Hora extra. Atende por esse nome o “clima quente” instaurado na Cia. Docas de Santos, Codesp, a Autoridade Portuária do maior porto da América Latina. A nova diretoria da empresa, empossada no dia 12 de setembro, que mal esquentou a cadeira e gastou a primeira carga de caneta, baixou uma resolução administrativa cortando a hora extra de todo mundo. A medida está rendendo muito bafafá. Para o presidente do Sindicato da Administração Portuária, Everandy Cirino dos Santos, o corte da hora extra é o “bode na sala”, que “está desviando a nossa atenção de assuntos mais importantes”. Um desses assuntos, segundo Cirino, é o Plano de Cargos e Salários.
Debate Sindical quis entender melhor o que está acontecendo realmente na Codesp. Se realmente esse é o principal problema hoje dos empregados da Codesp. Por isso, entrevistamos o sindicalista Everandy Cirino dos Santos. Na última semana, ele solicitou uma reunião com o presidente da Codesp.
Debate Sindical – O Sindicato enviou um ofício para o presidente da Codesp, solicitando uma reunião para discutir o corte das horas extras. O Sindicato já teve retorno dessa solicitação?
Everandy Cirino – Não tive oficialmente, por escrito, mas extra-oficialmente, quando participei de uma reunião do conselho de acionistas da Codesp, o presidente falou que ia marcar uma reunião para tratar do assunto da hora extra. Então, nós estamos aguardando a reunião. Ele disse que vai marcar.
Debate Sindical – Mas o que realmente está acontecendo hoje entre os funcionários da Codesp e a nova direção da empresa?
Everandy Cirino – Aí nos temos dois ângulos. Tem alguns funcionários que estão vendo com uma expectativa positiva a diretoria da Codesp, até porque a diretoria, com habilidade, está fazendo reuniões principalmente com gerentes e superintendentes, pedindo empenho, participação, emoção, aquelas conversas de diretores de empresa. Alguns estão sensibilizados com a colocação, e outros estão com a questão do corte das horas extras que, apesar de ser prerrogativa da empresa, interfere no ganho final. Então nós estamos com essas duas fases com a diretoria da Codesp. E o Sindicato também está tomando alguns cuidados porque a Codesp alega que tem alguns abusos. E eu não quero entrar na discussão do abuso, nós temos de encontrar uma alternativa, um plano para resolver esse impasse da hora extra, que nós não temos culpa. A empresa deixou isso acontecer durante muitos anos e fazer parte do orçamento do salário do pessoal.
Debate Sindical – Qual é a alternativa a que você se refere?
Everandy Cirino – Então nós temos uma alternativa. Não adianta o presidente dizer que o salário está baixo, está baixo por que? Porque tem política antes do governo que diz que o salário do empregado de empresa de economia mista tem que seguir o que é determinado pelo Ministério do Planejamento. Se está com vontade de resolver o problema, nós temos uma proposta clara. Faz um levantamento da média das horas extras e embute no salário, e corta a hora extra. Assim demonstra que tem espírito de recuperação salarial.
Debate Sindical – Cirino, define o que é a realização da hora extraordinária?
Everandy Cirino – Hora extraordinária é quando necessita de trabalhadores e não tem trabalhador, e você continua fazendo a jornada de trabalho.
Debate Sindical – Mas hoje, como você está falando, a hora extra substituindo um salário melhor?
Everandy Cirino – Por que? Porque está com quadro defasado de empregado, então você tem que fazer o serviço. Não tem empregado, você tem que fazer. Uma hora extra que é 100% mais do que a hora normal, fatalmente ela preenche o salário. Isso aí eu não vou esconder.
Debate Sindical – Mas o Sindicato não defende a realização de hora extra.
Everandy Cirino – Eu não defendo. Eu defendo o seguinte: a política da empresa é não fazer hora extra como suporte salarial está correto, no entanto o seguinte, como está sendo feito há muitos anos e tem que cortar por determinação legal, tudo bem, então pega a média dos últimos 12 meses e embute no salário e acaba a hora extra, determina. Ninguém vai ficar brigando com ninguém sobre essa questão mais. Aí não faz o desgaste tanto para a empresa nem para o Sindicato, porque tem que atender o interesse da categoria.
Debate Sindical – Então, quais são as discussões hoje que devem ocorrer entre os funcionários e a empresa?
Everandy Cirino – É a história do “bode na sala”. Jogaram a resolução da hora extra e esqueceram as outras prioridades da categoria. E a primeira prioridade é a revisão do Plano de Cargos e Salários. O plano foi implantado. Não atendeu aos interesses da categoria, não corrigiu salário, não criou...
