Sábado, 23 Novembro 2024

José Luiz Tejon Megido, conselheiro fiscal do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS)

Crise, ora a crise. Essa é a hora dos que tem dinheiro comprar barato dos que perderam dinheiro. O setor sucroalcooleiro brasileiro foi depenado pelo governo, na sua ambição político partidária da perpetuação no poder. Aliás, vale dizer que o único partido que nos interessaria seria o Partido do Brasil, e esse é o que menos conta nas contas de quem faz as contas, pela ótica das facções dos partidos e suas subfacções. Assim, como o Estadão revelou sobre os contratos da CBF, bilionários para si mesma e seus parceiros, e detonador dos interesses dos clubes brasileiros, e ora bolas para o futebol do Brasil.

Nesse instante, o setor recebeu o retorno da Cide (Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico ) para resgatar um pouco da competitividade do etanol com a gasolina (R$ 0,22 para a gasolina e R$ 0,15 para o diesel – gerando arrecadações para o governo da ordem de R$ 12,18 bilhões em 2015). E ainda o aumento da mistura do etanol na gasolina de 25% para 27,5%. Essas medidas já deveriam ter sido tomadas anos antes de 2015. Não foram, e associados com uma super oferta do açúcar no mercado internacional, as receitas do segmento desabaram, não cobriram os investimentos tomados, e a consequência está numa dívida, hoje, maior do que todo o faturamento de um ano, calculado em mais de R$ 70 bilhões.

Mas, quer dizer que esse setor do agronegócio, neste exato instante, teve um alívio do governo, sendo um dos pouquíssimos pelo menos com níveis renovados de esperança. A Unica - União da Indústria de Cana de Açúcar - informa que 10 usinas irão fechar neste ano, que existem 80 paradas e, dentre essas, 44 em recuperação judicial. Adicione-se outras 23 em recuperação judicial mas em operação. Quer dizer, um paraíso perfeito para investidores, gente a nível global que tem dinheiro, vir comprar barato daqueles que perderam dinheiro. A velha história de que o capital não desaparece, ele apenas muda de mão.

Na contramão dessa mão que depenou o segmento no país, surge a retomada das visões do meio ambiente, do clima. E, mais uma vez, o potencial do sol e das energias renováveis brasileiras como a biomassa da cana, e a cogeração de eletricidade das próprias usinas de cana, ressurgem nos cenários do inexorável modelo novo energético global.

Do agronegócio brasileiro, que se caracterizou neste ano, de ser o único salvador da pátria da economia, com a superssafra de mais de 200 milhões de toneladas de grãos, e com as carnes em panorama ascensional; e o suprimento interno assegurado com arroz, feijão, hortaliças, legumes e frutas; ficando na grande dívida o trigo do pão nosso de cada dia, outro também alvo da incompetência do governo e da sua cadeia de valor gananciosa e predadora entre si.  Mas desse setor uma dependência dos solos fracos tropicais é o fertilizante.

E o Xico Graziano na sua coluna do Estadão (16/5 A-2) revela que a Petrobras, rainha do tesouro do patrimônio dos brasileiros, da mesma forma arrombada pela incompetência da sua gestão, conseguiu outro feito, o de vender para o Grupo Falcon, do Canadá, os direitos da exploração do potássio amazônico, coisa sagrada no reino dos adubos, venda feita pelo presidente da Petrobras em 2008 – José Sérgio Gabrieli.  Dilma Roussef era ministra de Minas e Energia. Enquanto isso, o Plano Nacional de Fertilizantes do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, nunca saía do papel.

Quanto ao negócio da cana, valorosos mesmo são os técnicos, educadores, e os centros de tecnologia, como o CTC, por exemplo. Centro Tecnológico Canavieiro, em Piracicaba. Ali, hoje, esses pesquisadores são obrigados a pesquisar no estado da arte da ciência, e para obterem recursos precisam eles mesmos saírem para vender o que pesquisam, pois não podem mais contar com recursos subsidiados. Dessa forma, coisas geniais como as novas variedades de cana, novos conhecimentos de processos agronômicos para aumento da produtividade, e algo sensacional como a pesquisa para gerar semente de cana, continuam sendo trabalhados, e ali encontramos idealistas, e brasileiros que exemplificam o porquê do agronegócio brasileiro ter conseguido ao longo dos últimos 50 anos, crescer e dar a volta por cima, em todas as desorganizações e ausências de planejamento de longo prazo no país.

Em síntese, aos trancos e barrancos, mas com conhecimentos valorosos da pesquisa e do empreendedorismo, o agronegócio tem segurado as pontas. Até quando? Novos sofrimentos em cortes de infraestrutura, estradas, pontes, cidades, obras vem por aí. E nas crises, ora as crises, acionistas, donos, as coisas mudam de mão. Uma pena para os que saem, mas a roda viva das incertezas quando as estratégias são frágeis anunciam novos senhores. Que eles sejam mais auto-organizados, aumentando o diálogo e a consciência da população, pois fica provado, se La Donna é mobile, como canta Pavarotti, na ópera de Verdi, muda com o vento também o seu pensamento, da mesma forma os governos são infláveis, balões que nascem cheios de ar, mas esvoaçam erráticos pelos seus bicos desamarrados, terminam sendo nada confiáveis.

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