Sábado, 21 Dezembro 2024

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, chega nesta sexta-feira ao seu 10º e último dia sob o clima da insatisfação. De chefes de Estado e de Governo aos mais diversos movimentos sociais, o sentimento expresso no Rio de Janeiro é de decepção com os resultados pouco efetivos do documento final. Em meio a críticas, o governo brasileiro e a ONU defendem consenso do texto construído pelos negociadores por meses, mas que chegou ao encontro com pouquíssimos pontos acordados.

Ao participar do Fórum de Mulheres Líderes, a presidente Dilma Rousseff voltou a defender o documento final elaborado pela ONU, ressaltando que é fruto do consenso e que é importante obter-se textos únicos. Mesmo assim, foi criticada pela supressão da expressão “direito reprodutivo das mulheres” do documento, cedendo a pressões do Vaticano. Por isso mesmo, Dilma elogiou a presidente da ONU Mulheres, a ex-presidente do Chile Michele Bachelet, por ter conseguido tirar um documento único das mulheres, com consenso de todos os países, respeitando as diversidades.

Depois de discursar na quarta-feira falando que esperava que o documento final fosse mais ambicioso, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, voltou atrás, e frente ao descontentamento de Dilma, convocou a imprensa nesta quinta-feira para dizer que o texto conclusivo já era sim “ambicioso”, além de “amplo e prático”. Ban Ki-moon aproveitou para cobrir a presidente Dilma e sua equipe diplomática de elogios, num momento em que as críticas generalizadas ao documento final causam desconforto no governo brasileiro. “Seria justo para a população brasileira saber qual foi a contribuição que o Brasil teve para o sucesso da Rio+20”, disse, acrescentando que “este é um documento final contendo pacotes amplos, ambiciosos e práticos para o desenvolvimento sustentável, garantindo os três pilares dos nossos objetivos - equidade social, desenvolvimento econômico e sustentabilidade ambiental”.

Segundo fontes diplomáticas, a irritação do governo brasileiro foi transmitida de forma “pouco suave” à ONU, e partiu principalmente da presidente Dilma Rousseff. Na ONU, há certo desconforto com a situação. A visão é de que a diplomacia brasileira conseguiu de fato um grande feito em fechar em dois ou três dias um documento que vinha sendo debatido pelos países, com um enorme número de discordâncias, por meses. Há genuína admiração pelo trabalho do Itamaraty. Por outro lado, a percepção é de que seria impossível, mesmo para a hábil diplomacia brasileira, resolver um número tão grande de contenciosos sem reduzir a substância e a ambição do texto. A timidez do documento final é uma conclusão quase unânime, variando apenas o grau da crítica - muito mais ácida no caso das ONGs, atenuada e buscando aspectos positivos no caso dos governos que vão assinar o texto.

Um experiente diplomata lembrou que o ex-presidente Lula propôs a realização da Rio+20 em 2007, quando o mundo estava no ápice do boom econômico, e havia um otimismo generalizado. A conferência em si, porém, acabou sendo realizada na esteira da crise econômica, o que reduziu muito a disposição de financiamento dos países ricos. Isso, por sua vez, tornou o ambiente de negociação mais recriminatório e menos propenso a se alcançar a tão almejada ambição.

Movimentos sociais apresentam sugestões ao texto final da Rio+20
Enquanto chefes de Estado e de Governo participavam dos debates no Riocentro, grupos inconformados com os rumos das discussões oficiais e com o documento final que os líderes vão assinar ao fim do encontro reivindicavam maior participação social nas decisões. As organizações não-governamentais (ONGs) divulgaram uma carta de repúdio aos resultados diplomáticos da conferência. O texto é assinado por ícones do movimento ambientalista, como o cientista Thomas Lovejoy e a ex-ministra Marina Silva. O documento acordado entre os países para ser aprovado na plenária final da Rio+20 é classificado como “fraco e muito aquém do espírito e dos avanços conquistados nestes últimos 20 anos, desde a Rio-92”.

Do lado de fora do pavilhão onde ocorre o encontro das lideranças mundiais, integrantes de diversos movimentos sociais se reuniram e decidiram fazer uma retirada simbólica da conferência. Segurando faixas e cartazes, eles deixaram o local na tarde de quinta-feira e, em coro, diziam: “o futuro que nós queremos não está aqui”.

Um grupo de cerca de 400 índios tentou entregar uma declaração de cinco páginas em que expressam sua opinião em relação à Rio+20. O chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho, foi ao encontro dos índios e recebeu uma cópia do documento. O grupo se dispersou e voltou aos ônibus depois do encontro com o ministro. Entre as propostas apresentadas figuram “a proteção dos direitos territoriais indígenas, o fim da impunidade dos assassinos e perseguidores das lideranças indígenas, o fim da criminalização das lideranças indígenas; a ampliação dos territórios indígenas; o monitoramento transparente e independente das bacias hidrográficas; o reconhecimento e fortalecimento do papel dos indígenas na proteção dos biomas; e a melhora das condições de saúde dos povos indígenas”.

Cúpula dos Povos contesta modelo atual e ideia de economia verde
A Cúpula dos Povos apresenta na sexta-feira ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, o seu documento final em que resume as discussões no Aterro do Flamengo desde a semana passada. O texto, assinado pelas mais de 70 organizações, refuta, em especial, as resoluções da Rio+20. “Nós da sociedade civil lamentamos, mas o documento da ONU é fraco, medroso e não avança no sentido de uma sociedade mais justa”, afirma Iara Pietricovsky, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

O documento é resultado de cinco plenárias organizadas em torno dos temas soberania alimentar, trabalho, energia e empresas extrativistas, defesa dos bens comuns e justiça social. Além do consenso contra a Rio+20, a cúpula contesta a ideia de economia verde e o atual modelo de desenvolvimento. “Nós defendemos um modelo que significa uma crítica frontal à mercantilização e à financeirização da vida”, explica Iara.

A Cúpula dos Povos também propõe uma agenda de mobilização para além da Rio+20. “Não queremos apenas fazer uma análise, mas apresentar propostas para melhorar a situação da população”, completa a chilena Marcela Escribano, do grupo de articulação da cúpula.

Fonte: Jornal do Comércio

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