Roberta Züge, diretora administrativa do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS); vice-presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná
Hoje, caso questionemos algum adolescente – alguns nem tão adolescentes assim –sobre algo totalmente indispensável, provavelmente, a energia será a primeira resposta. Sem dúvida, é algo que altera a vida de todos.
Mas, antes da energia, vem a ÁGUA; e, aliás, cerca de 70% da energia elétrica do Brasil também depende dela. Não foi coincidência que as primeiras civilizações se desenvolveram as margens de rios e córregos. Além da ingestão, a água é imprescindível para a produção de alimentos.
Por muito tempo a questão da água, especialmente no Brasil, foi negligenciada. Pela abundância e facilidade de acessá-la, poucos cuidados eram realizados. Extraindo regiões que são históricas de escassez, muito por falta de políticas públicas sérias, afinal era a muleta para desvios de dinheiro. Casos de corrupção conhecidos, utilizando a deficiência natural de água, datam da década de 70; o “escândalo da mandioca”, em Pernambuco, foi um clássico. Estima-se que R$ 1,5 bilhão foram desviados do Proagro.
Neste caso, os bancos realizaram empréstimos supostamente para o plantio de mandioca, feijão, cebola e algumas outras culturas, para pessoas munidas de documentos falsos. Sequencialmente, os pagamentos não eram realizados, porque se alegava que a seca destruíra as plantações – aquelas que nunca haviam sido realizadas. Mas, houve um ano de chuvas adequadas, e, não existiam plantações? As fraudes foram descobertas. Eles não tinham combinado com o clima. A água estava lá.
Outras regiões, onde o acesso de água é fácil e há chuvas distribuídas de forma mais harmônica, sequer existiam políticas e programas sérios que focassem a preservação deste bem precioso, assim como o uso racional. Nas ultimas décadas, este cenário tem se modificado. Além de o acesso a informação ter sido ampliado, o que facilitou a sensibilização da população quanto a água, assim como, racionamentos em diversas cidades, mais brasileiros estão engajados na preservação.
Um fato, a agropecuária consome 70% de toda a água utilizada no planeta, segundo o Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Produzir alimentos necessita de muita água. Quanto menos desenvolvido o país, maior é o consumo. Os dados da Embrapa indicam que mais de 70% da água, que é destinada a agropecuária, é utilizada na irrigação e 11% para hidratação dos rebanhos. Lembrando que parte do que é irrigado, também é consumido pelos animais de produção.
Pelo alto consumo de água na irrigação, novas tecnologias e manejos estão sendo desenvolvidos para mitigar as perdas. Estudos da FAO demonstram que cerca de 60% da água utilizada em irrigação se perde pela evaporação. Algumas mudanças de manejo podem alterar bem este número. É importante salientar que a irrigação, apesar do custo hídrico, é imprescindível, pois, aumenta imensamente a produtividade, extremamente significante para minimizar o custo dos alimentos.
Condenar a agropecuária pelo alto consumo de água é como punir um professor por utilizar muito giz escrevendo na lousa. Deve-se capilarizar as técnicas e os manejos desenvolvidos, para um uso mais racional, mas é uma dependência que sempre existirá. Os volumes consumidos também serão superiores que as cidades. O campo precisa produzir alimentos para as pessoas nas cidades. Os alimentos, sejam eles de origem vegetal ou animal, demandam altas quantias de água. E todos precisam de alimentos. E água, muita água!