Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC)
Apesar das distorções provocadas pela chamada “guerra fiscal”, o governo federal sancionou, no começo de agosto, a Lei Complementar nº 160/2017, que se anuncia com o objetivo de minimizar os efeitos negativos da concorrência fiscal entre os Estados. Mas, no fundo, a medida legaliza benefícios concedidos ilegalmente, que justificaram a denominação "guerra fiscal". Agora, para aprovar esses benefícios, basta maioria de dois terços no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão que reúne os secretários de Fazenda dos 26 Estados e do Distrito Federal. Até a aprovação da lei, as decisões no Confaz sobre concessão de incentivos deveriam ser unânimes.
Com isso, São Paulo e mais um ou outro Estado industrializado, que defendiam uma redução imediata ou gradual dos incentivos fiscais em vigor, saíram perdendo, enquanto os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste emergem como vitoriosos, pois a lei permite que os benefícios concedidos permaneçam intactos por mais 15 anos. Na maioria, esses incentivos procuram atrair indústrias e empresas de agropecuária e infraestrutura rodoviária, aquaviária, ferroviária, portuária, aeroportuária e de transporte urbano, enquanto os demais setores terão redução gradual e extinção do benefício em menor período.
Em tese, não se pode deixar de reconhecer que essa é uma maneira de se corrigir as distorções regionais e estimular o crescimento de Estados menos desenvolvidos. No entanto, não se pode concordar que esse desenvolvimento seja obtido com prejuízos para os Estados mais desenvolvidos, especialmente para São Paulo.
Hoje, por exemplo, em função das distorções provocadas pela “guerra fiscal”, o Porto de Santos sofre as consequências da fuga de cargas motivada por regras tributárias de outros Estados que procuram conquistar as empresas paulistas, quando deveriam mirar principalmente indústrias estrangeiras. A questão envolve as normas de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Ou seja: nos últimos anos, cada Estado mantinha uma tributação de ICMS para produtos importados, de maneira a atrair essas cargas para seus portos e aeroportos.
Para colocar fim a esse cenário, em 2012, o Senado aprovou a Resolução nº 13, que unificou em 4% a alíquota aplicada em operações interestaduais – quando a carga vai de um Estado para outro em uma revenda ou para industrialização. Acontece que essa tributação de 4% provocou outro problema, pois o importador paga 18% de ICMS no desembaraço aduaneiro em São Paulo e, ao vender a mercadoria importada ou industrializada (com conteúdo de importação superior a 40%) para outros Estados, tem de destacar 4% de ICMS na nota fiscal.
Esse procedimento gera um saldo credor continuado, em que o importador não consegue compensar o ICMS pago no desembaraço aduaneiro, pois possui uma massa de saldo credor que vai sendo transportada de um mês para o outro. Como o ICMS pago na importação não é abatido em função do saldo credor, o imposto acaba não sendo compensável, o que é inconstitucional, além de descapitalizar a empresa paulista.
Com isso, várias empresas paulistas que vendem para todo o País optaram por abrir filiais naqueles Estados mais pródigos na concessão de incentivos fiscais, tratando de desembaraçar as cargas fora de São Paulo. Assim, o Porto de Santos, de longe o mais bem equipado do País e responsável pela movimentação de 27,6% de todo o comércio exterior brasileiro, tem sofrido com essa fuga de cargas, com prejuízos não só para a arrecadação tributária paulista como para todas as empresas que atuam na cadeia logística.