Quarta, 27 Novembro 2024

Marcos Cintra é doutor em Economia e professor-titular da Escola de Administração de Empresas de São Paulo -EAESP/FGV e presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos)

Cada vez mais a tecnologia digital e a globalização impactam negativamente os tradicionais modelos tributários ao redor do mundo. Perdas bilionárias de arrecadação ocorrem resultantes de sistemas convencionais de impostos e contribuições que não conseguem alcançar transações em um ambiente onde as economias estão cada vez mais integradas e comandadas por um intenso fluxo de bits and bytes.

Tentando encontrar uma saída para a evasão crescente de recursos, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) demonstrou por meio de um plano de ação denominado “Addressing Base Erosion and Profit Shifting” preocupação com a erosão das bases tributárias dos países membros da entidade e propôs medidas visando enfrentar o problema. O foco principal diz respeito à necessidade de combater esquemas de planejamento tributário praticado por grupos econômicos que se aproveitam de lacunas normativas e assimetrias dos sistemas tributários nacionais para transferir lucros para países com tributação reduzida ou inexistente.

No trabalho apresentado pela OCDE ainda prevalece a ideia de tapar buracos aqui e acolá para minimizar as perdas de arrecadação. Não se questiona a eficiência e a eficácia de uma estrutura tributária que podia funcionar em uma época onde predominava o nacionalismo e a tecnologia digital era algo meramente futurista.

As bases tributárias convencionais envolvem uma tecnologia complexa, artesanal e contraditória frente à realidade da globalização e da economia digital. Exigem de cada pagador de impostos a autoapuração e o oferecimento de seus rendimentos à tributação e sua posterior submissão a auditorias para aferir a veracidade das informações. Nesse sistema a fiscalização exige o acompanhamento físico das transações econômicas, uma tarefa cada dia mais difícil e onerosa de ser realizada com sucesso. As transações eletrônicas, o comércio pela internet, a volatilidade e mobilidade de fatores, capitais, mercadorias e serviços tornam a tarefa quase impossível de ser concretizada por haver necessidade de fiscalizar e auditar um número incalculável de transações que se realizam a cada momento.

O ambiente digital é uma realidade que faz com que inovações ocorram de modo cada vez mais rápido. Os fluxos de bits and bytes transportando dados, que antes impactavam fundamentalmente elementos intangíveis, hoje também afetam elementos tangíveis de modo extraordinário. Aspectos concretos, palpáveis, da atividade de produção são cada vez mais determinados pela era digital. Em seminário realizado ano passado, o especialista em finanças públicas da Fundação Getulio Vargas, Fernando Rezende, afirmou que o mundo atual é marcado pela virtualização das transações, caracterizado pela substituição das máquinas e outros ativos físicos pela capacidade intelectual; por amplas redes unindo fornecedores, clientes e até competidores; e que torna irrelevante a localização das plantas empresariais.

No mundo comandado por impulsos elétricos a cobrança de tributos deve ser automatizada, incidindo diretamente sobre a moeda eletrônica que circula no sistema bancário. É um fato que irá se impor. É a forma de tributação que se ajusta ao ambiente digital e que é capaz de corrigir distorções como a predominância de informações assimétricas no sistema econômico e a sonegação.

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