Quinta, 28 Março 2024

Advogado especialista em Direito Constitucional, Civil, Tributário e Coletivo do Trabalho

Recente decisão de nossa Suprema Corte, por expressiva maioria, emitiu decisão, conduzida pelo voto do Relator, Ministro Gilmar Mendes, e reduziu o prazo de prescrição para que os trabalhadores ingressem com ação judicial pedindo valores do FGTS não depositados,  de 30 para 5 anos. Em verdade, para 2, porquanto os 5 são contados durante a vigência do contrato de trabalho. E todos sabem que demandar o empregado contra o empregador durante a fluência do contrato de trabalho é pôr-se na rua, desempregar-se, posto que nada impede sua demissão. E seria um truísmo dizer que o empregador demandado suporta um empregado que contra ele bateu às portas da Justiça, salvo nos pleitos coletivos formulados pelos Sindicatos. Assim, o verdadeiro prazo para que o empregado reclame judicialmente o inadimplemento do empregador aos depósitos do FGTS é de 2 anos, a contar da rescisão do contrato de trabalho, em que o empregado se encontra supostamente livre para ajuizar a ação judicial. Supostamente, porque uma boa parte das empresas se comunica antes de admitir um novo empregado, e aquele que ousou bater às portas do Judiciário ganha o caminho do ostracismo laboral;  pouco importando se com ou sem razão, não é admitido. Essa tendência vem sendo minorada num clima de desemprego pouco expressivo, porém tende a voltar quando a economia cíclica voltar a um período de vacas magras.

Em nosso modo de ver, o STF, além de adotar posição francamente antissocial, encampou interpretação constitucional irresistente a crítica mais profunda. Talvez seja a primeira oportunidade em sua história que a Suprema Corte altere um prazo prescricional, sediado no campo das leis ordinárias. O Recorrente foi o Banco do Brasil, que, com semelhante posição, certamente procurou deixar de honrar obrigações trabalhistas,  sob o manto da ação judicial tornada impossível, pelo simples decurso do tempo.

O equívoco do STF foi de natureza interpretativa. Como afirmado, os Ministros se valeram do disposto no art. 7º da Constituição da República - incisos III e XXXIX - para reduzir o prazo trintenário, entronizado em nosso sistema jurídico pelo art. 23 da Lei 8.036/1990, combinado com o art. 55 do Decreto 99684/90. Esses dois incisos do art. 7º da CF não cuidam de prescrição específica do FGTS, instituto que, como é óbvio, é contrário ao interesse e ao direito dos trabalhadores e, reversamente, como é óbvio,  contrapartida de locupletamento de empregadores que não cumpriram seu dever de, mensalmente, efetuar o depósito garantidor.

O primeiro deles (III) consagra o FGTS como direito dos trabalhadores. E o XXXIX aumentou o prazo prescricional das ações trabalhistas, anteriormente de dois anos, indistintamente. O art. 7º, em que se inserem, descreveu o universo protetivo dos direitos trabalhistas. Concedeu envergadura constitucional a direitos antes previstos na CLT, em leis ordinárias e convenções coletivas de trabalho. Assim como o art. 5º tratou de tutelar os direitos e garantias individuais, que encontram sua fonte civilzatória nas constituições libertárias do mundo, o art. 7º consolidou os direitos conquistados, sem exagero e com escusas pela expressão conhecida, ao longo do tempo e dos lugares, ao preço de sangue, suor e lágrimas.

Nossa Constituição cidadã, para diferenciar-se das anteriores, disciplinou esses direitos do homem e do homem trabalhador logo nas primeiras letras do código magno, precisamente para acentuar sua importância. E não há constitucionalistas que não os considerem preceitos fundamentais, que sobrelevam em importância sobre outras normas eventualmente previstas no próprio texto constitucional.

É evidente que esses dispositivos - arts. 5º e 7º da CF - somente consagraram benefícios a seus destinatários. É absolutamente incompatível com sua finalidade excluir ou restringir direitos. À lei interpretada por sua finalidade denominamos de interpretação teleológica. O preceito constitucional pode não ser ampliado pela jurisprudência, mas jamais restringido. Portanto, nenhum deles foi adequado à redução de prazo prescricional. É como se alguém entrasse num templo religioso para render loas ao demônio. A incompatibilidade era manifesta, mas, ainda assim, a maioria dos doutos ministros considerou que poderia acanhar, num texto de tutela de direitos, um daqueles nele proclamados.

Muito ao contrário, constituições, principalmente da CE, como a portuguesa, deixaram clara nesses textos uma cláusula complementar e fucional: a proibição de retrocesso, fortes no entendimento de que os povos trabalhadores não podem retroceder em suas conquistas. Trata-se de uma questão polêmica, mas, de todo modo, que não pode ser objeto de interpretação dos Tribunais, senão por emenda ao texto maior, promulgada pelo Legislativo e, dada sua importância, até mesmo seguida de consultas populares. Assim se deu em Portugal, que se viu obrigado a recuar desse importante princípio para ingressar na UE.

O FGTS não recolhido é recebido pelos empregadores. Esclarece-se: integram o preço de venda dos podutos, ao qual são repassados, além dos custos produtivos.  O enriquecimento ilícito é manifesto e, como tantas outras iniquidades, plasmam a injustiça social brasileira.

Não será por dissolução de direitos do trabalho que o Brasil crescerá harmonicamente, com poder de consumo e evolução de nossos compatriotas pela meritocracia respeitada pelo direito. E tampouco por um assistencialismo demagógico, fulminante da criatividade e estimulante da leniência. E com respeito mútuo entre empregados e empregadores, na constituição de um estado em que reine o bem estar social e não o fosso que conduz ao desapreço pelo trabalho e à criminalidade.

Os diversos movimentos sindicais não se deram conta da recente decisão do Supremo. Se este se pôs  a legislar, que o fizesse com as galerias lotadas e com as manifestações democráticas em suas cercanias. Sabemos que essa não é a praia dos magistrados. E há solução: malgrado a decisão da Suprema Corte, projeto de nova lei poderá fazer as águas voltarem a seus cursos naturais. Até, pelo menos, em mais outros vinte anos, em que poderemos ter novo pronunciamento de nosso Excelso Pretório, quando talvez o amadurecimento jurídico da hermenêutica afaste a Corte  de pronunciar-se novamente sobre prazo para ajuizamento de ações trabalhistas.

 

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