Há exatamente 50 anos, a Europa, estigmatizada por décadas de conflitos sangrentos, dava um passo decisivo para mudar a sua história. Na capital italiana, representantes de seis países – Itália, França, Alemanha, Bélgica, Holanda e Luxemburgo – assinaram o Tratado de Roma, que instituiu a Comunidade Econômica Européia (CEE), o embrião do que hoje é conhecido como União Européia (UE). Mais do que um simples acordo de negócios, a Europa lançou as bases para um inédito processo de integração, ampliado anos depois para 27 países e congregando hoje mais de 480 milhões de pessoas. O desafio agora é maior do que manter a paz entre adversários históricos. Passa por problemas como o desaparecimento de nacionalidades, imigração ilegal e a redução de desequilíbrios sociais e econômicos entre seus membros.
A gênese da União Européia tem entre suas origens as freqüentes refregas no coração do continente, em especial as protagonizadas entre França e Alemanha – desde a Guerra Franco-Prussiana (1870-73), passando pelas duas Guerras Mundiais. A idéia era evitar a guerra e, se possível, manter a paz. O contexto da Guerra Fria e a necessidade de reconstrução do Velho Mundo também pesaram na balança. França e Alemanha, então – após a criação, em 1951, da bem-sucedida Comunidade Européia do Carvão e do Aço (Ceca) –, resolveram avançar, rumo à Comunidade Européia de Defesa, em 1954. Não foi tão fácil. O Parlamento francês rejeitou a proposta. “Foi necessário esse revés para que o esboço da CEE se desenhasse. Assim, o Tratado de Roma foi proposto e assinado”, raciocina o francês Antonin Cohen, professor-assistente de ciência política da Universidade de Picardie (França) e ex-colaborador de Oxford (Inglaterra) e Princeton (EUA), em entrevista por e-mail.
O fracasso da iniciativa de defesa fez com que os países buscassem um tema menos polêmico para nortear a integração. “A recusa à Comunidade de Defesa trouxe um impacto negativo para o processo. Os pais da CEE, os diplomatas franceses Jean Monnet e Robert Schumann e o alemão Konrad Adenauer, sabiam que a integração precisava ser feita de forma objetiva”, reflete Marcelo Medeiros, coordenador do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
A assinatura do tratado criou três comunidades: reafirmou a Ceca, instituiu a CEE e também a Euratom – designada para tratar dos assuntos referentes à energia atômica. Depois, foram unidas sob o guarda-chuva da Comunidade Econômica Européia, em 1965.
ALARGAMENTOS – Para chegar ao que é hoje, a CEE passou por alargamentos – a inclusão de novos países. Desde 1973, quando Reino Unido, Dinamarca e Irlanda embarcaram, o número de Estados-membros passou para 27 – com os dois últimos passageiros, Bulgária e Romênia, conseguindo seus lugares em 1º de janeiro deste ano. Em 1992, em Maastricht (Holanda), a CEE virou União Européia e caminhou para a adoção de uma moeda única (o euro), paralelamente à pressão de mais e mais candidatos ao ingresso no bloco, como o que acontece hoje com Turquia, Macedônia e Croácia.
“O processo de unificação européia é pioneiro. A Europa é o berço dos nacionalismos. Ainda hoje existem reivindicações regionais, sejam por independência, autonomia ou identidade própria. Mas isso não é contraditório, porque isso tudo acontece dentro da Europa. O que enfraquece é o Estado-Nação e não o bloco”, explica o coordenador da Pós-Graduação em Geografia da UFPE, o francês Jan Bitoun. A variedade de identidades, línguas e países terminou sendo um fator determinante para a integração.
Fonte: Jornal do Commercio - 26 MAR 07