Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap)
Aparentemente o governo da presidente Dilma é contra o projeto de lei que autoriza a terceirização generalizada nas empresas, mas o seu ministro da Fazenda pediu a inclusão de artigo de interesse do Tesouro no projeto.
Ao negociar a inclusão de artigo para determinar que os impostos e contribuições sociais fossem recolhidos na fonte, ou seja, pela empresa contratante, na prática, o ministro legitimou o projeto e se comprometeu com seu conteúdo, dificultando eventual veto presidencial.
Também foi visto com estranheza o silêncio da presidente, de seu ministro do Trabalho e até do ex-presidente Lula – que inclusive pediu a retirada do Congresso de projeto com conteúdo idêntico – no momento em que os trabalhadores mais precisavam do apoio do governo para barrar a versão do projeto em bases precarizantes. A única manifestação, e tardia, veio do ministro da Secretaria-Geral da Presidência.
Aliás, tem sido muito contraditório o comportamento dos ministros do governo Dilma em relação aos temas trabalhistas. Isso é comum em governos de coalização, mas no atual chegou ao seu ápice.
Por exemplo. Enquanto os ministros do Trabalho e da Secretaria Geral da Presidência, que estão empenhados em defender as MPs 664 e 665 do ajuste fiscal, fazem declarações retóricas contra a redução ou flexibilização de direitos, os ministros que representam o setor empresarial agem ostensivamente em sentido contrário.
Podemos incluir na categoria de defensores da flexibilização: o ministro da Fazenda, que representa o sistema financeiro; o ministro da Indústria e Comércio Exterior, que defende e representa o setor industrial e o empresariado urbano; a ministra da Agricultura, que representa e defende o agronegócio; e o ministro das Pequenas e Micro Empresas, que representa e defende os interesses das associações comerciais.
Sem o apoio do governo, a correlação de forças nos temas de interesse dos trabalhadores no Congresso será aquela verificada na votação do projeto de terceirização, que obteve 324 votos favorável, 137 contrários e duas abstenções.
No encaminhamento da votação, com o governo alheio ao debate, somente o PT, o PCdoB e o PSol recomendaram o voto contra o projeto. Liberaram suas bancadas o Pros e o PSD. Todos os demais, inclusive PSB, PPS e PDT, recomendaram o voto a favor do projeto.
Se concluída a votação do texto em bases precarizantes na Câmara e no Senado, a presidente Dilma, que já fragilizou seu discurso contra a redução de direitos ao editar as MPs 664 e 665, estará diante de um dilema real: cumprir sua promessa de não mexer nos direitos trabalhistas, vetando total ou parcialmente o projeto, ou desautorizar seu ministro da Fazenda e enfurecer, ainda mais, o presidente da Câmara, que estabeleceu a regulamentação da terceirização como uma de suas prioridades.
A situação, como se vê, não é confortável. Ou a presidente, se o projeto for à sanção reduzindo direitos, veta e edita uma MP para explicitar a responsabilidade solidária e a proibição da terceirização em atividade fim, ou estará desagradando a classe trabalhadora e acelerando a perda de legitimidade de seu governo também nesse segmento.