Segunda, 27 Janeiro 2025

Ao lado da chinesa e da chilena, a indústria de computadores no Brasil é uma das raras no mundo em que os fabricantes locais detêm uma participação de mercado invejável, competindo com gigantes multinacionais de igual para igual. Das 11,8 milhões de unidades produzidas no País em 2008 - incluídos nessa conta computadores de mesa e portáteis - os integradores brasileiros abocanharam 77% de participação, apurou a International Data Corporation (IDC).

O mercado é particularmente pulverizado e quem lidera a produção de computadores há quatro anos é a brasileira Positivo Informática, com 15,6% de participação no quarto trimestre de 2008, a dezenas de milhares de unidades mensais à frente de marcas mundialmente conhecidas como as americanas Dell e HP, ou a chinesa Lenovo (que adquiriu a divisão de PCs da IBM).

Também o ritmo de crescimento desta indústria chama a atenção. O País possui a quinta posição em volume, atrás dos Estados Unidos, China, Japão e Reino Unido. No ano passado, não fosse a queda de 16,8% nas vendas do último trimestre, a produção física no ano teria aumentado acima dos 20%, estima Luciano Crippa, analista de mercado de computadores do IDC.

Com o revés da crise internacional, que atingiu em cheio o crédito ao consumidor final e, por tabela, as vendas no varejo, a expansão consolidada no ano foi de 10,6%. Apesar da desaceleração do último trimestre, o índice é muito superior ao encontrado na maioria dos grandes mercados. Segundo o IDC, 2009 apresentará uma retração de 11,5% no volume de unidades, com recuperação a partir das vendas de Natal, em dezembro. Mesmo assim, estima a consultoria, até 2010, o País conquistará a 3ª posição entre os fabricantes de computadores.

Segundo a Intel, mais de 20 mil empresas compram seus chips no País para montar computadores, sem contar as que adquirem os componentes no exterior e o importam. "O mercado nacional está bem distribuído em três fatias", informa a gerente de marketing de consumo da fabricante de chips, Denise Pereira. "Os grandes integradores brasileiros, as multinacionais, e um grupo de milhares de pequenos integradores", conta. Segundo ela, boa parte do sucesso das empresas locais reside em três características: profundo conhecimento do mercado, agilidade e flexibilidade para lançar produtos afinados com a demanda.

"Em geral, as empresas brasileiras são muito eficientes em eleger e desenvolver nichos: algumas se especializam em máquinas voltadas para as pessoas aficcionadas em jogos eletrônicos (gamers); outras, em equipamentos baratos; ou em computadores destinados a setores específicos, como as agências de publicidade, que requerem máquinas potentes, capazes de rodar soluções que requeiram imagens de alta definição", exemplifica. Segundo Denise, nem mesmo o mercado corporativo, mais exigente em suas demandas de pós-vendas, assusta integradores médios. "O segmento de pequenas empresas no Brasil já está bem estruturado e tem encomendas de 10 ou 15 máquinas por vez; essa demanda também vem sendo suprida, em boa parte, pelos fabricantes locais", comenta.

Claudio Vita, vice-presidente comercial da Itautec, empresa que tem se focado no mercado corporativo de grandes empresas e nas licitações de todas as esferas de governo, tem a sua explicação para o sucesso das fabricantes nacionais: "temos no País um conjunto de regras que equiparam as grandes multinacionais aos fabricantes locais, como HP ou Dell". Segundo ele, a Itautec tem filiais em vários países, entre os quais Argentina, Estados Unidos e Venezuela. Mas nesses mercados, só disputa os segmentos de automação bancária, comercial e serviços de TI. "Só sou competitivo em computadores no Brasil", admite. Sua escala menor, na casa de centenas de milhares de PCs por ano - em relação aos gigantes internacionais, com seus milhões de equipamentos produzidos por ano - é compensada no Brasil pelos incentivos dados pelo governo, de um lado, e pelas mesmas dificuldades do ambiente econômico brasileiro, de outro. "As múltis, ao serem levadas a produzir aqui, enfrentam os mesmos problemas na importação de componentes, greves na Receita Federal, mudanças de regras e forte variação cambial", diz Vita, da Itautec.

Nacionais têm muito mais flexibilidade

Para ele, as multinacionais levam vantagem frente aos fabricantes nacionais quando fornecem para outras grandes multinacionais. "Vender uma marca brasileira para a Coca-Cola é muito difícil. A decisão de compra é feita na matriz, que define o equipamento para todas as subsidiárias", conta Vita. "Mas em outras contas corporativas, principalmente no caso de empresas nacionais, somos competitivos", acrescenta. A estratégia é oferecer, além do equipamento, um pacote de vantagens, incluindo, por exemplo, facilidades de aquisição por meio de operações de leasing, além de serviços de instalação e manutenção do parque do cliente, aproveitando a capilaridade da Itautec para o atendimento de bancos e varejistas em todo o País.

