José Carlos de Assis é economista. Artigo publicado, originalmente, no site da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet)
É claro que os capitalistas teriam graves problemas com seu caixa porque não teriam como aplicá-lo com segurança. É que eles são muito críticos da dívida pública mas na hora de guardar dinheiro preferem títulos do governo aos papéis emitidos pelo setor privado, de segurança duvidosa.
Os bancos são os guardiães do dinheiro entesourado pelos capitalistas. Recebem uma remuneração por conta. Esse dinheiro é remunerado integralmente pelo Banco Central sem qualquer contrapartida de investimento. Milton Friedmann, o pai do monetarismo, dizia que não existia algo como almoço grátis na economia. É um equívoco. Os bancos recebem almoço grátis, isto é, juros toda vez que guardam reservas no Banco Central.
Voltemos ao ponto inicial. Os economistas ditos ortodoxos só são tolerantes com déficits orçamentários quando sua origem são gastos de defesa. Mas aí temos outro problema. Gastos de defesa, do ponto de vista financeiro, são da mesma natureza de um gasto orçamentário qualquer. Como o déficit público costuma ser associado a surtos inflacionários, não há nada que explique o fato pelo qual o gasto com defesa não gera inflação.
Até aqui foi possível argumentar que o déficit público beneficia os capitalistas e não gera inflação. Agora convém explicar por que os banqueiros não gostam dele. A razão é estupidamente simples: déficit público aumenta o dinheiro em circulação na economia e por isso força a baixa da taxa de juros. Não é necessário explicar por que os banqueiros não gostam de taxas de juros baixas; isso afeta diretamente seus ganhos.
Mas há outra razão pela qual banqueiros não gostam de déficits públicos: é que o déficit em geral corresponde a gastos públicos sociais que beneficiam proporcionalmente mais os pobres dos que os ricos - o que é considerado um “roubo” pelos banqueiros, uma espécie de Robin Wood ao contrário. Quando o gasto público se destina a salários, e não a investimento, os banqueiros ficam ainda mais exasperados em relação ao déficit.
Agora vamos analisar a questão do déficit do ponto de vista do interesse público, e não do interesse dos banqueiros. Primeiro, vamos admitir que uma economia em rápido crescimento não deve ter déficit público. Nesse caso, o Governo deve gastar o que arrecada, nem mais nem menos. Mas a economia pode entrar em recessão ou depressão, como é nosso caso hoje. Nesse caso surge um problema: de onde virá a recuperação?
A característica da crise é uma queda da demanda efetiva, ou seja, uma situação na qual as pessoas não tem dinheiro suficiente para comprar tudo o que a economia oferece. O desemprego agrava a situação. Com isso, os empresários não investem, pois estará sobrando mercadorias nas prateleiras. O único setor da economia que pode retomar os investimentos sem ter que se preocupar com a demanda é o setor público.
O besteirol neoliberal – ou seja, os economistas que racionalizam os interesses dos banqueiros – sustenta que se o governo equilibrar o orçamento os empresários terão confiança para voltar a investir. É uma patacoada. Como o empresário pode ter confiança na recuperação da economia se suas prateleiras estão cheias, sem perspectiva de venda? O empresário pode até manter o nível de produção, mas aumentar nunca.
Tudo isso tem pouca importância em relação ao lado humano que é mantido escondido pelos neoliberais: o desemprego. Uma alta taxa de desemprego é uma desgraça para milhões de famílias. Não colocar o combate ao desemprego como prioridade absoluta de governo é um crime de lesa-pátria. O mais grave é que conhecemos muito bem os meios de acabar com o desemprego. São os fâmulos do neoliberalismo que nos impedem de usá-los.