Sexta, 22 Novembro 2024

João Badari*

A reforma da Previdência Social, pregada há algum tempo como a salvação da pátria para a solução dos problemas financeiros do país, contém dispositivos pouco comentados, mas que afetarão diretamente o futuro dos trabalhadores e aposentados. Um deles trata da competência delegada para o ajuizamento de ações contra o INSS, dentre elas as revisões de benefícios.

A competência delegada, garantida por nossa Constituição Federal, é a possibilidade do segurado ingressar com a ação na Justiça Estadual mais próxima do seu domicílio, quando o mesmo não contar com unidades da Justiça Federal. Recentemente, foi aprovada uma lei que veda tal garantia se houver fórum Federal no raio de 70 quilômetros de distância da localidade do autor da ação. Isso é um erro, e não respeita a realidade social e geográfica do país. A lei entra em vigor apenas em janeiro de 2020, e depende da aprovação da PEC para valer.

Importante frisar que, em muitos casos, segurados não conseguem se dirigir ao banco em sua própria cidade para realizar a prova de vida e continuar recebendo seu benefício, em razão da dificuldade de locomoção por incapacidade. Agora, imagina se esses beneficiários poderão percorrer longos 70 quilômetros para buscar o socorro do Judiciário para garantir seu direito.

A competência delegada se mostra como alternativa para as pessoas que não apresentam possibilidade de se dirigir a Justiça Federal. E restringir este meio terá graves consequências: muitos segurados e aposentados não terão condições de se locomover e com isso o direito não será alcançado, E os que, com dificuldade, conseguirem irão ter processos mais custosos e dificultosos para a obtenção do direito. Isso sem contar o volume ainda maior de processos na Justiça Federal, provocando uma sobrecarga ao sistema. Vale ressaltar que no projeto não existe nenhum item para o aumento da atual estrutura física da Justiça Federal.

Em razão da menor estrutura física da Justiça Federal tal, garantia foi consolidada, pois a Justiça Estadual possui estrutura, além da presença, em quase todas as cidades do país; ou em cidades vizinhas à residência do autor da ação.

Foi desconsiderado que os processos serão mais longos, devido à necessidade de adiamentos de audiências e demais atos processuais, contrariando o princípio da razoabilidade, previsto no artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal: 'a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.'

Particularmente, a medida subestima os juízes estaduais, pois não existe outro motivo em retirar essa garantia constitucional a não ser que o governo não confia na magistratura estadual no julgamento de ações contra o INSS. Mais um erro.

Militando por anos na esfera municipal eu sou categórico em afirmar: são absurdamente competentes os magistrados de varas do interior, que julgam causas previdenciárias, com enorme experiência na matéria e decisões que se mostram como aulas de Direito Previdenciário.

Entendo, assim, a medida como inconstitucional, pois o projeto vem de encontro ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado na Constituição Federal, como direito ou garantia constitucional (art.5º, XXXV), logo, cláusula pétrea, imodificável, conforme determina o artigo 60,§4º, IV, do Texto Constitucional.

Portanto, a emenda, ao exigir a propositura das ações previdenciárias na Justiça Federal, dificulta, inviabiliza, o acesso à jurisdição das pessoas; conforme o artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, 'a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito'.

Em sua gritante maioria, os que pleiteiam ações contra o INSS são pessoas com pouco recursos financeiros e de saúde, onde o deslocamento se mostra dificultoso, por isso a vontade do governo em restringir o acesso ao judiciário: contenção de gastos com a judicialização. Importante divulgar e lutar contra este retrocesso, enquanto a PEC não foi finalizada, pois após sua aprovação será tarde.

João Badari
* É especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados

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*Todo o conteúdo contido neste artigo é de responsabilidade de seu autor, não passa por filtros e não reflete necessariamente a posição editorial do Portogente.

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