Segunda, 03 Fevereiro 2025
 

Recém-empossado na presidência da “nova” Cia. Docas de São Sebastião, criada a partir de convênio firmado entre o governo do Estado de São Paulo e o governo federal, o engenheiro Frederico Victor Moreira Bussinger falou com exclusividade para o PortoGente. Ele, que já passou pelo Porto de Santos e deu consultoria a outros portos brasileiros, agora atraca o seu navio em São Sebastião. E vem pronto para fazer uma gestão eficiente. Sabe das (grandes) diferenças entre os portos de Santos e São Sebastião, mas não se importa com o tamanho, “quem não é o maior tem que ser o melhor”.

 

Diplomático, Bussinger prefere não dar opinião sobre as novas direções portuárias, empossadas pela Secretaria Especial de Portos (SEP), “não tenho como fazer tal avaliação. Aliás, penso que nem me caberia”. Por outro lado, deixa a diplomacia de lado quando o assunto é passar a direção do Porto de Santos para as mãos do estado e diz que isso “segue sendo uma bandeira, um projeto” do governo José Serra.

 

PortoGente – O senhor já trabalhou na Codesp e agora assume a presidência da recém-criada Cia. Docas de São Sebastião, que está sob o poder do governo do estado. Qual a experiência que o senhor levará do Porto de Santos para o Porto de São Sebastião?

Frederico Bussinger – O período que passei em Santos foi um marco na minha vida profissional. Mais ainda pessoalmente. Lembro-me daqueles anos, dos desafios, dos projetos, das realizações e, principalmente, das pessoas com muito carinho e, até, com saudade. Ajudei a transformar e também fui transformado, confirmando Eduardo Galeano para quem “nós somos o que fazemos para deixar de ser o que somos”. Sua pergunta é bastante ampla, complexa. Mas, se é para se resumir em um único ponto, este foi o fortalecimento da convicção, confirmada em outros portos onde atuei posteriormente como consultor, que transformações são possíveis. E que, no caso específico dos portos, isso depende de projeto claro e de muita articulação.

 

PortoGente – Porto de Santos e Porto de São Sebastião são água e óleo, não se misturam? Ou o senhor vê um papel de complementaridade entre os dois? Se sim, quais os fatores que o senhor destacaria para esse papel para que os dois portos atuem de modo integrado?

Frederico Bussinger – Quando se fala de São Sebastião muitas vezes faz-se confusão: Uma coisa é o (grande) terminal da Petrobrás ali localizado. Outra coisa é seu “porto público”, a ser administrado pela Cia. Docas de São Sebastião. A área hoje ocupada pelo Porto de Santos é cerca de 100 vezes maior que a do “porto público” de São Sebastião, atualmente, e 20 vezes maior que sua área máxima utilizável. Em 2006, Santos movimentou cerca de 160 vezes mais cargas que São Sebastião. Por conseguinte, ainda que se quisesse, eles não seriam competidores globais. Isso pode acontecer (e acontecerá!) em alguns nichos de mercado, nos quais o Porto de São Sebastião buscará elevados padrões de qualidade e eficiência. Parodiando peça publicitária de alguns anos atrás, “quem não é o maior tem que ser o melhor”. Todavia, mesmo se analisado funcionalmente, o adequado é que eles sejam complementares e desempenhem papéis específicos na rede infra-estrutural de transportes e na logística do Estado, este é um pilar importante para um novo ciclo de desenvolvimento de São Paulo. Essa é a diretriz do Governo Estadual.

 

PortoGente – O senhor teve uma gestão polêmica na Codesp, como a privatização do TECON. Como esta esse processo que gerou até uma ação no TCU?

