A empresa de tratamentos odontológicos alegou não ter como pagar sua dívida de R$ 221 milhões. E os pacientes que já pagaram R$ 20 mil, R$ 30 mil em tratamentos, foram pegos de surpresa.
Você imagina o que é gastar R$ 20 mil, R$ 30 mil por um tratamento e, de repente, descobrir que a empresa que você contratou faliu? O Fantástico conta a história da falência de uma das maiores empresas de odontologia do país, que pegou de surpresa milhares de clientes em 11 estados brasileiros.
Pacientes desinformados: "Foram enrolando, enrolando, enrolando. Marcaram para eu vir hoje. Cheguei aqui e está fechado", conta o aposentado Osvaldo de Moura. "Vim reclamar e a porta fechada, não tem ninguém aqui", afirma a cabeleireira Roseli Macedo. "Era a coisa que eu mais sonhava. Era um sonho", declara a gerente Sonia Oliveira Barbosa. "Eu só queria meus dentes, mais nada. Olha o que foi que eu ganhei: um par de algemas", diz o comerciante Marcos Pereira Lacerda.
Em todo Brasil, foram 27 clínicas fechadas, 25 mil clientes sem receber explicação e com um enorme prejuízo. "Eles me cobraram R$ 17 mil", diz o comerciante Marcos Pereira Lacerda. "Paguei R$ 12 mil à vista, adiantado", conta o aposentado Osvaldo de Moura.
Na sexta-feira, 8 de outubro, a empresa de tratamentos odontológicos Imbra pede a própria falência à Justiça. Não tem como pagar a dívida gigantesca de R$ 221 milhões.
Muita gente foi até o prédio da empresa com consulta marcada sem saber que a Imbra tinha pedido autofalência e encontrou a porta fechada e o prédio vazio. Só em uma clínica na Zona Sul de São Paulo, quase 1,5 mil pessoas ainda estão em tratamento. Muitas fizeram cirurgias delicadas e precisam retirar os pontos da boca. Outras não viam a hora de colocar a prótese definitiva. Mas o tão sonhado sorriso novo pode virar agora um pesadelo sem fim.
"A gerente me falou que realmente tinha falido e que era para todo mundo pegar suas coisas e ir embora", conta a funcionária da Imbra Françoise Gomes Pereira. "Devia ter umas 15 pessoas na sala de espera para ser atendido. Acredito que uns seis pacientes sendo atendidos", enumera a dentista e funcionária Daniela Velho.
A Imbra era especialista em implantes dentários. É um tratamento muito caro, usa peças metálicas de titânio para sustentar dentes artificiais.
Marcos Pereira fazia um tratamento de R$ 17 mil na clínica do Morumbi, bairro nobre de São Paulo: "Na unidade do Morumbi, só vai gente rica e não vai fechar. Cheguei lá e vi a porta fechada. Entrei em desespero", conta.
Marcos invadiu a clínica e levou um monitor e computador e dois microondas. Foi preso em flagrante. Ele já tinha passagem pela polícia por porte ilegal de arma há dois anos. "Para eles, não faz diferença R$ 5 mil, R$ 10 mil, R$ 17 mil, mas para mim faz. Eu vendo sorvete para poder pagar isso", conta Marcos.
A Imbra estava na mira do Conselho Regional de Odontologia desde 2008, por conta da propaganda ostensiva. "Convidando as pessoas para consultas gratuitas. Chegava à clínica pessoal treinado por esses empresários e induzia os clientes a assinarem cheques pré-datados", aponta Emil Adib Razuk, do Conselho Regional de Odontologia de SP.
A promessa atraiu uma família de Taboão da Serra, na Grande São Paulo. "Ganhamos juntos uns R$ 3 mil. Pagamos R$ 1,2 mil de dente", conta a cuidadora de idosos Adriana de Souza Avelino.
O casal deu 24 cheques em um valor total de R$ 27 mil. Donizete é caminhoneiro. Extraiu cinco dentes e espera o implante de nove. Por enquanto, está com os dentes provisórios. "A clínica agiu de má fé, porque, se ela sabia que não estava indo bem, como ela foi fazendo tratamento e pegando vários cheques?", critica Adriana.
"A maioria não entende que a gente não tem culpa. Eles acham que a gente já sabia e não avisou nada", desabafa a funcionária Letícia Contreras Medeiros.
Uma semana antes de fechar as portas, a Imbra avisou seus dois mil funcionários que, pelo terceiro mês seguido, não pagaria os salários. Em casos de falência, a Justiça determina: “Os credores trabalhistas estão na ordem de preferência, em primeiro lugar”, afirma o advogado especialista em falências Luiz Antonio Miretti.
Saudar a dívida com os clientes, só se sobrar dinheiro. "Existe a possibilidade de o consumidor não conseguir reaver esse valor pago à Imbra", diz Maíra Feltrin Alves, advogada do Instituto de Defesa do Consumidor.
O paciente que se sentir prejudicado deve recorrer à Justiça. "De 2006 até hoje, gastei, mais ou menos, de R$ 26 mil a R$ 30 mil", conta a dona de casa Sumiê suzuki.
A dona de casa não aceita o prejuízo e fala com o dentista que tratava dela.
A gerente da Imbra Mariana Terreri relata que boa parte dos pacientes está com o tratamento pela metade: "Risco tem. De vida, não. Mas de perder o implante, de perder a prótese, da prótese não ficar boa", declara.
A Imbra foi comprada há apenas quatro meses pela empresa Arbeit. "A Imbra não deu um golpe nos pacientes. Quando nossos clientes tomaram posse na empresa, encontraram uma quebra de caixa de mais de R$ 100 milhões", diz o advogado da Arbeit/Imbra Esper Chacur Filho.
A empresa odontológica pertencia ao grupo GP, que, em nota, respondeu que o novo comprador, a Arbeit, teve tempo suficiente para avaliar a situação da Imbra e que, durante sua gestão, atendeu os pacientes sem atraso e pagou os funcionários em dia.
A Imbra promete ajudar: colocou um telefone à disposição dos pacientes que quiserem de volta seus prontuários.
Segundo o advogado, já foram entregues à Justiça mais de R$ 8 milhões em cheques pré-datados de clientes. A Imbra diz que não vai descontá-los.
Por enquanto, só há uma saída. Quem quiser terminar o tratamento, vai ter que gastar ainda mais. "Eles vão ter que procurar outras empresas odontológicas, outros dentistas que possam vir a atendê-los", aponta o advogado.
Fonte: Fantástico - Rede Globo