Terça, 26 Novembro 2024

Caminhões com mais de duas décadas de uso. Motoristas em condições precárias de trabalho. Circulação de carretas carregando de forma irregular toras de madeiras com toneladas de peso. Essa é a combinação que resulta em mortes diárias, na época da safra, na região amazônica chamada de Arco do Desflorestamento, na região centro-norte do Estado de Mato Grosso. O quadro é descrito da pesquisa da engenheira florestal Mariana Peres Lima, professora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), desenvolvida no programa de Pós-graduação em Recursos Florestais, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), em Piracicaba.

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A realidade vivenciada em municípios do centro-norte do Mato Grosso, região denominada como Arco do Desflorestamento, Arco do Desmatamento ou Arco de Fogo, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), chamou atenção de Mariana quando ela começou a lecionar na UFMT, na área de Manejo Florestal. “Na minha área de atuação, como professora de Transporte Florestal, verifiquei uma diferença absurda entre a realidade vivida anteriormente, em São Paulo, e a nova realidade encontrada no Mato Grosso. Trabalhar na Amazônia se tornou em verdadeiro desafio pessoal e profissional para mim, uma vez que essa realidade causava e ainda causa inúmeros acidentes com um número assustador de vítimas fatais, e estranhamente tratadas como “normais” pela sociedade local, já que as ocorrências são cotidianas em época de safra”.

O estudo tem orientação do professor Fernando Seixas, do Departamento de Ciências Florestais da Esalq e traz um panorama do descaso, da falta de fiscalização, da livre circulação destes veículos e a não observância dos condutores autônomos, empresas e terceiros com as legislações federais que regulamentam o transporte rodoviário de madeira em toras. “Senti a necessidade de desenvolver algum trabalho para verificar que o transporte rodoviário de madeira bruta e em toras no “Arco do Desflorestamento” é um problema social, econômico e ambiental que está associado ao não cumprimento, pelos condutores, da Legislação Federal que fixa parâmetros técnicos para o transporte da carga em questão — Resolução n. 246, de 27 de julho de 2007- Contran”, explica Mariana.

Revitalização
Entre os resultados, a tese aponta o sucateamento da frota e a consequente falta de competitividade no mercado para que seja feita a sua revitalização. A quantidade imensa de acidentes resulta, em sua maioria, em vítimas fatais. “Esse alto índice de mortes ocorre já que, devido à rusticidade da atividade, pouquíssimas vítimas sobrevivem”. Além disso, a pesquisa aponta a necessidade de políticas públicas e de cartas de crédito e financiamento para a renovação da frota.

Sobre os motoristas, o trabalho revela que trabalham em estado precário, com postos de higiene, dormitórios e alimentação em péssimas condições. “Falta qualidade de vida para esses profissionais, que apresentam baixo índice de escolaridade, altos índices de obesidade, mais de 50% utilizam bebidas alcoólicas ou consomem entorpecentes na direção e mais de 40% tem vício de tabagismo”, reforça Mariana. Outro ponto de risco evidenciado na pesquisa é a existência de transporte ilegal de madeira, que em geral está atrelado à prostituição, tráfico de drogas e animais. “São necessárias mudanças urgentes na legislação que fixa parâmetros de segurança na atividade, além de conscientização tanto da sociedade civil, que apresenta insegurança diante de tantas mortes e portanto precisa ser agente fiscalizador desta atividade, quanto dos condutores, que precisam estar cientes do perigo que fazem a si mesmo e à sociedade”.

A partir dos resultados do estudo, uma cartilha está em fase final de elaboração. Intitulada “Manual sobre o Transporte Rodoviário Florestal” a iniciativa aborda diversos assuntos concernentes à atividade. “Os principais temas são as legislações vigentes, a prevenção de acidentes e direção defensiva, saúde e segurança do trabalhador, por meio de discussões sobre qualidade de vida, curiosidades e interesses sobre a profissão de condutor do transporte de madeira bruta e em toras. Os resultados finais esperados e a divulgação estão vinculados à necessidade de parcerias para a publicação e distribuição gratuita da cartilha”.

A ideia cresceu e hoje, além de Mariana, cerca de 20 pesquisadores, envolvendo docentes e alunos de graduação e pós-graduação da UFMT estão envolvidos na efetivação de ações de conscientização junto aos caminhoneiros, prefeituras e populações das cidades daquela região. Quanto a cartilha, serão impressos 10 mil exemplares e, assim, Mariana pretende baixar o número de mortes causados por acidentes envolvendo transporte de toras de madeira. Só em 2014, foram mais de 80 óbitos. “Além dos benefícios diretos como busca na diminuição de acidentes de trânsito causados por estes veículos, ocorrerá a diminuição de gastos com saúde pública voltada aos acidentes (doenças de causas externas), já que estes absorvem grande quantidade de recursos financeiros e humanos no Estado de Mato Grosso, o que desta forma culmina em diluição de recursos financeiros em tratamentos de doenças de causas internas como câncer, Aids, doenças cardíacas, síndromes etc”, finaliza. Fonte: Agência USP de Notícias

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