Hélio Rotenberg, presidente da Positivo Informática, concorda com o concorrente quanto à competitividade restrita ao Brasil. À frente de uma produção de 323,1 mil equipamentos no primeiro trimestre do ano, admite que sua empresa chegou a estudar lançar-se na vizinha Argentina. "Ao invés, optamos por estrear no mercado corporativo no Brasil mesmo", diz. "Conseguimos neste trimestre alcançar um volume de 33,8 mil unidades para o mercado corporativo no Brasil. Se fôssemos para a Argentina, o investimento e esforço para vender os mesmos 33,8 mil obrigatoriamente seria muito maior".

A sensibilidade para captar os desejos e o potencial de consumo do brasileiro também constam das credenciais da Positivo. Em 2008, a empresa vendeu 1,6 milhão de máquinas - um avanço de 15,5% sobre 2007 - e que resultou em faturamento de R$ 2,3 bilhões.

Dois em um

Segundo Rotenberg, a empresa tem foco no Brasil. Esse direcionamento permitiu aos seus executivos perceber, por exemplo, que o grande anseio da família de classe C ascendente era, ao mesmo tempo que comprar o seu primeiro computador, adquirir uma segunda televisão. "Com isso em mente, lançamos há 2,5 anos o PCTV, um computador que permite ao usuário assistir à TV em sua tela, ao mesmo tempo que usá-lo como PC", exemplifica o executivo. Hoje o produto é o carro-chefe da Positivo, respondendo por 20% das vendas ao varejo.

A empresa também foi a primeira a lançar o netbook no mercado brasileiro, ainda em maio de 2008. A família de equipamentos, batizada linha Mobo, é, em média 37% mais barata que os notebooks e vendeu em apenas sete meses do ano passado 43,6 mil unidades. O equipamento já responde por 20,7% das vendas da categoria dos notebooks.

Na Semp Toshiba Informática, braço do grupo Semp Toshiba focado em computadores e monitores, a meta da empresa é faturar mais de 5% este ano sobre os R$ 650 milhões de 2008.

Caio Ortiz, vice-presidente da STI resume a estratégia da empresa: apostar em nichos exclusivos, de qualidade, os quais, até aqui, estavam inacessíveis ao consumidor devido à barreira de preço. Vários lançamentos estão planejados: netbook com tela de 10,2 polegadas, para estudantes universitários.

Outra aposta são notebooks blindados contra variações eletromagnéticas, poeira e água, com capacidade de aguentar quedas de até um metro e meio de altura. O modelo mais barato dessa linha deverá chegar ao varejo a R$ 5 mil, um valor bem abaixo dos importados.

No caso da Daten, fabricante sediada no polo tecnológico de Ilhéus, na Bahia, o foco principal entre 2001 a 2007 era o governo. "Temos o know how das licitações", admite Frederico Andrade, diretor comercial. Até dois anos atrás, toda a produção era destinada a atender às concorrências ganhas nas mais diversas esferas e órgãos de governo. Apenas em 2008 a empresa diversificou a sua atuação para também vender ao varejo, onde, entre suas ofertas está um computador especialmente focado nos aficcionados em jogos. Com a diversificação, alcançou a produção de 36 mil desktops e 12 mil notebooks no ano. Variação cambial interfere

Em 2009, conta o executivo, a intenção é dirigir 40% da produção ao varejo, sem deixar de lado o atendimento ao governo. Segundo ele, a empresa espera crescer 30% este ano, principalmente sobre o espaço deixado pelos menores integradores que não aguentaram o impacto da forte variação cambial desde a crise internacional. "Alguns deles saíram do mercado com a crise e queremos abocanhar essa fatia", resume. A empresa, inclusive, mudou-se de lugar, instalando-se em um novo galpão com capacidade de produzir 10 mil unidades por mês, o dobro do anterior.

Flexibilidade contagiosa

Mas, ainda que alguns integradores tenham, de fato, saído desse mercado, para o IDC eles ainda têm um peso na concorrência. "Na última lista de Processo Produtivo Básico (PPB) a que tive acesso, de 2008, havia mais de uma centena de empresas autorizadas pelo governo a usufruir dos benefícios fiscais previstos em lei", comenta Crippa, do IDC. O próprio IDC acompanha 36 deles de perto.

Para o analista, a flexibilidade dos brasileiros não tem passado desapercebida pelos fabricantes internacionais. "Prova disso é que a própria Dell tem se adaptado ao crescimento do mercado no varejo", diz. Ele cita o fato de a grande fabricante internacional, mundialmente famosa por vender diretamente ao consumidor final por meio de transações online, ter se rendido à adoção de intermediários para a distribuição de seus computadores no varejo.

Fonte: Gazeta Mercantil

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