Cristiano Jannuzzi, Coordenador Agronômico da Netafim; Engenheiro Agrônomo pela Universidade Estadual Paulista, Júlio de Mesquita Filho, Campus Registro (Unesp)
Depois do Brasil passar por uma das piores crises hídricas da história, os dias são de fartura de chuva. E se a escassez não é mais um problema, o excesso pode prejudicar desde os grandes centros urbanos até a agricultura. Alguns produtores já tiveram safras destruídas pelas fortes chuvas. E neste papo de água e chuva, a pergunta que fica entre os produtores é: irrigamos ou não em períodos de chuva?
A planta não vive sem água, consequentemente para produzirmos, precisamos deste recurso natural. Cada vez mais produtores, empresas, órgãos do governo e entidades de pesquisa trabalham em projetos visando melhorias na gestão e no uso da água através dos sistemas de irrigação. No caso do gotejamento, a tecnologia é 95% precisa, preservando o uso correto da água.
Em tempos de chuva há quem acredite que os sistemas de irrigação ficam sem utilidade. O fato da cultura estar com água não significa que ela esteja 100% sadia, pois muitas vezes falta “comida”, ou seja, a parte nutricional da planta pode estar com algum déficit. Por conta do alto volume de água, ocorre a lixiviação (perda dos nutrientes pela água), principalmente em solos mais arenosos. Normalmente o produtor coloca grande parte do adubo no momento do plantio ou no começo da safra e esses nutrientes se perdem ao decorrer de fortes chuvas, prejudicando a produtividade da lavoura, além da alta umidade ser favorável ao surgimento de doenças, principalmente fúngicas.
Por isso, a importância do sistema de irrigação por gotejamento. Em período de chuva não é necessário irrigar, mas este sistema pode ser usado para a nutrirrigação ou fertirrigação. O gotejador permite que o produtor aplique os nutrientes direto nas raizes através das gotas de água junto aos fertilizantes, formando uma solução nutritiva para a planta. Dessa forma, a planta se alimenta mais vezes e em menores quantidades, repondo possíveis nutrientes lixiviados pelo alto volume de chuvas. Assim como nós, as plantas preferem comer de forma parcelada. Também é possível aplicar defensivos agrícolas de solo ou sistêmicos via sistema de irrigação por gotejamento, conhecido como a quimigação.
Experiências de produtores que usam a tecnologia de irrigação por gotejamento provam que o aumento de produtividade pode chegar na casa de 100%. Na safra de 2014/2015, no Sul do Brasil (Palmeira das Missões/RS), choveu 950 milímetros em 120 dias. Um produtor de soja relatou que na área de sequeiro produziu 80 sacas por hectare. Na área em que usou o gotejamento para a fertirrigação, o resultado foi de 102 sacas por hectare. Outro relato da safra de 2013/2014 no mesmo local, em uma lavoura de milho choveu 750 milímetros em 120 dias. Na área de sequeiro o resultado foi 160 sacas por hectare, enquanto que a área de gotejamento atingiu 300 sacas por hectare. O grande diferencial nestes dois casos foi a aplicação de uma parte dos adubos na base e grande parte parcelados via fertirrigação de acordo com a demanda nutricional das culturas.
A água da chuva não substitui uma gestão do uso da água na lavoura. Não adianta, por exemplo, termos um grande volume de chuvas concentrados em poucos dias, pois na maioria das vezes, o solo não é capaz de reter tal volume de água, causando problemas como o escoamento superficial e possíveis erosões no solo, além disso, se não tivermos água nos momentos corretos para a sequência da cultura, podem ocorrer aborto das flores e o não enchimento dos frutos, o que levaria a uma perda parcial ou em alguns casos extremos, perda total da lavoura.
Gerir o uso da água ajudará ainda na rentabilidade da fazenda, pois o produtor reduz outros custos como mão-de-obra, energia e insumos, além de garantir homogeneidade das lavouras, facilidade de manejo com a implantação da técnica de fertirrigação, entre outros, que podem representar até 20% de economia.
A tecnologia de gotejamento já revolucionou as plantações do mundo. Em Israel, onde foi criada, transformou o deserto em áreas produtivas e irrigadas. Já é usada também em outros países com escassez de água como Índia e Sudoeste dos Estados Unidos. Atualmente no Brasil, a área de cultivo é de 65 milhões de hectares, mas apenas cinco milhões são irrigados. Há ainda um longo caminho pela frente. Nos resta acreditar que tanto o campo como a cidade estão se conscientizando de que precisamos preservar a água. Acredito que podemos mudar isso, só depende de nós, mãos a obra!