O setor privado será o motor que puxará os investimentos em infra-estrutura nos próximos quatro anos no País. Apesar da ofensiva estatal em grandes projetos de energia, entre 2008 e 2011, 60,5% do capital que será aplicado na construção de ferrovias, estradas, estações de tratamento de água e de esgoto, hidrelétricas e na expansão da produção de minério e aço sairá do bolso privado.
A cifra soma R$ 82,7 bilhões, recurso que virá de financiamentos de longo prazo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), de capital próprio das empresas (nacionais ou estrangeiras) e da captação externa. O valor total em contratos para obras de infra-estrutura no período é de pelo menos R$ 136 bilhões.
Os governos federal e estadual responderão pelos 39,5% restantes, ou R$ 53,9 bilhões. Os números são resultado de um levantamento das obras de infra-estrutura no Brasil até 2011, usado no planejamento das grandes construtoras. O trabalho, assinado pela VAE Consultores, compilou todos os editais, licitações e concorrências abertas pelos governos federal, estadual e por mais 30 grandes grupos empresariais que lançaram planos de investimentos para os próximos anos no País.
Fora os investimentos empresariais incluídos nessa conta, o estudo considerou algumas obras listadas nos planos orçamentários dos governos. O cálculo não inclui todas as obras previstas no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), consideradas, por ora, meras intenções.
"Uma situação é aquela em que o projeto está no planejamento, outra é quando o empreendimento entra na linha orçamentária dos governos", afirma Francinett Vidigal Junior, diretor-presidente da VAE Consultores. Muitas obras do PAC ainda não chegaram à fase de orçamento. O objetivo do levantamento foi o de ficar o mais próximo possível da realidade. Isso significa que, se o PAC andar, o número poderá ser maior.
Um exemplo claro dessa situação é o setor energético. A estimativa de investimentos em geração e transmissão de energia elétrica previstos no PAC alcança a cifra de R$ 62 bilhões até 2010, R$ 50,4 bilhões para geração e R$ 8,2 bilhões para transmissão. O levantamento da VAE mostra que em obras firmes o investimento atinge, por enquanto, R$ 21 bilhões. O crescimento da economia tem ampliado as incertezas quanto à real capacidade de expandir a oferta de infra-estrutura em nível suficiente para suprir a demanda.
O trabalho cita a expectativa do Operador Nacional do Sistema Elétrica (ONS), responsável por administrar o parque gerador nacional, na expansão da oferta. Segundo o ONS, no período de 2007 a 2011, o Brasil teria de expandir a capacidade de geração em 16,5 mil MW. Há, neste ano, uma pequena sobra de 1,74 mil MW médios. Em 2011, já será negativa em 700 MW médios. Nos investimento em energia, o PAC é mais otimista do que o estudo da consultoria.
Mineração
O setor de mineração brasileiro lidera a lista de investimentos no período de 2008 a 2011. O conjunto da atividade mineral, segundo levantamento da VAE Consultores, aplicará R$ 50,4 bilhões, capital que financiará o crescimento da exploração mineral no Brasil (da busca de ouro ao minério de ferro, passando por cobre e níquel), além de pesquisas de novas reservas no subsolo brasileiro.
No rastro da mineração vem o siderúrgico. A VAE identificou planos para R$ 26,9 bilhões. Juntos, os setores responderão por R$ 77,3 bilhões dos R$ 136 bilhões previstos até 2011. Entre os projetos considerados nesse levantamento estão a duplicação da capacidade de produção de minério de ferro em Carajás, com a abertura da mina de Serra Sul em Carajás, a abertura de jazidas de cobre e níquel e a ampliação da estrada de ferro Carajás, por onde a Vale escoa o minério para o mercado internacional.
O trabalho incluiu projetos como o da MMX (que desenvolve agora com a Anglo American três sistemas, localizados no Amapá, Minas Gerais e Corumbá). A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) também foi incluída na lista, com planos de expansão da produção de aço para o mercado internacional e, principalmente, por causa dos investimentos na expansão da produção de minério de ferro na mina Casa de Pedra, localizada em Congonhas, município da região do Quadrilátero Ferrífero mineiro.
O setor rodoviário, entre concessões e obras governamentais, receberá R$ 19 bilhões em capital para investimentos. Os demais setores são: saneamento (R$ 8,7 bilhões), concessões (R$ 5,4 bilhões) e ferrovias (R$ 4,4 bilhões). A conclusão do estudo da VAE Consultores, mais do que apresentar os números, alerta para uma importante mudança de comportamento. O investimento em infra-estrutura no Brasil voltou a ser um bom negócio. Segundo Francinett Vidigal, diretor-presidente da consultoria, a estabilidade econômica e política, somada à baixa atratividade dos juros internacionais, tornou o Brasil opção para remuneração do capital.
Entre as mudanças principais está a redução das taxas de retorno dos investimentos, relata o consultor. No início dos anos 1990, quando o Estado de São Paulo decidiu implantar um programa de concessão de rodovias, os investidores exigiam taxas de até 20% de retorno por ano. "Essa taxa caiu hoje para 5% a 9%. É uma mudança fenomenal", diz Vidigal.
Saneamento básico
O marco regulatório do setor de saneamento básico, que completou um ano em janeiro, está abrindo o mercado para as companhias privadas. Com regras definidas sobre a atuação em concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs), elas ampliam sua participação na prestação de serviços de água e esgoto dos municípios do País e devem injetar R$ 3 bilhões por ano nas próximas duas décadas.
Segundo estimativas da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), somente este ano, as empresas privadas devem fechar de 15 a 20 contratos de saneamento com os municípios - o dobro de 2007. "A roda do saneamento, que estava parada, começou a girar", diz o presidente da Abcon, Yves Bessa.
O Grupo Odebrecht foi responsável por boa parte dos novos contratos privados no ano passado. Ganhou quatro, entre concessões e PPPs. No início de 2007, o grupo adquiriu da francesa Suez a fatia de 50% que faltava para controlar integralmente a empresa de saneamento de Limeira, no interior de São Paulo. O apetite deve continuar este ano.
"Estamos de olho em duas licitações no Rio de Janeiro e negociando com quatro empresas", informa Fernando Reis, presidente da Odebrecht Engenharia Ambiental, divisão criada pelo grupo em novembro do ano passado. Com os novos contratos e aquisições, a empresa, que antes estava em apenas dois municípios, vai investir R$ 200 milhões. O grande impulso para investimentos e criação da Odebrecht Ambiental foi a entrada em vigor da nova legislação. "A regulamentação tornou o mercado mais estável e atraente para o investidor", salienta Reis.
A Abcon diz que a retomada do interesse privado é um sinal positivo de reorganização do setor. "Em dez anos, as empresas privadas devem absorver 30% das operações de água e esgoto", afirma o presidente da entidade. Hoje, apenas 5% do mercado - cerca de 70 municípios - está com essas companhias. O otimismo também se justifica pelas condições macroeconômicas.
"O cenário está favorável ao financiamento de longo prazo", acredita Bessa. A entrada das empresas no setor de saneamento começou em 1995, quando foi promulgada a Lei das Concessões, que permitia aos municípios celebrar contratos com empresas para prestação dos serviços de água e esgoto.
Fonte: Jornal do Comércio - 06 FEV 08