Entre os 499 cartórios de Pernambuco, 197 têm à frente pessoas que assumiram sem fazer concurso público. Muitas delas não faturam R$ 100. Vários outros, porém, faturam dezenas de milhares de reais por mês e há quem receba até R$ 1,5 milhão por mês mensalmente. A partir do mês que vem, por ordem do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), o grupo que não fez concurso terá um teto para os ganhos, um salário máximo fixado em R$ 24.117. O valor do contracheque desagradou aos titulares dos cartórios, que consideram a medida inconstitucional e vão à Justiça.
O presidente do TJPE, desembargador José Fernandes de Lemos, ressalta que o Estado acompanha a determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), emitida no mês passado, de realizar concurso público para esses cartórios.
Na mesma ocasião, o CNJ limitou os ganhos dos titulares dessas serventias a 90,25% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). “A medida já vale para agosto”, reforça o presidente do Tribunal de Justiça.
Essa discussão sobre o concurso na área é fundamental para entender a nova briga.
Desde o início do Brasil, os cartórios, uma herança portuguesa, eram destinados a notáveis do mundo político. Isso criou verdadeiras dinastias nessa atividade, com as serventias em uma mesma família.
A Constituição Federal de 1988, porém, determinou a realização de concursos públicos para os cartórios. Poucos Tribunais de Justiça, responsáveis diretos pela organização da atividade, fizeram as seletivas e, ainda assim, encararam brigas que duraram anos e que foram até o STF.
Em julho de 2009, o Conselho Nacional de Justiça, instância máxima administrativa do Judiciário, determinou que os tribunais de cada Estado afastassem milhares de titulares de cartórios e exigiu a realização dos concursos. No mês passado, depois de um ano analisando cada recurso, o CNJ ratificou sua decisão e estabeleceu prazo para concursos em 5.561 cartórios declarados vagos – em que os titulares nunca fizeram os concursos públicos.
Assim, determinou o Conselho, até que ocorram concursos, os cartórios não poderão aumentar salários de funcionários, ampliar quadro de empregados ou alugar imóveis, entre outros. Qualquer aumento de gastos será submetido ao TJPE. Mensalmente, os cartórios enviarão balancetes detalhados à Justiça.
Além disso, no entendimento do CNJ, os titulares de cartórios vagos, enquanto interinos na função, devem ser considerados servidores públicos, daí o limite de ganhos.
No Estado, a determinação veio pela instrução normativa 13/2010.
“A medida fere a Constituição Federal violentamente, porque o Conselho Nacional de Justiça está tratando pessoas que exercem atividade de caráter privado como servidores públicos. Quando quer prejudicar a atividade, o CNJ considera o titular do cartório um servidor. Mas, quando é para beneficiar, diz que não é, como na hora de conceder aposentadoria”, critica o assessor jurídico da Associação dos Notários e Registradores de Pernambuco (Anoreg-PE), Israel Guerra.
Ele diz que ainda há recursos em análise dos cartórios no próprio CNJ. “É a primeira iniciativa pública de limitação de renda no campo privado do Brasil, uma loucura no campo constitucional. Acreditamos que essa medida será objeto de discussão judicial tanto da Anoreg, quanto da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen)”, avalia Guerra.
Fonte: Jornal do Commercio