Frederico Bussinger – Polêmica? Não sei a que você se refere. Pelo contrário: acho que é amplamente majoritária a visão de que o processo de reformas, do qual eu participei (sim, pois ele resultou de um esforço coletivo), entre 1995 e 1998, foi uma inflexão importante na história do Porto de Santos para que ele deixasse de ser “uma favela irrecuperável”, como avaliou o grande brasileiro Eliezer Batista em entrevista de meados de 1995. Com as medidas sistematizadas no “Projeto Santos-2000” e no “Programa de Arrendamentos no Porto de Santos – PROAPS”, a produtividade de embarque/desembarque cresceu 5, 10, 15 vezes; as filas de navio, antes de até seis semanas, praticamente desapareceram; os custos caíram em até 2/3; a movimentação mais que duplicou; e assim por diante. Tudo isso como resultado de investimentos atraídos e comprometidos em volume superior a ½ bilhão de dólares, das novas regras que possibilitaram seu funcionamento 24 horas/dia, 365 dias por ano, e de diversas outras mudanças institucionais e gerenciais. O arrendamento do TECON, certamente o maior deles, foi apenas um caso particular; processo que, diga-se de passagem, até onde sei, não foi contestado nem no TCU, nem pelo MP, nem na Justiça. 

 

PortoGente – Como será o relacionamento Porto de São Sebastião/Governo do Estado de São Paulo e a Secretaria Especial de Portos do governo federal?

Frederico Bussinger – Pelo que tenho lido, o objetivo da SEP é resolver gargalos e dinamizar os portos. Esse é também o objetivo do governo do Estado, tanto em relação a São Sebastião como a Santos, apesar de ainda não participar diretamente de sua gestão. É bom lembrar que o governo federal, através da SEP, e o governo do Estado de São Paulo vêm celebrar um Convênio de Delegação do Porto por 25 anos, prorrogáveis por igual período, com atribuições e obrigações de ambos os lados que, certamente, serão cumpridas. A criação da Cia. Docas de São Sebastião é uma das primeiras ações dentro desse Convênio.

 

PortoGente – O senhor acompanhou as últimas nomeações para as Autoridades Portuárias, como a de Santos. Como o senhor avalia essas novas diretorias, principalmente a da Codesp?

Frederico Bussinger – Não tenho como fazer tal avaliação. Aliás, penso que nem me caberia. Desejo apenas sucesso aos novos dirigentes e, como representante do governo do Estado indicado para o CAP, coloco-me à disposição para apoiar todo e qualquer esforço que vá no sentido da melhoria da qualidade, da eficiência e da capacidade do Porto de Santos.

 

PortoGente – O governo do estado abriu mão da proposta de estadualizar o Porto de Santos?

Frederico Bussinger – Não. E isso ficou mais uma vez claro em recente visita do governador à Baixada. A regionalização segue sendo uma bandeira, um projeto. Enquanto isso não se efetiva, porém, o importante é que o Porto de Santos funcione bem, dada sua importância estratégica para a economia paulista e brasileira. O governo do Estado está atento e apoiará ações gerenciais nesse sentido. Da sua parte, fará o que estiver ao alcance para tanto, como é o caso dos projetos do Rodoanel, da Nova Bandeirantes, do Ferroanel, etc.

 

PortoGente – Como melhorar a logística portuária do estado de São Paulo?

Frederico Bussinger – Logística portuária? O porto é parte da logística, e não o contrário! Aliás, essa segmentação de logística disso, logística daquilo dificulta a compreensão abrangente do tema. Logística, como “a gestão de estoques em movimento” (definição que recente ouvi e gostei), é algo amplo, que engloba vários componentes (como os portos, por exemplo). E isso ficou comprovado com as reformas de meados dos anos 1990. O Porto de Santos, considerando-se o cais, propriamente dito, melhorou muito. Mas esse processo ficou limitado pelos gargalos à montante e à jusante. O navio precisa chegar e sair do porto (algo dificultado pela perda de calado), e a carga precisa chegar e sair do porto (o que é dificultado pelas condições viárias e coordenação operacional hoje vigentes, raízes das monumentais filas de caminhões e carretas). Também a carga precisa transpor eficientemente a Região Metropolitana de São Paulo; tema do qual o governo do Estado, como visto anteriormente, já está cuidando. Mas logística é mais. É fluxo de informação, são transações bancárias, é segurança, é liberação sanitária e alfandegária, e muito mais; para o que seria muito importante um projeto global.

 

PortoGente – Recentemente, o ministro Pedro Brito disse que o Porto de Santos tem tudo para ser o hub port do Brasil. O senhor concorda com essa afirmação? Por que?

