A juíza da Justiça Federal de Santa Maria, Simone Barbisan Fortes, acatou ontem a denúncia contra 40 dos 44 nomes arrolados na acusação do Ministério Público Federal (MPF), por envolvimento na fraude que desviou mais de R$ 44 milhões do Detran. "Os indícios são suficientes para entender a vinculação destas pessoas com os fatos, pelo menos neste momento", justificou. A decisão inclui a aceitação dos crimes arrolados pelo MPF para cada indiciado.
As quatro pessoas preservadas são Ronaldo Etchechury Morales, ex-presidente da Fatec, Luis Felipe Tonelli de Oliveira, Sérgio de Moraes Trindade e Jorge Alberto Viana Hossler. "Não há indícios suficientes da participação deles nesta suposta atividade criminosa", disse Simone, ao acrescentar que eles continuarão a ser investigados.
Com a decisão, divulgada doze dias após a entrega do documento do MPF, os 40 denunciados passam à condição de réus. A previsão é de que eles devem ser ouvidos entre os dias 19 e 29 de agosto. A ordem dos depoimentos, no entanto, não foi divulgada. A intenção de Simone é de encerrar os julgamentos em menos de um ano. No entanto, o andamento da ação vai depender da defesa, principalmente dos depoimentos. A maioria deles deve ocorrer na cidade de Santa Maria, mas não está descartada a possibilidade de que precisem ser realizados em outros municípios.
A Justiça também deve estudar a limitação do número de testemunhas. "Estamos assumindo o compromisso de dar um andamento célere ao processo e fazer valer as garantias processuais para que, ao final, se chegue a um julgamento justo", argumentou. Conforme Simone, a Justiça está montando uma estrutura específica, inclusive com a digitalização dos dados, para acompanhar a ação "que tem uma dimensão expressiva e um número significativo de réus", afirma.
Ela informa que os bens dos indiciados continuarão bloqueados até o final do processo. "O intuito é preservar o interesse público e, havendo condenação, esses bens poderão repor o prejuízo que venha a ser verificado ao erário público".
O documento da denúncia será entregue à CPI do Detran, que também terá acesso às escutas telefônicas. Porém, os dados financeiros, bancários e fiscais continuarão preservados. "A partir de agora, a CPI pode ter acesso a todo o conteúdo da investigação e do processo. Só não pode fornecer cópias da ação penal a terceiros", informou.
12 anos
Ao relatar suas conclusões sobre a análise da denúncia, a juíza Simone Barbisan Fortes afirmou que "há a possibilidade séria de ocorrência de diversos crimes", como a falta de licitação para contratação pelo Detran da Fatec e Fundae, e irregularidades nos contratos entre as fundações e as sistemistas.
"É possível que, nestas circunstâncias, tenhamos a ocorrência dos crimes que o MPF indicou na triangulação Detran-fundações-sistemistas". Entre eles, formação de quadrilha, peculato, desvio, corrupção ativa e passiva e falsidade ideológica. As penas em caso de condenação variam de dois a 12 anos de prisão.
Conforme apontou o MPF, a ação, que desviou cerca de R$ 1 milhão ao mês dos cofres públicos, pode ser dividida em dois momentos, em que seis núcleos operaram nos desvios: Fernandes, Ferst, Carlos Rosa, Detran, fundações e UFSM.
No primeiro momento, entre julho de 2003 e maio de 2007, o qual o MPF denominou de "a fase das empresas de fachada", firmas laranjas eram usadas para a distribuição da propina.
O Detran pagava a Fatec que passava os recursos para Newmark, Rio del Sur, Pensat e Carlos Rosa Advogados que, por sua vez, repassavam o dinheiro às laranjas MP Pereira e PLS Azevedo, e o fluxo financeiro voltava aos diretores do departamento.
Na segunda fase, entre maio e novembro de 2007, o esquema foi simplificado e a propina passou a ser distribuída em malas, daí o nome "fase da mala". Neste período a Fatec passa a ser contratada da Fundae que assume o convênio com o Detran. A fundação passa a manter um novo grupo de sistemistas integrado pela Pensant, Nachtigall S3, Doctus, GCPlan e IGPL.
A lista dos 40 réus e seus crimes
Alexandre Dorneles Barrios: advogado do Detran na gestão de Carlos Ubiratan dos Santos e da NT Pereira; formação de quadrilha dispensa de licitação e falsidade ideológica.
Alfredo Pinto Telles: sócio da Newmark; formação de quadrilha, dispensa em licitação, peculato, falsidade ideológica.
