Quarta, 27 Novembro 2024

Dois meses depois do naufrágio do navio Haidar, em Barcarena, no Pará, permanecem 3.900 carcaças de bois dentro da embarcação, adernada no porto de Vila do Conde, contaminando a água. Vários laudos comprovam danos sociais e ambientais provocados pelo desastre que geram um valor mínimo de R$ 71 milhões em indenizações. O Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA), o Ministério Público do Estado do Pará (MP/PA), a Procuradoria Geral do Estado e a Defensoria Pública do Estado do Pará ajuizaram ontem, 16 de dezembro, na Justiça Federal, em Belém, ação civil pública que pede, além do pagamento das indenizações, seja dado um prazo máximo de 48 horas para que os responsáveis pelo naufrágio apresentem uma solução definitiva para a retirada das carcaças.

“A demora na retirada do óleo e das carcaças foi uma opção deliberada da empresa de salvatagem (contratada pelos donos da carga e do navio)”, diz a ação judicial, acusando os responsáveis de optarem, sem comunicar aos órgãos ambientais, por esperar a carga apodrecer totalmente porque a retirada somente das ossadas é mais barata. “Resta clara a opção preponderantemente econômica de manter a integridade do navio em detrimento do meio ambiente, porque passados muito mais de dois meses do acidente (que ocorreu no dia 6 de outubro), as carcaças do deque inferior continuam mergulhadas no rio Pará”.

A maior parte das indenizações pedidas pelos entes públicos é para reparar os danos aos municípios de Barcarena e Abaetetuba, os mais atingidos pela contaminação. Para Barcarena, a ação judicial pede o pagamento de R$ 35 milhões em danos. Para Abaetetuba, o cálculo é de R$ 1,4 milhão. Em danos morais coletivos, o total seria de R$ 20 milhões e pelos maus-tratos e crueldade com animais, os responsáveis deverão pagar R$ 15 milhões. Os pagamentos, de acordo com os pedidos feitos à Justiça Federal, devem ser revertidos para uma lista de políticas públicas e investimentos a serem feitos pelos beneficiários.

Mas o valor deve ser maior do que R$ 71 milhões, porque serão somadas as indenizações individuais a todos os moradores da região afetados pela contaminação. Depois do naufrágio, os odores da putrefação da carga de mais de 5 mil bois se espalharam pela região. Foram feitos 113 atendimentos de moradores com sintomas causados pelos odores. Ribeirinhos, pescadores e donos de barracas – a região mais afetada foram as praias de Barcarena, destino turístico e fonte de renda de centenas de moradores. As praias permanecem interditadas.

O cálculo das indenizações aos moradores dependerá de cadastro dos atingidos, que, se a Justiça concordar com os pedidos, deverá ser feito em 30 dias pelos réus da ação. Imediatamente, a ação judicial pede que continue assegurado o fornecimento de água potável, cestas básicas e salários mínimos a todos. Para arcar com todos os prejuízos, os entes públicos pediram à Justiça que bloqueie contas e bens das empresas brasileiras responsáveis pelo naufrágio.

A ação também enumera laudos do Instituto Evandro Chagas que comprovam a contaminação das águas do rio Pará, onde o navio afundou, pelo óleo e pela decomposição da carga. O relatório técnico do Evandro Chagas mostra a presença de fósforo acima dos parâmetros, contaminação por óleo e escassez de oxigênio na água, recomendando ao final que se evite até o contato primário com as águas da região, ou seja, não é seguro tomar banho no rio.

São réus na ação os donos do Haidar, Husei Sleiman e Tamara Shiping, a dona da carga de bois vivos, Minerva S.A, as responsáveis pelo embarque dos bois, Global Agência Máritima e Norte Trading Operadora Portuária e a Companhia Docas do Pará, dona do porto de Vila do Conde. Além da contaminação e dos extensos prejuízos sociais e ambientais, eles são acusados de crueldade e maus-tratos com os animais.

De acordo com o Ministério da Agricultura, em 2014 o Brasil exportou 646 mil cabeças de gado vivo, sendo que 95% da exportação, pelo menos 614 mil animais, saíram pelo Pará. Os animais vêm geralmente de fazendas no sul do estado e são transportados, ainda em terra, em péssimas condições, em caminhões fechados, sem acesso suficiente à água e alimentação. Ao chegarem no porto, as cargas vivas ainda suportam longas esperas até o embarque.

A ação lembra que não é a primeira vez que a Minerva S.A, dona da carga do Haidar, foi responsável por crueldade contra animais. Em março de 2012, 2.700 bois morreram asfixiados por falta de ventilação dentro do navio Gracia Del Mar. Assim como o Haidar, o Gracia Del Mar também foi adaptado para transportar bois vivos. Nos dois casos houve violação da legislação que regula o transporte e protege o bem estar dos animais.

Íntegra da ação

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