Sexta, 19 Abril 2024

Quando na Aliança tive a chance de comandar três navios da classe Frigo construídos no Brasil: o Tietê, o Alberto Cocozza e o Rafael Lotito, este por duas vezes. O Frigo Tejo, também ficou sob minha responsabilidade, atracado a contra-bordo do Alberto Cocozza no Porto de Hamburgo, por ocasião da venda dos dois navios em 1977.

Inicialmente, comandei o FRIGO TIETE, meu primeiro navio na Aliança. Nesta viagem transportei cacau em sacos de Ilhéus com destino a Gdynia. Embora, anteriormente, já tinha atravessado como imediato o Canal de Kiel, no norte da Alemanha, desta vez, já como Comandante, conheci a rotina de manobras de comportas de entrada e saída do canal, com práticos acompanhados de timoneiros, durante a travessia em locais que não cruzavam dois navios, bem como outras peculiaridades locais. Na chegada do Porto de Gdynia, com temperatura a 23°C negativos, o porto estava bloqueado por gelo, fato que impedia manobra de atracação. Por isso, tivemos que aguardar que rebocadores quebra-gelo nos guiassem vagarosamente ao cais. Após descarga do cacau, seguimos para Aalesund (Noruega), desta vez através do Estreito de Skategate, pelo norte da Dinamarca. Devido ao mau tempo alcançamos Aalesund via navegação interna pelos Fjords com práticos locais.

Para realizar o carregamento e o transporte de caixas de bacalhau, tivemos que eliminar o cheiro do cacau durante a viagem, queimando pó de café em latas pequenas nas diversas cobertas. Obtivemos sucesso, mais uma que aprendi com marinheiros experientes. Nem sempre havia carga frigorífica para transportar e, neste caso, carregávamos carga geral, de preferência sacaria ou carga leve. Tudo para não destruir os estrados especiais dos pisos. Esta classe de navio, construída no estaleiro Mauá, era excelente para o mar e possuía velocidade de 19 nós. Quando navegávamos no Canal da Mancha, com corrente a favor, chegávamos a alcançar 23 nós. Devido ao fato dos tanques de fundo usados para combustível serem pequenos, esses navios não tinham grande autonomia. Nas viagens northbound, sempre escalávamos Tenerife para abastecimento. A estabilidade destes navios requeria muita atenção, principalmente com o carregamento de carga homogênea de maçã direto da Argentina para a Europa, ou mesmo tambores de suco de Santos. Comandei, também, por duas vezes o RAFAEL LOTITO e por uma o ALBERTO COCOZZA. Nessa última ocasião estive no Porto de Murmansk, no norte da Rússia, com carregamento de manteiga em cartões, sobra do mercado comum europeu.

Muitas vezes no southbound viajamos em lastro, isto é, sem carga de retorno. Aproveitávamos estas oportunidades para fazer testes com os termômetros fixados nos porões e cobertas. Para isto, usávamos baldes com gelos e termômetros, mergulhávamos nos sensores das cobertas e mandávamos fazer a leitura pela praça de máquinas, comparando as duas. Era comum haver diferenças de 1ºC a 2°C, no máximo. Feitas as comparações de todos os sensores, então fazíamos uma curva de correção individual que passava a vigorar para registro das temperaturas.

Em todas as oportunidades fazíamos e atualizávamos as correções para nossa segurança. Antes de iniciar os carregamentos era feito um teste de resfriamento em todos os compartimentos, acompanhado por um perito, que emitia os devidos certificados que garantiam as temperaturas para cada viagem. Algumas vezes, com o navio vazio e tempo bom, organizávamos futebol de salão nas cobertas superiores para lazer da tripulação. Como não tínhamos linhas certas, sempre ficávamos na expectativa da próxima viagem. Cheguei a ficar até 7 meses sem escalar portos brasileiros.

No Rafael Lotito também tive oportunidade de sofrer uma tempestade de areia, em pleno mar, que soprava do Deserto de Sahara, em travessia de Cabo Verde às Canárias. O vento era forte e constante que chegava a adernar (inclinar) o navio. A visibilidade era zero, mal enxergávamos a proa do navio. Este fenômeno durou cerca de dois dias e acontece esporadicamente. Tínhamos que fechar todas as vigias, pois a areia sujava o interior do navio. Para piorar a situação, estava com o radar inoperante e navegávamos com o máximo de cautela, pois nem posição astronômica era possível uma vez que não havia céu ou horizonte, simplesmente usávamos o radiogoniômetro. Nestes navios frigoríficos escalávamos com certa freqüência no Rio de Janeiro e Santos, além de Tenerife para abastecimento de combustível. As outras escalas eram: Aalesund, Kristiansund e Heroya (Noruega), Horsens (Dinamarca), Hamburgo, Rotterdam, Newhaven (Inglaterra), Caen (França), Murmansk (Rússia), Gdynia (Polônia), Leixões e Lisboa (Portugal), Buenos Aires e Baia Blanca (Argentina).

Quando da chegada em Hamburgo após viagem de Murmansk, em maio de 1977, o navio permaneceu atracado para venda, bem como o Frigo Tejo, que alguns dias após atracou a contra-bordo também para venda. Permaneci em Hamburgo cerca de 4 meses com mais 4 tripulantes, mantendo os navios ativos de equipamentos por determinação da Sociedade Classificadora, com o intuito de não perder a classificação. Tinha uma rotina diária a cumprir em cada navio, registrando todos os testes que eram feitos em planilhas. Neste período, o Sr. Karl Fisher, Armador da Aliança, me presenteou com o sino do Frigo Tejo como lembrança. Após concluídas as vendas, os navios foram renomados de ANNA POLARIS e INGA POLARIS.

Tão logo passei os dois navios para seus respectivos Comandantes, com os navios ainda docados, retornei ao Brasil de avião para descanso de férias, ocasião em que optei mudar de armador. Quase que diariamente recebia visitas de armadores ou representantes interessados na compra dos navios, bem como fazia relatórios para autoridades alemãs, Aliança e Lloyd Register. Neste período visitava colegas de navios da Aliança ou Lloide que aportavam em Hamburgo. Aproveitava para cortar cabelo, pois sempre havia um tripulante com esta habilidade, ou mesmo para jogar futebol nos times dos navios e coletar revistas e jornais do Brasil.

No Rafael Lotito estivemos afretados cerca de 2 meses fazendo viagens de Tenerife, carregando verduras e legumes em pallets, para Newhaven ou Rotterdam. A volta era em lastro, sem carga, e como as viagens eram curtas, nós cruzávamos a Baía de Biscaya duas vezes por semana, condição desagradável devido ao mau tempo característico da regi

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