Terça, 07 Mai 2024

Acidentes ocorrem por falhas humanas, de projeto ou de execução, por defeitos de materiais ou por causas imprevistas
O acidente da estação Pinheiros da linha 4 do Metrô consternou São Paulo e o País. Os dramas das vítimas e de suas famílias ocuparam a maior parte do espaço da mídia. A par disso, ficou no ar uma sensação de que o estágio tecnológico já conquistado pela engenharia nacional não justificava tamanha tragédia material e humana. Nesse torvelinho de emoções muitas confusões jurídicas foram feitas. Convém, assim, esclarecer alguns aspectos.

A construção da linha 4 foi objeto de licitação, tendo sido vencedor o consórcio de empresas que se denominou “Via Amarela”. Trata-se de um contrato de obra pública, sob a égide da Lei n° 8.666/03, denominada Lei de Licitações. O primeiro esclarecimento, pois, é que não se trata de um contrato de parceria público-privada (PPP), veículo jurídico regulado por lei diferente (Lei n° 11.079/04). Por decisão do Metrô, o contrato de construção foi celebrado no conceito de turn key, onde a obrigação do contratante, no caso o consórcio, é a de entregar a obra concluída, correndo todos os riscos daí decorrentes, técnicos, econômicos, financeiros e outros por sua conta. Essa modalidade de contrato é cada vez mais comum no mundo moderno e assemelha-se ao velho contrato de empreitada, ajuste muito conhecido no Direito brasileiro.

As vantagens desse tipo de contrato são duas: o preço fixo e a transferência da responsabilidade. Em uma obra com as dimensões da linha 4 fica evidente a tranqüilidade proporcionada pela fixação do preço. Por outro lado, os quadros internos do Metrô, por mais competentes, seriam insuficientes para a obra, motivo pelo qual terceiros deveriam em qualquer hipótese ser contratados. Nessas circunstâncias, a encomenda da obra por um regime de empreitada era mesmo o mais conveniente. Portanto, o acidente não decorreu nem do tipo de contrato adotado, muito menos de uma omissão do Metrô. Acidentes ocorrem por falhas humanas, de projeto ou de execução, por defeitos de materiais adotados ou por causas absolutamente imprevistas, como falhas geológicas não conhecidas e pouco prováveis, de acordo com pesquisas razoáveis e cuidadosas, feitas com o “estado da arte” conhecido.

Aliás, acidentes ocorrem sempre e com muito mais freqüência do que se pode imaginar, no Brasil e no mundo. O Pavilhão da Gameleira em Belo Horizonte ruiu como uma caixa de papelão, em 1971, apesar de projetada a sua estrutura de concreto por um dos maiores projetistas de concreto conhecidos na ocasião. No mesmo ano, desabou no Rio, o elevado Paulo de Frontin, da mesma maneira repentina e inesperada com que o solo escorregou no acidente do Metrô. Em ambos os casos, as vítimas foram em muito maior número. Para não se restringir ao Brasil, cabe lembrar o desastre que o mundo assistiu com a nave Columbia e a recente tragédia do metrô de Londres. Essas inúmeras experiências nos ensinam que o progresso e as grandes realizações não se fazem sem problemas e, infelizmente, em algumas vezes, sem vítimas. Foi assim, assim é e assim será.

Fato acontecido, convém analisar as responsabilidades, de acordo com o direito (e sem conhecimento dos vários contratos e ajustes celebrados entre as partes, que podem conter cláusulas e condições que alterem alguns aspectos do que aqui será dito).
Caso fique comprovada falha, o responsável por ela tem a obrigação de indenizar. Independentemente do que diga o contrato, a responsabilidade decorre do artigo 927 do Código Civil que determina que “aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. O conceito de ato ilícito está contido no artigo 186, que dispõe que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, ... causar dano a outrem...comete ato ilícito”. O Código Civil deixou de mencionar a imperícia, também contida no conceito de culpa. O ato além de ser ilícito, tal como conceituado, deve ter dado causa ao acidente, pois a responsabilidade é de quem “causa” o dano.

Ouro aspecto a ser ponderado é o do tipo de responsabilidade a ser imputada. O conceito acima é o da responsabilidade subjetiva, onde se busca um ato ilícito. Cada vez mais o Direito aplica a responsabilidade objetiva, isto é, que independe de culpa. O próprio parágrafo único do mesmo artigo 927 prescreve que “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (o que não nos parece seja o caso). Além disso, o artigo 618 do mesmo Código manda que “nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”.

As empresas componentes do consórcio têm excelente tradição técnica e excepcional quadro de profissionais. Por outro lado, o Metrô também abriga um excelente plantel de experiências e dedicados técnicos. Portanto, as responsabilidades serão certamente assumidas e os danos repostos. Continuaremos a lamentar a perda de vidas humanas, como de resto em todos os acidentes que acontecerem.

Fonte: DCI - 23 JAN 07

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