O ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTB-AL) quebrou o silêncio nesta quinta-feira para defender a manutenção do sigilo eterno de documentos ultrassecretos do governo brasileiro. Ao afirmar que tem o apoio da presidente Dilma Rousseff em sua posição, o senador disse que a defesa da manutenção do sigilo em alguns documentos oficiais não é uma "questão pessoal" para preservar informações do seu governo ou do ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), mas uma "questão de Estado".
Collor relatou conversa que manteve com Dilma este mês, quando a presidente teria se mostrado "sensibilizada" e "disposta a encontrar a melhor solução" para o impasse dos documentos secretos. "Ela que veio ao Congresso e entregou o projeto ao então presidente da Câmara, Michel Temer. Esta é a posição do governo (o projeto inicial). Quando chegou à Câmara, esse projeto foi de alguma maneira adensado com uma série de maneiras que contém segundo a minha avaliação, salvo maior juízo, algumas imperfeições que necessitam ser corrigidas."
O ex-presidente negou que queira esconder informações referentes ao seu governo, ou de Sarney, ao afirmar que "todos os documentos" de sua gestão estão abertos. "Eu fui presidente há cerca de 20 anos. Então todas as informações em relação ao meu governo já estão inteiramente disponíveis. Em relação ao governo do presidente Sarney, a mesma coisa."
Ex-presidente apresentou 11 sugestões ao projeto
Em pronunciamento na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, Collor apresentou 11 sugestões de mudanças no projeto que trata do sigilo de documentos oficiais - que tramita na Casa depois de ser modificado pela Câmara.
Entre as mudanças sugeridas pelo senador, está a manutenção de informações referentes ao presidente da República como secretas. Elas deixariam de ter a vinculação ao término do mandato presidencial para serem divulgadas. Collor alega que o prazo de divulgação de informações secretas é de 15 anos, por isso já "extrapola" o mandato do presidente, ainda que reeleito.
O senador também sugeriu retirar do projeto a obrigatoriedade de divulgação de documentos sigilosos na internet para "evitar uma verdadeira oficialização do wikileaks" transformando-a em "possibilidade" de as informações serem veiculadas na rede mundial de computadores. O ex-presidente defende que as informações sejam publicadas no Diário Oficial da União, e não na internet.
Collor criticou a comissão mista de reavaliação de informações, no modelo em que está instituída pelo projeto, porque teria "mais poderes" que a própria presidente da República. O senador teve o apoio de diversos membros da comissão, que elogiaram o fato de Collor ter afirmado que as informações de seu governo estão públicas. "Fico tranquilizada quando Vossa Excelência destaca que são informações pertinentes a acordos, a atos. Não se trata de discutir questões de interesse deste ou daquele governo, mas de Estado", disse a senadora Ana Amélia (PP-RS).
Michel Temer apoia a medida para os papéis ultrassecretos
O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), defende o sigilo eterno dos documentos ultrassecretos do governo. Em rápida entrevista, nesta quinta-feira, no Recife, ele afirmou que o sigilo com possibilidade de prorrogações só deve caber no caso dos atos relativos à segurança nacional, fronteiras e relações internacionais, classificados como ultrassecretos e "portanto os mais graves do País".
"Em relação aos atos em geral, sou a favor do sigilo por prazo determinado", destacou, ao frisar: "não é sigilo de todo e qualquer documento". Embora defenda o prazo de 25 anos com prorrogações a cada 25 anos para os documentos ultrassecretos, o vice-presidente observou que nada impede que daqui a 25 anos, se entenda que não seja necessário prorrogar o sigilo.
Quanto à intenção do governo federal de manter em segredo os orçamentos da Copa 2014 e Olimpíadas 2016, Temer afirmou que "na verdade o que há é uma flexibilização do sistema de licitação". Segundo ele, sem prejuízo de fiscalização: "Não significa que não vai haver fiscalização em função dessa flexibilização".
O vice-presidente almoçou com o governador Eduardo Campos (PSB) e participou da abertura de seminário sobre reforma política promovido pela Federação das Indústrias de Pernambuco e apoio da OAB-PE. Na sua palestra, voltou a defender o voto majoritário para o Legislativo.
Lula defende prazo fixo
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que não concorda com a ideia de "sigilo eterno" para documentos secretos do governo federal, dentro do debate que ocorre no Legislativo sobre o projeto da Lei de Acesso à Informação Pública. Questionado por repórteres, ele disse que defende a existência de um prazo, mas deixou em aberto a possibilidade de "maiores cuidados" quando o documento tiver relação com outro país.
"Sigilo eterno não, não existe nada que exija sigilo. Acho que tem de ter um prazo, a não ser que seja um documento entre dois estados, que precisa ter mais cuidado. Mas o restante, acho que o povo tem mais é que saber", disse Lula nesta quinta-feira. Na prática, a necessidade genérica de "mais cuidado" pode ser uma defesa da renovação do prazo fixado de confidencialidade.
Hoje, a regra vigente para documentos classificados do governo reserva prazos de divulgação de 5 anos para dados "reservados", 10 anos para os "confidenciais" e 20 anos para os "secretos". No caso dos papéis "ultrassecretos" o período é de 30 anos, mas pode ser prorrogado indefinidamente. Em 2009, Lula enviou um projeto ao Congresso que modifica essas regras, fixado em 25 anos o prazo dos documentos ultrassecretos, mas mantendo a possibilidade de renovação ilimitada. Na Câmara, foi feita uma emenda à proposta que limita a uma vez a renovação do sigilo, isto é, com um prazo máximo de 50 anos. Agora o debate está no Senado, onde o PT chegou a se rebelar contra o Planalto, que quer retornar ao texto original.
Fote: Jornal do Comércio - RS