Paulo Henrique Martinez é Professor no Departamento de História da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp de Assis
O automóvel talvez seja o objeto emblemático do século XX. De Henry Ford às corridas de Formula 1, os veículos automotores encantaram seguidas gerações, com sua potência, design, acessórios, estilos e modelos. Objeto de consumo para muitos, de coleção, para poucos, de desejo, inegavelmente, para expressiva parcela da população ao redor do globo. Saudados como novidade e ícones da modernidade urbana e industrial, símbolos de posição social e traço de personalidade individual e coletiva, os automóveis povoam a imaginação e a vida cotidiana de crianças e adultos, de homens e mulheres, de pobres e ricos, de moradores do campo e das cidades.
O automóvel organizou a vida social no século XX. O encantamento produzido por essas máquinas fabulosas decorre, em larga medida, e desde o seu surgimento, da sensação de autonomia e de superação de limites que proporciona aos condutores e passageiros. Ao êxtase, surpresa ou pânico que desperta em pedestres e outros transeuntes, motorizados ou não. Ciclistas, cavaleiros, carroças ou andarilhos, todos são excitados ou apavoram-se em encontros inusitados e involuntários com os automóveis, em ruas, estradas ou mesmo nas calçadas.
Atropelamentos e colisões eram alvos de controvérsias jurídicas. Quem deveria ser imputado, o condutor ou a vítima, o fabricante ou o poder público, o indivíduo ou a sociedade? O cuidado dos proprietários com os seus veículos tornou-se índice de responsabilidade e de confiança pública, expressas na manutenção, na limpeza e na condução de automóveis. Salões, clubes, feiras, exposições, publicidade, artes, cidades, sociabilidade, de brinquedos a competições, fervilham com a indústria automobilística.
Em debate na televisão norte-americana, John Kennedy, referindo-se ao seu oponente, indagou ao telespectador: “você compraria um carro usado deste homem?”. Ao tocar, fulminante, a vida íntima, material e espiritual, da classe média, venceu a eleição presidencial. No Brasil, Juscelino, Collor e Itamar associaram suas imagens a automóveis. Vargas, Lula e Dilma apregoaram que, sem petróleo, o país não anda. Historiador, Caio Prado Jr dizia que a história do Brasil, no século XX, seria entendida pela jardineira e o caminhão, o transporte automotivo de passageiros e de mercadorias.
Museus de automóveis são cada vez mais numerosos. São interativos, sedutores, diversificados, artísticos e históricos, tecnológicos e de indústrias, empresariais e comunitários. O automóvel no museu propicia amplos panoramas, e dos mais completos, em distintas dimensões do patrimônio museológico no Brasil e no exterior.