Domingo, 24 Novembro 2024

Marco Antônio Barbosa é especialista em segurança e diretor da CAME do Brasil. Possui mestrado em administração de empresas, MBA em finanças e diversas pós-graduações nas áreas de marketing e negócios

Na semana passada, uma facção criminosa soltou um manifesto pedindo limites para a violência que toma conta do Rio Grande do Sul. A carta aberta, assinada por presos de dentro de três presídios diferentes do estado, mostra preocupação com o rumo que a disputa de grupos rivais por espaço está tomando. Este posicionamento da criminalidade - que parece mais saído de um filme - é a triste e preocupante realidade vivida pela população gaúcha.

A ausência do Estado é a oportunidade para o crime se instalar e disseminar a sensação de poder e de impunidade. Os governantes estão de mãos atadas devido a crise financeira que afeta a administração pública há décadas e que agora reflete na segurança.

Sem dinheiro para pagar servidores públicos e contratar efetivo e estrutura para as polícias do estado, a violência explode. Segundo a Fundação de Economia e Estatística (FEE), o Produto Interno Bruto do Rio Grande do Sul recuou 4,3% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. Em contrapartida, a Secretaria de Segurança Pública divulgou que os homicídios aumentaram 6% e os de latrocínios (roubo seguido de morte) cresceram 34% no primeiro semestre de 2016.

Esta escalada da criminalidade também cria sensação de abandono, que transforma o estado em ‘terra sem lei’ e, neste caso, cada um tem a sua própria justiça. Um suspeito de roubo ter a mão cortada pela população, como foi noticiado amplamente, é a demonstração clara de que os justiceiros também ganham força com a ausência do Estado. A barbárie é tanta que até o crime organizado pediu um ‘basta’ por meio de manifesto.

Este cenário lembra Gotham City, a cidade fictícia dos quadrinhos e filmes do Batman. Esqueça toda a parte surreal da ficção e vamos para a discussão tratada na história. No momento em que o governo não consegue conter mais a máfia local, surgem justiceiros, de todos os lados. Coringa ou Batman. Todos surgem da ausência do Estado, que não consegue manter a ordem. Eles fazem suas próprias leis, julgando criminosos ou vítimas da maneira que bem entendem. Mesmo com a vitória constante do Batman – protagonista da trama - o estado continua fraco e os grupos de criminosos mudam somente de nome. Vence a batalha, mas nunca a guerra.

Voltemos ao mundo real, pois nem nos quadrinhos os papéis foram tão invertidos como no Rio Grande do Sul, onde o estado assiste atônito, enquanto o crime organizado tenta frear a violência. A lei e as forças policiais existem para fazer com que a sociedade viva em paz, com cada cidadão respeitando a liberdade do outro. A legislação é um consenso e um padrão de convívio para a sociedade. Sem lei, sem limites. Se um acha que matar alguém por ser contrariado é o correto, quem dirá que não é? Quem impedirá?

Em curto prazo, o que poderia ser feito, foi. A Força Nacional foi chamada para aumentar as ações e impedir o avanço da criminalidade. Mas isso é apenas um paliativo e precisa vir acompanhado de planejamento. Assim como as finanças de uma casa, é preciso alinhar as contas, gastar menos do que entra. Não adianta aumentar taxas e impostos sem planejamento. É exatamente o que vem sendo feito nas últimas décadas e não surtiu efeito algum. A conta precisa fechar no fim do mês e é preciso economizar para ter como investir em infraestrutura e inteligência para polícia, fortalecer a legislação vigente e, especialmente educar a população. Quanto mais educação, mais oportunidades de emprego, mais instrução do certo ou errado e mais o Estado se fará presente.

Não existe um Batman que irá surgir e resolver o problema da criminalidade. A situação chegou ao que está hoje por muitos anos de má administração e não existe uma fórmula mágica que consertará tudo da noite para o dia. Nem em Gotham isso funcionou. É preciso muito trabalho para que no futuro não recebamos mais cartas improváveis que parecem mais saídas de um filme hollywoodiano.

 

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*Todo o conteúdo contido neste artigo é de responsabilidade de seu autor, não passa por filtros e não reflete necessariamente a posição editorial do Portogente.

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