Há anos, Silvio Santos repete um ritual antes de gravar seu programa: vai até a plateia - formada exclusivamente por mulheres - e conta piadas. O "esquenta" só termina depois de quase uma hora, quando o apresentador, um dos maiores e mais queridos comunicadores da História da televisão brasileira e dono do Grupo Silvio Santos, que reúne 44 empresas, entre elas o SBT, percebe que suas "colegas de trabalho" estão às gargalhadas. O sorriso que gosta de ver em cada uma delas é o mesmo que mantém no rosto há 80 anos, idade que completa hoje.
A alegria - presente até no slogan do SBT, "A TV mais feliz do Brasil" - também é mantida nos momentos de crise, como o que começou há cerca de um mês, numa espécie de inferno astral. Em novembro passado, uma fraude no Banco PanAmericano, que pertence ao conglomerado de Silvio, fez com que o Patrão recorresse a um empréstimo de R$ 2,5 bilhões e desse seu patrimônio como garantia, incluindo o SBT.
A reação do Homem do Baú? Protegido pelo ambiente seguro de seu auditório, ele fez piada: perguntado pelo humorista Sérgio Mallandro se tinha algum dinheiro para emprestar, disse: "Logo eu? Mas eu tô pendurado!".
A trajetória de Silvio Santos daria mais do que um filme - enredo de escola de samba já deu, em 2001, quando foi homenageado pela Tradição. Seria, no mínimo, uma novela mexicana, daquelas que ele adora colocar na programação.
Trajetória
Filho de pai grego e mãe turca, nasceu na Lapa, no Rio, e tem cinco irmãos. O roteiro dessa história seria incrível o suficiente se contasse apenas o caminho percorrido pelo menino camelô, ex-paraquedista do Exército e radialista até se transformar num dono de televisão. Mas, ao longo desses 80 anos, Silvio conseguiu marcar sua biografia com uma candidatura à Presidência em 1989; com o sofrimento, 12 anos depois, ao ver Patrícia, uma de suas seis filhas, ser sequestrada; e, em 2003, numa atitude enigmática, com uma entrevista-pegadinha na qual disse estar à beira da morte.
Desta vez, Silvio não quis falar. Mas Íris Abravanel, sua mulher há quase 30 anos, ajudou a desvendar um pouco da personalidade de Senor Abravanel (verdadeiro nome de Silvio). "Muitos jovens não possuem a disposição que meu marido tem para enfrentar os riscos e as dificuldades com tanta coragem e ousadia. Como demonstrou neste ano, que foi um dos mais difíceis de toda nossa vida. A atitude dele fez meu coração explodir de orgulho e alegria pelo privilégio de conviver com um homem correto, digno e honestíssimo", afirma Íris, em carta enviada por e-mail.
Braços direitos
Consultora de dramaturgia do SBT e autora de novelas (ela está escrevendo seu próximo folhetim, "Corações feridos"), Íris elogia a conduta do apresentador e diz que nada mudou nos bastidores da emissora paulista depois da crise. Filha e braço direito de Silvio no SBT, a diretora Daniela Beyruti, de 34 anos, tenta traçar um perfil do pai.
"Desde sempre ele quis nos ensinar o valor do dinheiro, que dinheiro não cai do céu e que é preciso trabalhar para conseguí-lo. Quis que aprendêssemos desde cedo que os valores mais preciosos da vida não são riquezas, mas honestidade, integridade e respeito", diz ela.
Funcionária do SBT há 23 anos e diretora de programas da casa, Silvia Abravanel, de 39 anos, também filha do empresário, fala da convivência em família e no trabalho: "Desde que comecei a trabalhar com o senhor Silvio, ele logo de cara me mostrou que da porta para fora era meu pai. No ambiente de trabalho, era chefe. Como pai, posso dizer que ele é um baita amigo. Já tive meus probleminhas de adolescente e, por ter perdido minha mãe cedo, ele se tornou meu confidente", lembra Silvia, adotada no primeiro casamento do apresentador com Maria Aparecida Abravanel.
Livro dos recordes
E como Silvio Santos vem aí há muito tempo, com ele também vem junto uma caravana de fãs e não apenas as que o apresentador tem dentro de casa.
À frente do "Programa Silvio Santos" desde 1968, na TV Paulista, ele viu a atração entrar para o Guiness, livro dos recordes, em 1993, como um dos programas mais duradouros da TV. Silvio, que estreou na televisão em 1962 com o programa "Vamos brincar de forca", também passou pela TV Globo, onde ficou por quatro anos, até 1976, quando levou sua atração, naquela época já um grande sucesso, para a TV Tupi e, depois, para a Rede Record.