Dornéu Cardoso Maciel: ex-diretor da CEEE e ex-tesoureiro do PP; formação de quadrilha, dispensa de licitação, corrupção passiva e peculato.
Dahlen Rosa: dono da Carlos Rosa Advogados; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e corrupção ativa.
Ubiratan dos Santos: presidente do Detran entre 2003 e 2006; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, falsidade ideológica e corrupção passiva.
Maria Ferst Ferreira: irmã de Lair Ferst; falsidade ideológica.
Machado de Almeida: sócia da Pakt; formação de quadrilha, peculato e falsidade ideológica.
Trevisan de Almeida: ex-coordenador da Fatec; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, falsidade ideológica, corrupção ativa e passiva.
Denise Nachtigall Luz: sócia da Nachtigall; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato.
Redlich João: suposto laranja de Lair Ferst; peculato e falsidade ideológica.
Wegner Vargas: filho de João Luiz Vargas, presidente do TCE; formação de quadrilha e peculato.
Elci Terezinha Ferst: irmã de Lair e sócia da Newmark; formação de quadrilha, dispensa em licitação, falsidade ideológica.
Ferdinando Francisco Fernandes: sócio da Pensant; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção ativa, falsidade ideológica - todos com agravante.
Fernando Fernandes: filho de José Fernandes; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e corrupção ativa.
Fernando Osvaldo de Oliveira Júnior: sócio da Pakt; formação de quadrilha, peculato e falsidade ideológica.
Flávio Roberto Luiz Vaz Netto: ex-presidente do Detran; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção passiva e concussão.
Francene Fernandes Cardoso: filha de José Fernandes; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato.
Francisco de Oliveira Fraga: secretário de Governo de Canoas; extorsão.
Gilson Araújo de Araújo: servidor do Detran; formação de quadrilha, corrupção passiva e falsidade ideológica.
Hélvio Debus de Oliveira Souza: contador; formação de quadrilha, dispensa de licitação e peculato.
Hermínio Gomes Júnior: ex-diretor-técnico do Detran; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, falsidade ideológica e corrupção passiva.
José Antônio Fernandes: dono da Pensant; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção ativa e falsidade ideológica - todos com agravante.
Lair Antônio Ferst: apontado como um dos mentores da fraude; formação de quadrilha, dispensa em licitação, peculato, corrupção ativa, extorsão, falsidade ideológica - todos com agravante.
Lenir Beatriz Fernandes: mulher de José Fernandes; formação de quadrilha, dispensa em licitação e peculato.
Luciana Balconi Carneiro: ligada à Fatec e sócia da Pak; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e falsidade ideológica.
Luiz Carlos de Pellegrini: ex-diretor da Fatec; formação de quadrilha, peculato e corrupção passiva.
Luiz Gonzaga Isaía: ex-presidente da Fundae; formação de quadrilha, dispensa de licitação e peculato.
Luiz Paulo Germano: irmão do deputado federal José Otávio Germano e prestador de serviços para o escritório Carlos Rosa; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e corrupção ativa.
Marco Aurélio da Rosa Trevizani: contador de Lair Ferst; formação de quadrilha, peculato, falsidade ideológica.
Marilei de Fátima Leal: sócia da Pakt; formação de quadrilha, peculato e falsidade ideológica.
Nilza Terezinha Pereira: sócia da NT Pereira; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e falsidade ideológica.
Patrícia dos Santos: mulher de Carlos Ubiratan e administradora da NT; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e falsidade ideológica.
Paulo Jorge Sarkis: ex-reitor da UFSM; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção ativa e passiva.
Pedro Luiz Azevedo: dono da PLS; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato e falsidade ideológica.
Rafael Höher: filho de Rubem Höher; formação de quadrilha e peculato.
Ricardo Höher: filho de Rubem Höher; formação de quadrilha, dispensa de licitação e peculato.
Rosana Cristina Ferst: irmã de Lair Ferst e sócia da Rio del Sur; formação de quadrilha, dispensa em licitação, peculato, falsidade ideológica.
Rosmari Greff da Silveira: servidora da UFSM; formação de quadrilha, peculato e supressão de documento.
Rubem Höher: sócio da Doctus e coordenador do projeto Detran na Fundae; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção passiva e ativa - todos com agravante.
Silvestre Selhorst: ex-secretário-executivo da Fatec; formação de quadrilha, dispensa de licitação, peculato, corrupção passiva e ativa - todos com agravante.
Fonte: Jornal do Comércio - 28 MAI 08