A indústria está costurando um acordo com os bancos para tentar uma solução que evite uma onda de ações judiciais contra empresas que fizeram contratos com derivativos. Para evitar que se repita no Brasil o que aconteceu nos derivativos nos Estados Unidos - um dos principais causadores da atual crise global - a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) anunciou, ontem, que vai procurar nos próximos dias a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) para negociar uma solução para o problema. Essa situação poderia prejudicar não apenas as empresas, mas toda a economia, que poderia ser abalada por perdas significativas, em caso de condenações.
Os valores envolvidos ainda não são conhecidos, mas sabe-se que são volumes consideráveis se levarmos em conta as perdas já anunciadas por Aracruz e Sadia, que somaram, respectivamente, US$ 2 bilhões e R$ 554 milhões.
"Não há ainda dados confiáveis que nos permitam antever qual é o tamanho da crise em derivativos, mas os empresários sabiam dessa possível variação", disse o professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Fábio Ulhôa Coelho, que participou do encontro do Conselho Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da Fiesp. No entendimento dele, a crise já era anunciada e, por isso, o empresário não poderia ter "ignorado" as diversas análises antes do caos econômico.
Dezenas de associadas de médio e grande porte da Fiesp já vinham procurando a direção da Fiesp porque tiveram problemas com operações com derivativos cambiais. Por isso, a federação reuniu especialistas que, após mais de duas horas de reunião fechada, chegaram à conclusão de que o melhor a ser feito é sentar à mesa com os bancos, antes de enfrentar os tribunais.
"O melhor caminho é a negociação. Bancos e empresários serão convidados à conciliação. Tentaremos uma aproximação com a Febraban. Por hora, o melhor é negociação", disse o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), Sydney Sanches, que presidiu o encontro.
Segundo ele, a Fiesp coloca à disposição dos associados a Câmara de Mediação e Conciliação da federação para que exista o debate, antes de partir para uma arbitragem ou para a via judicial. "Não vamos entrar no terreno da legalidade, mas ficar apenas no da negociação", disse Sanches. Para ele, é importante às instituições bancárias estabelecer uma negociação, já que isso evitaria contratos com inadimplentes. "Tenho certeza de que os bancos vão ter interesse em que as empresas sejam adimpletes", aposta o ministro.
Desconfiança
As perdas em contratos de derivativos faz com que os bancos tenham receio de oferecer créditos a essas empresas. É o que acredita o ex-diretor do Banco Central, Emilio Garofalo Filho, que participou do debate de ontem como convidado especial. Para ele, os bancos precisam sentir segurança em oferecer créditos novamente.
"Na medida em que se dimensionar o prejuízo das empresas, até o câmbio vai se estabilizar", aposta. "Quando os empresários conseguirem um acordo razoável com os bancos, câmbio e crédito voltam a fluir e haverá redução da volatilidade", afirmou Garofalo Filho.
Na opinião dele, a negociação com as instituições bancárias, no entanto, deve ser imediata. "Negociar não é uma figura de retórica para ser feita a longo prazo, mas sim o mais rápido possível", disse. E o ex-diretor do Banco Central alfinetou o setor de exportação: "O exportador está numa situação curiosa. Ele ficou quatro anos pedindo pelo amor de Deus, ou pelo amor do governo, para que a taxa subisse. Agora que ela subiu, ele não consegue se aproveitar disso".
O diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, que não pôde comparecer ao encontro de ontem, chegou a anunciar que a idéia é criar uma espécie de Plano Brady privado, inspirado no acordo em 1989 que renovou a dívida externa de países em desenvolvimento afetados por uma crise de crédito e liquidez por meio da troca da dívida por bônus, com descontos, garantias, juros mais baixos e prazos mais longos. "Manter essa situação numa condição de litígio é prejudicial às empresas e aos bancos", disse Fonseca, que também não revelou número de empresas envolvidas em perdas com contratos de derivativos.
Fonte: DCI - 25 NOV 08