Mas, naquela época, a ideia de ter um canal só para ele já estava a caminho: em 1975, por decisão do presidente Ernesto Geisel, o empresário passou a operar o canal 11, no Rio, batizado de TV Studios (TVS). Seis anos depois, nascia o SBT, canal 4 em São Paulo. Daí em diante, foi uma coleção de sucessos, hoje transformados em clássicos, como "Domingo no parque", "Show de calouros", "Qual é a música?", "Porta da esperança", e "Topa tudo por dinheiro"?
"A maior atração do ´Programa Silvio Santos´ é ele próprio", enfatiza César Filho, apresentador do programa "Boletim de ocorrências".
Ex-titular do "Domingo legal", Gugu Liberato esteve ao lado de Silvio por 35 anos. O apresentador, que surpreendeu com sua ida para a Record em 2009, guarda lembranças dessa parceria: "Certa vez, estávamos gravando, quando eu, que trabalhava como diretor de palco, fui avisado que o caixa que pagava os cachês estava sendo assaltado. Discretamente contei-lhe o que estava acontecendo e ele disse: ´Vamos continuar a gravação´", recorda.
Um homem de palavra
O empresário que já ficou conhecido por sempre mexer na programação e estrear programas em segredo, ao sabor dos índices de audiência, é um homem que cumpre o que fala. "Renovei o contrato com ele há um tempo e tanto eu, quanto meu advogado, deixamos passar um detalhe que significava um dinheiro bom. Mas Silvio fez questão de seguir o que já estava combinado", conta Celso Portiolli.
Tanto que a atitude do empresário agora com o caso do Banco PanAmericano não surpreendeu os que o cercam. "A história do banco não mudou nada na emissora. Seria injustiça se isso afetasse em alguma coisa a carreira desse homem", defende Marília Gabriela, que apresenta o "De frente com Gabi" no canal. "Vou contar uma coisa louca. Não tenho contrato com o SBT. Acertei fazer o programa por seis meses (em maio) e agora o meu acordo é de boca".
A credibilidade destacada pelos funcionários se reflete no mercado publicitário. "A forma como Silvio lidou com o fato passou segurança aos anunciantes", analisa a publicitária Carolina Moliterni, Mídia da agência Conexão Brasil, que lida com executivos do SBT.
Para 2011, o canal vai investir em dramaturgia. Além da trama de Íris Abravanel, terá "Amor e revolução", de Tiago Santiago. "O auge das novelas do SBT está por vir. Vamos disputar a liderança", promete o autor.
Curiosidades
Nos bastidores do dono do baú
Em seu camarim, há cerca de 12 ternos - das marcas Ricardo Almeida e Camargo Alfaiataria - , 50 abotoaduras, 400 lenços de seda, 50 pares de meia e 15 sapatos.
Silvio adora lavar louça.
O apresentador encara a malhação de domingo a domingo. Ele faz uma hora de esteira enquanto assiste a programas estrangeiros e filmes.
Seus livros preferidos são biografias.
Silvio adora doces e chocolates. Também é fã de sorvete de gianduia (chocolate com pasta de avelã).
É considerado bom de garfo.
Silvio começa a ficar preocupado quando a balança passa dos 75 quilos.
Ele tem uma casa na cidade de Celebration, na Flórida.
Quando viaja, um de seus programas favoritos é ir ao supermercado.
Tem seu próprio fogão no camarim, onde gosta de fritar seu próprio bife com queijo.
Não tem superstições.
Silvio adora assoviar.
É fanático por cinema. Gosta de ver filmes diariamente.
Exigência do patrão? Que os banheiros de sua emissora estejam sempre impecáveis.
Ele tem cinco netos: quatro meninas e um rapaz.
No Rio, Silvio tem simpatia pelo Flamengo. Em São Paulo, torce pelo Corinthians. Silvio também adora assistir aos jogos da seleção brasileira.
Gosta de reunir a família para o jantar.
É eclético no estilo musical: ouve Julio Iglesias, Gal Costa, Roberto Carlos, Martinho da Vila, Angela Maria, Frank Sinatra e Elvis Presley.
NATALIA CASTRO
AGÊNCIA O GLOBO
Fonte: Diário do Nordeste
