Quinta, 28 Novembro 2024

Gustavo Hoffman é especialista em Direito do Trabalho do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados

A questão sobre o vínculo ou não dos motoristas de aplicativos com as empresas de tecnologia está rendendo uma boa polêmica no Judiciário brasileiro. Recente decisão da 15ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-SP) decidiu que um motorista do aplicativo Uber possui vínculo empregatício com a empresa responsável pelo respectivo utilitário digital.

A decisão – assim como diversas tantas outras sobre o tema no judiciário brasileiro – gira em torno de uma dúvida ocorrida no Brasil e nos diversos outros países em que a Uber e outras empresas do gênero estão presentes com seus aplicativos de motorista particular. Foi a primeira no nosso país favorável ao lado do motorista, reformando a decisão contrária ocorrida na primeira instância, na 38ª Vara do Trabalho de São Paulo.

A desembargadora relatora do caso, Beatriz de Lima Pereira, determinou que a empresa deve realizar o registro na carteira de trabalho do condutor e pagar os valores referentes a aviso prévio, férias, FGTS, multa rescisória, entre outros.

Beatriz de Lima entendeu que o aplicativo da Uber não se trata apenas de uma ferramenta eletrônica, pois a plataforma não está simplesmente à disposição dos motoristas. Há uma determinação do preço dos serviços, do percentual do faturamento destinado aos motoristas e a avaliação dos usuários sobre os serviços condiciona a permanência da parceria com a empresa.

A tecnologia que poderia ser entendida como apenas uma facilitadora de uma parceria foi colocada na decisão como um instrumento patronal. A desembargadora mencionou a Lei n. 12.551/2011, que introduziu novo texto ao artigo 6º da CLT, o qual prevê em seu parágrafo único que “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio".

Contudo, ainda é preciso ter cautela em relação ao impacto da decisão ao modo como a relação entre motoristas particulares e aplicativos como a Uber é enxergada no Brasil.

Há ainda hoje uma posição majoritária da nossa jurisprudência - inclusive perante o Tribunal Superior do Trabalho, instância superior ao TRT-SP - que interpreta a atividade do motorista particular de aplicativo como sendo a de um autônomo que se utiliza dessas plataformas apenas para exercer a sua atividade e sem que haja uma subordinação nessa relação. Esse entendimento pressupõe que, uma vez que os motoristas geralmente não são obrigados pelas empresas a cumprirem horários e metas de trabalho, estão livres para se manterem disponíveis aos passageiros quando bem entenderem.

Exigências como as observadas pela desembargadora do tribunal paulista têm sido vistas pela doutrina e jurisprudência majoritárias como obrigações relacionadas ao modelo de negócios em questão, que não se tratam de subordinação prevista na legislação do trabalho. Este entendimento é alterado apenas no caso de empresas como a Uber imporem ao motorista jornada de trabalho determinada e retirarem, desse modo, a autonomia que é vista neste modelo de parceria.

De qualquer forma, o entendimento da desembargadora demonstra, sim, que há espaço no Judiciário para decisões favoráveis ao trabalhador e contrárias ao entendimento majoritário. É uma primeira decisão que pode nortear que casos análogos sejam julgados no sentido de se reconhecer o vínculo empregatício em uma questão é tema de discussão não apenas no Brasil, como em todo o mundo.

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