Quinta, 18 Abril 2024

José Antônio Homerich Valduga, sócio da Blasi & Valduga Advogados Associados

Trabalhar com o comércio exterior, mais especificamente com importação, pode ser um grande desafio - dada a imensa insegurança jurídica gerada, principalmente, por órgãos como a Receita Federal. A falta de um entendimento da legislação e de bom senso leva vários importadores a buscarem na justiça seus direitos ou até mesmo a desistirem desta atividade.

Antes de mais nada, vale ressaltar que o processo de importação no Brasil é um dos mais complexos que existem no mundo. Isso porque em 1976 o Governo deu competência legislativa, por meio de medida provisória, para que a Receita Federal pudesse regulamentar as operações de comércio exterior. Não houve nenhum processo legislativo validando essa designação, simplesmente destinou-se poder a um órgão executivo que criou uma série de instruções normativas e interpreta a lei da forma que for conveniente. São inúmeros os casos na justiça que questionam a atuação do órgão, como discussões sobre IPI na revenda de importados, reclassificação fiscal, ex-tarifário e o mais polêmico: interposição fraudulenta. E é sobre ele que vamos falar.

O Brasil, em função de uma série de acordos internacionais que determinaram controles contra a lavagem de dinheiro no comércio exterior, criou a lei 9613. Essa lei tem uma matriz que diz que só se configura lavagem de dinheiro quando o recurso é fruto de um crime antecedente, ou seja, existe um crime de sonegação, caixa dois, tráfico que gerou aquela disponibilidade financeira. Esse dinheiro de atividade ilícita, quando lavado, está sujeito a tipos específicos enquadrados na lei 9613.

Nesse âmbito, temos também a lei 10637 que introduz no decreto lei 1455/76, inciso 5º do artigo 23, a ocultação de bens e pessoas no comércio exterior. Ele vem tratar exatamente do uso de recursos ilícitos em operações de importação. A partir daí a Receita Federal se apropria do dispositivo dessa lei para fazer uma interpretação elástica de tudo que se faz na atividade.

Vou dar um exemplo. Eu tenho duas empresas, a 'empresa A' que é dedicada a operações de varejo e a 'empresa B' que é dedicada a operações de atacado. A 'empresa A' é antiga e capitalizada, já a 'empresa B' é nova e sem muitos recursos ainda, mas com a estrutura societária idêntica a da outra. As duas só têm objetos diferentes de trabalho. Então a 'empresa A' empresta dinheiro para a 'empresa B' para que ela comece a operar. São os mesmos sócios, foi transferido o dinheiro da pessoa jurídica A para a pessoa jurídica B. Na sequência, a 'empresa B' realizou várias operações de comércio exterior. Pois bem, neste caso, que é real, a Receita Federal afirmou que se trata de uma interposição fraudulenta por ocultação de pessoas. Isso porque o dinheiro não era da "empresa B" e sim da "empresa A". Então fica a pergunta: para ser enquadrado nessa acusação o dinheiro não deveria ser ilícito? O dinheiro da 'empresa A' foi obtido por meio de crime antecedente?

O fato é que para a Receita Federal duas empresas com a mesma composição societária não têm direito à livre iniciativa para estruturar as suas operações. Antecipar recursos legítimos para alguém realizar uma operação é considerada uma fraude, virou crime, por quê? Isso é muito grave. As pessoas envolvidas estão respondendo processos criminais e estão recebendo multas milionárias, não tributárias e sim por perda de mercadoria. É um desacerto absurdo dentro da interpretação legal.

Isso gera insegurança jurídica neste mercado. Porque as coisas mais banais em uma atividade comercial, quando levadas ao comércio exterior viram crime. Isso limita a capacidade do empreendedorismo da sociedade brasileira. Esse controle da atividade econômica é contrária à constituição, POIS as empresas não têm liberdade para operar, elas já entram na atividade com uma camisa de força.

Hoje, a Receita Federal é um grande vetor de impedimento do desenvolvimento econômico, porque para exercer o seu controle na plenitude, a primeira palavra dela é o não, a fraude, é o dolo, é a simulação, onde na verdade não existe. Em mais de 30 anos atuando na área de aduaneira, eu não conheço um processo de ocultação de bens, valores ou pessoas em que a Receita tenha provado que a origem dos recursos era ilícita. Ela nunca prova, ela presume.

Resta agora saber se as medidas planejadas pelo Governo serão postas em prática e vão conseguir inverter esse jogo. Um cenário em que o que a empresa declara está correto até que se prove ao contrário. Não seria esse o preceito de justiça?

 

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