Terça, 21 Janeiro 2025

A última operação do governo envolvendo a emissão de dívida pelo Tesouro Nacional para, supostamente, garantir a presença do BNDES no aumento de capital da Petrobras foi a típica decisão equivocada normalmente tomada em ambientes fechados sem maior discussão.

Supostamente, porque, enquanto acionista da Petrobras como parte do controle da estatal exercido pelo Tesouro, o BNDES poderia com seu caixa acompanhar o aumento de capital para não ser diluído. Ou seja, manter a mesma participação original, 7,7% do capital total.

A lambança começa quando o presidente Lula decide usar o processo de capitalização da Petrobras – concebido para o acionista custear parte de seu volumoso plano de investimentos, sobretudo no pré-sal -, para reforçar a parcela do Estado no capital da empresa.

O Estado a controla com mais de 50% das ações com direito a voto, mas sobre o capital total a parcela era menor, cerca de 40%. Subiu para algo como 48%. Ter a fatia do Estado ampliada aumenta também os dividendos repassados ao Tesouro, que serão crescentes quando a exploração do pré-sal entrar em regime ai por volta de 2020.

A forma de contemplar estes dois desejos (a Petrobras ter fundos para investir que não viessem apenas de dívidas e o Estado ampliar sua fatia no capital) esbarrava em dois obstáculos. O da falta de recursos ao Estado, exaurido pela política de gastos do governo, foi contornado com a cessão de 5 bilhões de barris equivalentes de petróleo à Petrobras. Toda reserva de petróleo é sempre da União.

O governo, portanto, subscreveu a parte do Tesouro - ou seja, do Estado –, com petróleo a ser explorado pela própria Petrobras. E o que ela precisava de dinheiro vivo teria de vir de seus acionistas privados, boa parte investidores estrangeiros. Até ai, embora sob ressalvas dos acionistas minoritários, a operação estava redonda.

A maneira encontrada para contornar o segundo obstáculo a tornou quadrada: a dificuldade do governo de cumprir a meta de superávit primário, o dinheiro retido do orçamento fiscal para amortizar um pedaço da dívida pública a cada ano. A meta foi fixada em 3,3% do PIB, resultado difícil em ano eleitoral, quando os gastos fiscais disparam, e com o agravante do orçamento federal já vir apertado.

BNDES entra de gaiato

O governo decidiu usar a capitalização da Petrobras também para simular a realização da meta de superávit primário deste ano. E é isso o que explica o novo aporte do Tesouro ao BNDES, que entrou de gaiato na confusão. Foi decisão temerária, já que decidida sob o pressuposto que os financiadores da dívida pública são toscos e desconhecem as contas nacionais. O governo não precisava disso.

O novo empréstimo do Tesouro ao BNDES nada tem a ver com os dois aportes anteriores, no início de 2009, de R$ 100 bilhões, e este ano, de R$ 80 bilhões – o primeiro, para suprir o travamento do mercado financeiro externo pela crise global, e o segundo, para assegurar a continuidade do ciclo de investimentos da economia.

Melando o instrumento

Os dois aportes receberam críticas por alargar a dívida pública e implicar subsídio - resultante da diferença entre a taxa de juros cobrada pelo BNDES, 6% ao ano, e o custo da dívida emitida pelo Tesouro, que acompanha a Selic, hoje a 10,75%. Mas em muitos casos a questão é fazer ou não um projeto relevante, como hidrelétricas, com taxa de retorno nominal de 8% ao ano, e efetiva de 2%, caso de Belo Monte. O problema não é o subsídio, mas o que ele viabiliza.

É sob tal ótica que se questiona a intervenção da Fazenda visando não alavancar a política industrial, mas para simular a realização da meta cheia de superávit. Como? O BNDES comprou mais ações que o necessário para não ser diluído no capital da Petrobras, e o Fundo Soberano, sob a guarda da Fazenda, foi acionado com o mesmo fim.

Fetiche de burocrata

O esquema permitiu ao Tesouro subscrever menos ações do que podia com a cessão dos barris de petróleo, creditando-se assim do valor do capital da Petrobras comprado pelo BNDES e pelo fundo soberano – cerca de R$ 30 bilhões, que vão para o superávit primário.

Como o caixa do BNDES seria desfalcado com a compra adicional de ações, o Tesouro fez o novo aporte ao banco, agora de R$ 24,7 bilhões. Foi um exercício tortuoso para realizar uma meta que parece ter virado fetiche de burocrata.

O governo não a cumpriu, de fato, em 2009. E não vai realizá-la outra vez. Em vez de assumir uma meta realista, estimada em 2% do PIB, o governo arrisca a credibilidade da política econômica ao pretender um resultado impossível.

Triangulação quadrada

A redução da dívida pública sobre o PIB é consistente desde o fim de 2002, quando estava em 60,6%. Em 2009 fechou em 42,9% do PIB e, este ano, tende a 41%. Tal redução abriu o espaço para a queda dos juros de 25% ao ano, em 2002, para 8,75%, estando hoje em 10,75%.

Esse resultado se relaciona com a confiança nas contas do Estado, além de apontar a zeragem do déficit efetivo do orçamento fiscal, projetado pela Fazenda para 2014, permitindo Selic nominal abaixo de 6% ao ano. Só que não se chegará a tanto com superávit primário maquilado, e, sim, com aumento insofismável da poupança pública, o que não haverá com a triangulação Tesouro-BNDES-Petrobras.

A dívida pública estaciona com primário abaixo de 1% do PIB. Mais que isso é para viabilizar o crescimento econômico sem sequela de inflação, juros altos, câmbio desajustado. O autoengano serve a quê?

Fonte: Antônio Machado do Cidade Biz

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