento econômico se transforme em desenvolvimento social.

O transporte é um assunto específico. Além do custo, que poderia e deveria ser bem menor, ou mesmo gratuito (como algumas cidades do mundo já fazem), há os problemas da qualidade dos veículos e do tempo gasto com deslocamentos. A pesquisa revela que, em média, o trabalhador gasta diariamente 1 hora e 40 minutos com deslocamento para o trabalho. Mais de 20% da população entrevistada gasta mais de duas horas! Por mês, são quase 40 horas balançando em um ônibus. No ano, são 50 dias, de uma jornada de 8 horas, nesse perrengue. Uma pessoa empregada trabalha cerca de 250 dias por ano (22 dias por mês, durante 11 meses) e gasta, em média, mais 50 dias para se deslocar para o trabalho na cidade de São Paulo. Isso é insano, isso é São Paulo! Por isso, o tratamento da questão do transporte é tão relevante.

O desemprego faz sofrer 1 milhão de paulistanos. No Brasil, há 5.570 municípios e somete 17 deles têm mais de 1 milhão de habitantes! Portanto, 5.553 municípios no Brasil têm população total menor que o contingente de desempregados na cidade de São Paulo.

O desemprego atinge a todos, mas de maneira mais intensa e cruel aos jovens e idosos. Mais de 30% dos desempregados demoram mais de dois anos para encontrar um emprego. Os serviços públicos de intermediação deixam a desejar, seja porque o governo federal abandonou essa política e deixou toda a responsabilidade para o município, seja porque a cidade é incapaz de enfrentar e resolver diretamente a grave crise econômica que assola o País e muito pouco pode fazer para contrariar as políticas econômicas que fazem o Brasil andar de lado na economia. Mas, é na cidade que o trabalhador vive o drama do desemprego, do arrocho salarial e das carências das políticas públicas da União, do Estado e da Prefeitura.

A Pesquisa e o trabalho da Rede Nossa São Paulo oferecem subsídios valiosíssimos para planejar o futuro da cidade, imaginando qual será o trabalho do futuro e de que maneira os cidadãos farão da cidade o espaço de construção das condições para viverem bem. O desafio é desenhar um projeto de desenvolvimento que olhe para as vocações, os problemas e as potencialidades da cidade, permitindo organizar a superação dos entraves para fazer da cidade um espaço para se viver bem. Essas questões devem e podem ser superadas por movimentos como Nossa São Paulo e ou iniciativas como as declaradas pela Secretaria de Desenvolvimento do Munícipio. Tudo exige de todos continuidade, persistência, criatividade, diálogo e compromisso com a cidade, com o cidadão e com o recurso público.

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