Portogente acompanha o processo judicial que a ONG Montanha Viva move contra a Indústria de Fosfatados Catarinense (IFC) e a instalação no município de Anitápolis, em Santa Catarina, uma mineradora para extrair fosfato e produzir fertilizante, numa área de 360 hectares, dentro do bioma da Mata Atlântica. Nossa entrevista é com o advogado da ONG, Eduardo Bastos Moreira Lima, que propôs a ação contra a instalação do empreendimento devido aos impactos ambientais que causará em toda a região, especialmente nas reservas de água.
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Lima, nesta entrevista, explica todas questões envolvendo a fosfateira em Santa Catarina
O processo principal para barrar a instalação da mineradora entrou na fase de perícia judicial, que será realizada com base nos questionamentos encaminhados por sete órgãos envolvidos no litígio - ONG Montanha Viva, Fundação do Meio Ambiente (Fatma), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Ministério Público Federal, o estado catarinense, a prefeitura de Laguna e a própria empresa. Com o objetivo de apurar os fatos, devido à omissão de dados e informações, o Ministério Público Federal (MPF), em 7 de julho último, entrou com uma ação penal, acusando a empresa e diretores responsáveis pela elaboração do estudo ambiental do Projeto Anitápolis de crimes contra o meio ambiente e o patrimônio genético.
Portogente - Quais são as empresas acionistas da IFC, envolvidas no projeto de instalar a fosfateira em Anitápolis?
Moreira Lima - As empresas acionistas da IFC à época da propositura da ação, em 2009, eram a Bunge Fertilizantes e Yara Brasil Fertilizantes. Há indicativo no mercado financeiro que a Vale adquiriu a participação dessas empresas, contudo, na ação civil pública (sob o Processo nº 5034684-54.2014.4.04.720), que tramita na Justiça Federal, continuam as três pessoas físicas na condição de rés.
Portogente - Do ponto de vista ambiental, qual a biodiversidade localizada na região e que tipo de impacto poderá ocorrer?
Moreira Lima – Sem a ação judicial e a liminar em 2009, que suspendeu os efeitos da Licença Ambiental Prévia emitida pelo órgão ambiental estadual (cujo pedido de autorização de corte de árvores já havia sido protocolado), teriam suprimido mais de 400 hectares de vegetação do Bioma Mata Atlântica. Sendo que parcela expressiva seria sobre o estágio primário da mata. Além disso, o Rio dos Pinheiros, que abastece diversos municípios, corre o risco se ser eutrofizado, comprometendo as atividades que são desenvolvidas no seu curso.
Portogente - Em relação ao licenciamento desse empreendimento, como você avalia a posição dos órgãos ambientais do Estado?
Moreira Lima - São réus no processo, além das empresas, a União, o Governo do Estado, o município de Anitápolis, o Ibama e a Fatma. No caso do Ibama, no curso do processo, verificou-se diversas irregularidades na condução dos estudos e requereu ao juízo a alternância de polo, passando de réu a assistente do autor. Com relação à Fatma, em 2012 peritos da Polícia Federal analisaram os estudos ambientais e atestaram diversas irregularidades e omissões, fato que culminou com a propositora de uma ação penal pelo Ministério Público Federal (APN nº 5013212-60.2015.404.7200) em 2015, com vistas a apurar crimes ambientais (omissão nos estudos). Isso demonstra a fragilidade do processo de licenciamento e os riscos que poderiam ocorrer caso a implantação tivesse sido iniciada.
Portogente - Como a sociedade da região tem se posicionado, incluindo os gestores públicos?
Moreira Lima - Antes da propositura da ação, diversas reuniões foram realizadas em 21 municípios. Coletamos mais de 15 mil assinaturas, diversos setores se envolveram, dentre eles a Associação Empresarial do Vale de Braço do Norte (Acivale) e a Associação Empresarial de Tubarão (Acit). Conseguimos que seis prefeituras ingressassem na ação, Rancho Queimado, Tubarão, Laguna, Braço do Norte, Rio Fortuna e São Ludgero, bem como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), dentre outros. Porém após a concessão da liminar e dos mais de 16 recursos judiciais que mantiveram a atividade suspensa e com a troca de gestão destes municípios, um clima de paralisia tomou conta, mas que está sendo novamente revertido.
Portogente - Em que momento está o trâmite do processo?
Moreira Lima - Atualmente a fase processual é da elaboração dos quesitos e sua análise pelo perito judicial nomeado pelo juízo. Enquanto isto, a sociedade ganha mais tempo para conhecer e se posicionar. Afinal, do ponto de vista econômico, se a mineração, conforme dito no próprio estudo teria vida útil de 33 anos, o que tem mais valor hoje e no futuro: água, ou fosfato?