Terça, 26 Novembro 2024

Milton Lourenço, presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC)

A carta de intenções que a União Europeia (UE) acaba de assinar com o Japão que prevê a formalização de um acordo de livre-comércio dá uma ideia do que poderá ser o tratado que o bloco europeu pretende assinar com o Mercosul, ainda que desde já se possa intuir que este não deverá ser tão amplo quanto prevêem as discussões dos europeus com a segunda maior economia da Ásia para a formalização do Japan-EU Free-Trade Agreement (Jefta).

Iniciadas em 1999, quatro anos depois da abertura de negociações com o Japão, as conversações da UE com o Mercosul foram interrompidas em 2004, em função da mudança de política conduzida pelo lulopetismo, que também serviu para levar ao fracasso as tratativas com os Estados Unidos para a formação da Área de Livre-Comércio das Américas (Alca).

Como se sabe, o resultado disso foi a perda de espaço para os produtos manufaturados brasileiros no maior mercado consumidor do mundo, o que redundou em dificuldades para o parque fabril nacional e no fechamento de muitas vagas no mercado de trabalho. Em contrapartida, deu-se ênfase à aproximação com os Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul) e países subdesenvolvidos da África governados, na maioria, por ditadores.

As consequências dessa política desastrosa ainda podem ser conferidas em números atuais, que prevêem que a Argentina voltará em 2017 a ser o principal mercado para os bens industrializados brasileiros, superando os Estados Unidos, segundo previsão da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), com vendas ao redor de US$ 15 bilhões. Nada contra que a Argentina seja o maior importador de manufaturados brasileiros, mas a verdade é que os Estados Unidos poderiam estar importando pelo menos o dobro dos US$ 14 bilhões previstos para 2017, se a Alca tivesse sido criada ou pelo menos não tivesse ocorrido um distanciamento entre os dois países.

As negociações entre Mercosul e UE foram relançadas em 2010, quando as partes assumiram o compromisso de concluir um acordo com cobertura próxima a 90% do comércio birregional. Depois de muita conversa, em junho de 2017, em Montevidéu, os dois blocos confirmaram o interesse em avançar nas negociações, com vistas à conclusão de um acordo abrangente e equilibrado, que pode sair, quem sabe, na próxima reunião que está marcada para outubro, em Bruxelas.

Depois que o governo norte-americano retirou-se do Tratado de Livre-Comércio Transpacífico (TPP), assinado por 11 países da Ásia e do Pacífico, incluindo o Japão, o governo japonês buscou acelerar as negociações com os europeus. E o resultado é que o novo acordo deverá cobrir 99% dos temas da agenda de comércio bilateral, mas com o estabelecimento de um período de transição para proteger setores “sensíveis”, como o setor automotivo japonês, muito taxado na Europa, e o agronegócio europeu, que sobrevive graças a muitos subsídios.

Portanto, é possível que esse entendimento com o Japão em favor de um comércio aberto, sem demasiado protecionismo, encoraje, finalmente, os europeus a buscar um amplo acordo com o Mercosul. Já não é sem tempo.

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