Frederico Bussinger – Sim. É uma real possibilidade. Santos tem área, tem possibilidade de ter calado, tem uma infra-estrutura diversificada, tem uma rede estabelecida de prestadores de serviço e, principalmente, por estar localizado junto ao epicentro do PIB nacional, tem carga própria (o que lhe dá um bom ponto de partida). Usando o tema do momento, Santos está na “pole position” para ser o “hub port” nacional. Mas, para tanto, precisa empreender um segundo ciclo de reformas portuárias, visando remover gargalos, institucionais e gerenciais, e ampliar sua infra-estrutura.

 

PortoGente – Como está o Porto de São Sebastião e quais os planos que o senhor desenvolverá por lá? Haverá alguma grande obra para os próximos meses? Qual?

Frederico Bussinger – Para quem não conhece, o Porto de São Sebastião tem um único berço de atracação e, bem assim, de apenas 150 metros de comprimento e menos de 9 metros de profundidade. Por conseguinte, tem condições operacionais muito limitadas. Mesmo assim, há ociosidades, tanto de berço como de pátio. Em 2006 ele movimentou pouco menos de 500.000 toneladas. Sua gestão é deficitária. A partir desse quadro, a diretriz geral que recebemos é dinamizar o porto e fazer da Cia. Docas uma empresa auto-sustentada. Essa diretriz tem dois horizontes: no curto prazo, procurar ocupar a capacidade ociosa, crescer continuamente a movimentação e as receitas; no médio prazo, tanto ampliar o número de berços como dotá-los de capacidade para receber navios de grande porte. Além disso, ocupar a retro-área disponível de forma cuidadosa, já que ela é pequena. Esses projetos deverão ser empreendidos através de alguma forma de PPP (Parceria Público Privada), cuja modelagem está sendo estudada.

 

PortoGente – Em qual tipo de carga São Sebastião pode competir com Santos?

Frederico Bussinger – Há algumas possibilidades. Isso vai ser analisado e, também, depende das estratégias e dos compromissos de operadores, donos de carga e investidores.

 

PortoGente – Como um homem recorrentemente ligado ao mundo portuário, confirmada pela sua indicação para assumir o Porto de São Sebastião, o senhor deve acompanhar tudo o que acontece nos outros portos nacionais. Como o senhor está vendo a gestão portuária brasileira nos últimos cinco anos? Um caso que chocou a comunidade foi a prisão do presidente e ex-presidente da CDP – Companhia Docas do Pará, no ano passado.

Frederico Bussinger – Desde 2005, e até recentemente, estive à frente da Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo, tarefa sabidamente complexa e absorvente. Assim, acompanhei o cenário portuário apenas à distância. Todavia, do que tenho observado, as reformas portuárias da década de 1990 aparentemente perderam impulso nesse início do Século XXI. Os problemas se avolumaram, gargalos não foram resolvidos, e isso tem pesado sobre a economia nacional, inclusive limitando o alcance e o cronograma de alguns projetos. Por exemplo, é inegável que as reformas empreendidas em Santos tiveram importante papel para o grande desenvolvimento do setor suco-alcooleiro ocorrido na década de 1990 nas regiões Sudeste e Centro-Oeste. O que não está deixando de acontecer, hoje, pelas limitações portuárias; tanto de capacidade como de eficiência?

 

PortoGente – Por último, o senhor comandará o Porto de São Sebastião da capital paulista? O senhor não vê nenhum problema nisso?

Frederico Bussinger – A sede da empresa será na Capital, onde se concentram os centros de decisão de investidores, donos de carga, operadores, além dos principais órgãos da administração estadual. Haverá uma sub-sede operacional em São Sebastião, onde estará baseada a Diretoria de Gestão Portuária. Eu, pessoalmente, me dividirei entre São Paulo, São Sebastião, Brasília, e onde a presença do presidente da companhia se fizer necessária para o desenvolvimento do projeto do Porto de São Sebastião. Problema? Não. Uma circunstância e uma necessidade. 

 

PortoGente - Presidente, o senhor está acumulando a função de presidente da Cia. Docas de São Sebastião e de secretário municipal de transporte de São Paulo?

Frederico Bussinger – Não. Já me desliguei da Secretaria Municipal de Transportes.

 

Fonte: PortoGente - 23 OUT 07

Curta, comente e compartilhe!
Pin It
0
0
0
s2sdefault
powered by social2s

topo oms2

Deixe sua opinião! Comente!