Debate Sindical – Como você disse colocaram o bode na sala para desviar a atenção do que realmente precisa ser discutido...
Everandy Cirino – O bode na sala foi o corte da hora extra e passou o resto tudo despercebido. A grande prioridade nossa, a expectativa que nós tínhamos com a nova diretoria da Codesp, era discutir o Plano de Cargos e Salários, e aí ficamos tentando marcar uma reunião para esse tema. Aí a Codesp reeditou uma resolução anterior. E aí o Plano de Cargos e Salários passou para segundo plano. E a hora extra agora é o principal assunto. Aí o Sindicato fica fragilizado porque a hora extra não é o trabalhador que determina, e sim o empregador. E o empregador, por seu lado, fica fortalecido dizendo que a hora extra não é para fazer parte do salário, e passa por bonzinho, e o Sindicato que está cobrando uma briga de hora extra não prioriza a discussão que é principal, que é a do Plano de Cargos e Salários.
Debate Sindical – Cirino, explica para a gente, de forma objetiva, quais são as reivindicações principais da categoria hoje, além do Plano de Cargos e Salários?
Everandy Cirino – Importante na Codesp: primeira coisa, é fazer um novo organograma na empresa. A empresa desde que saiu da operação não tem o cargo intermediário, tem gerente e superintendente. Por exemplo, no cais tem Unidades de Fiscalização, todas elas têm chefe só que o chefe não tem no seu quadro definido como cargo de chefia. Ou seja, é chefe, dá ordens, assume responsabilidade, mas não está enquadrado como chefe. Então, isso nós temos que definir. Os cargos intermediários têm que ser definidos.
Debate Sindical – Então é novo organograma, Plano de Cargos e Salários...
Everandy Cirino – Outra coisa que nós queremos. Nós temos vários empregados com idade já de se aposentar. Mas não estão aposentando porque historicamente sempre teve PDV (Plano de Desligamento Voluntário). Então nós tínhamos que criar um Plano de Desligamento Voluntário, juntamente com a extensão da complementação à aposentadoria. Aí o pessoal que está com tempo de aposentadoria, que está querendo sair, sairia e aí sim reestruturando a empresa, preencheria os cargos através de concurso público. E daria um novo gás, um novo ânimo, uma renovação, uma nova motivação para os empregados da Autoridade Portuária dentro de uma realidade diferente.
Debate Sindical – O senhor falou na questão do concurso público. O próprio ministro Pedro Brito (titular da Secretaria Especial de Portos) falou em várias oportunidades sobre a realização do concurso como prioridade. O senhor tem alguma informação sobre isso?
Everandy Cirino – Não está se discutindo, porque nós estamos discutindo alguns pontos específicos, empurrando com a barriga os pontos principais, um deles é esse do concurso público. Você tem uma determinação da Controladoria-Geral da União para que os terceirizados não sejam 10% do pessoal vinculado, empregado. Hoje ninguém está tomando providência contra isso.
Debate Sindical – Por que?
Everandy Cirino – Porque se jogou o bode (corte da hora extra) e ninguém está discutindo isso aí. Mas não adianta fazer concurso público antes de fazer a reestruturação administrativa, fazer o preenchimento desses locais vagos com o próprio pessoal de carreira. Tem que incentivar o pessoal que estudou e se formou a ser beneficiado por aquele sacrifício que ele fez. Depois que fez essa reestruturação, um novo organograma, um PDV para o pessoal sair e com complementação (de aposentadoria), aí sim se faz o concurso público para fazer o preenchimento das vagas existentes. Aí você tem uma empresa enxuta, uma empresa sem vícios, uma empresa com novo ânimo.
Debate Sindical – Eficiente também?
Everandy Cirino – Eficiente também. Agora não adianta eu ficar brigando com a diretoria da Codesp, com o presidente ou com os diretores, se essas políticas têm que ser determinadas pela Secretaria Especial de Portos. A SEP precisa, urgentemente, criar uma política de Recursos Humanos para todas as administrações portuárias. É para não ficarmos discutindo perfumarias e de forma isolada, eu aqui em Santos, os portuários do Rio de Janeiro lá, de Vitória lá, e assim por diante, e se esquece a grande reestruturação. E aí quem tem de fazer esse programa de reestruturação é a Secretaria (de Portos), é o (Pedro) Brito, com uma política negociada de recursos humanos.
Debate Sindical – Essa reunião com a SEP está sendo solicitada?
Everandy Cirino – É, nós solicitamos para a Federação Nacional dos Portuários. Até porque esse assunto tem que ser discutido em nível nacional.
Fonte: PortoGente - 06 NOV 07