Marília Cardoso*
Somos seres sociais. Precisamos dos outros do momento em que nascemos ao que morremos. Crescemos sempre rodeados de pessoas. Nessa estrada da vida, alguns se vão antes do que gostaríamos. Outros, somos nós mesmos que preferimos que desembarquem.
Entre chegadas e partidas, estamos sempre rodeados por grupos, seja no trabalho, na universidade, no clube. Isso é não só saudável, como muito necessário ao nosso próprio desenvolvimento. O problema é que, normalmente, estamos sempre rodeados de pessoas muito parecidas com a gente.
Nos aproximamos por afinidades, classe social, preferências. Nos acostumamos a conviver com pessoas que pensam e acreditam no mesmo que nós. E assim, vamos vivendo dentro de perfeitas bolhas impenetráveis, sendo muitas vezes, quase impossível ver o que está além, do lado de fora.
A tecnologia chega e reforça ainda mais essas muralhas invisíveis. Os algoritmos, que se julgam muito espertos, nos trazem só aquilo que eles pensam que queremos ver. Dessa forma, como num ciclo sem fim, constituímos ideias dentro de paredes imagináveis que separam o “nós” e o “eles”.
Cada vez mais fechados em nossos próprios círculos, ficamos dentro de redomas de vidro, blindados a tudo o que é diferente de nós. Ao menor sinal de contato com outras versões, nos armamos de argumentos sem nem ao menos sermos capazes de ouvir outras partes.
Nesse contexto “emsimesmado”, deixamos de lado a riqueza da diversidade. Ficamos colecionando figurinhas repetidas em vez de partir em busca da amplitude do álbum. Quem tem mais idade do que nós, é velho demais. Quem tem menos, é infantil. Quem tem mais dinheiro, é esnobe. Quem tem menos, é miserável. Quem pensa diferente é, simplesmente, esquisito.
Esse é um movimento tão limitante que até as empresas já se atentaram. Não é à toa que muitas estão criando um novo cargo: o chefe de diversidade. Esse profissional tem a missão de garantir que a empresa tenha pessoas de vários gêneros, idades, classes sociais e principalmente experiências muito diversas. É essa mistura de olhares e visões que garante um ambiente realmente fértil para o novo.
A questão é tão séria que, recentemente, criaram o processo seletivo às cegas. A empresa descreve as características de uma vaga e entrevista os candidatos de forma virtual, distorcendo sua imagem e voz. Não é possível julgar e nem ser preconceituoso com nenhuma informação que não esteja contida apenas na comunicação com o candidato.
Os diplomas também estão sendo deixados de lado. A escola da vida, muitas vezes, ensina muito mais do que universidades de renome. O passado profissional importa pouco. A capacidade de construir um futuro alinhado com as perspectivas da empresa é muito mais importante do que o histórico. Trata-se de uma contratação projetada para o amanhã, não para o ontem.
Nesse ambiente, as chamadas soft skills, ou habilidades comportamentais, ganham ainda mais relevância. Do que adianta dezenas de formações técnicas e uma alta capacidade de entrega, se o profissional é incapaz de trabalhar e colaborar com o grupo?
Pesquisas mostram que profissionais de diferentes cargos e níveis são contratados por suas habilidades técnicas e demitidos por suas inabilidades comportamentais. E, num contexto de grandes e profundas revoluções tecnológicas, onde as tarefas técnicas estão ficando cada vez mais automatizadas, as capacidades comportamentais devem continuar se sobressaindo.
A colaboração, dentro de um contexto de ampla diversidade, livre de pré-conceitos e pré-julgamentos, promete ser uma maneira muito mais proveitosa de vivermos em grupos. A construção de uma nova sociedade depende de novas e nobres atitudes.
É jornalista, com pós-graduação em comunicação empresarial, MBA em Marketing e pós-MBA em inovação. É empreendedora, além de coach, facilitadora em processos de Design Thinking, professora de inovação em universidades e consultora na PALAS, consultoria de inovação e gestão.