O número crescente de corporações que partem para a produção no exterior mostra nova fase da indústria brasileira
Os jornais de grande circulação e as revistas voltadas para negócios têm sido pródigos em noticiar o atual processo de internacionalização das empresas brasileiras. Gerdau, Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), Companhia Siderúrgica Nacional CSN) e Embraer, entre outras, já têm lugar reservado nesse noticiário. Novas e nem sempre esperadas informações surgem a cada dia, como foi o recente anúncio da Cosan, o maior grupo sucroalcooleiro do Brasil, de que deve vir a instalar plantas de produção de álcool nos Estados Unidos e de açúcar na Índia.
Essas notícias revelam não apenas as facetas positivas de uma nova fase da indústria brasileira, como também novas — e nem sempre previstas —, realidades que acabam se constituindo em grandes desafios surgidos nesse processo de internacionalização.
Por exemplo, instalar fábricas em outros países requer não só uma competência distintiva em Gestão de Operações, como também a habilidade de lidar com questões de Relações Trabalhistas e de Regulamentação Ambiental bastante diferentes das que as empresas enfrentam no Brasil.
Assim, estudar os chamados “entrantes tardios ou late-movers” constitui um assunto relativamente novo, mas de crescente importância.
Por exemplo, dados publicados com base em um estudo do Bank of America revelam o aumento no volume de investimentos originados nos chamados países em desenvolvimento para a aquisição de empresas americanas nos Estados Unidos.
No período de 1997 a 2005, Israel, México e Brasil foram os países que mais investiram (The Wall Street Journal Americas, 15/08/2005).
Várias corporações indianas e chinesas já estão listadas na Fortune 500. Um recente relatório do Boston Consulting Group (2006) analisa os “100 Novos Desafiantes Globais”, entre os quais estão incluídas 44 empresas chinesas, 21 indianas, 12 brasileiras, sete russas e seis mexicanas, sendo as dez restantes de diferentes países.
No final de 2005, havia cerca de 30 empresas brasileiras produzindo em aproximadamente 120 fábricas espalhadas ao redor do mundo. Ou seja, o fenômeno está bem caracterizado.
Sob o ponto de vista acadêmico, não existe ainda uma abordagem teórica que trate especificamente das chamadas “empresas entrantes tardias” (late-movers).
A principal razão para isso é que os diferentes modelos disponíveis na literatura tiveram as suas raízes lançadas em épocas passadas, nas quais o macroambiente global apresentava características diferentes das atuais, e tinham como objeto de análise empresas de outros países, principalmente as norte-americanas, escandinavas, japonesas e coreanas, entre outras.
As empresas brasileiras que partem para o processo de internacionalização enfrentam condições radicalmente distintas daquelas vividas pelas empresas que primeiro se internacionalizaram, os chamados “primeiros entrantes” ou “early-movers”. Entre outros, destacaríamos os seguintes fatores que explicam as diferenças:
a) hoje há um excesso de capacidade para a produção de bens e serviços, o que cria uma feroz competição entre os players globais e requer uma orientação permanente para a inovação;
b) as multinacionais tradicionais, aquelas com origem nos países desenvolvidos, estão em um processo de rever e redefinir suas arquiteturas organizacionais, enfocando atividades de alto valor agregado e procurando estabelecer e comandar redes globais de produção;
c) os governos procuram intervir fortemente no processo de internacionalização, visando atingir seus objetivos de desenvolvimento nacional;
d) a economia globalizada está em um estágio no qual mecanismos institucionais que moderam o comércio internacional estão sendo consolidados em níveis globais e regionais, afetando fortemente os países em desenvolvimento.
Além dessas questões, que são decorrentes do cenário internacional, as empresas late-movers de grandes economias emergentes enfrentam outros e importantes desafios.
Trata-se de situações relacionadas ao próprio contexto institucional de seus países, de seus mercados domésticos, que têm características distintas daquelas que prevalecem em países desenvolvidos.
Esse contexto institucional volátil e imprevisível, se ameaçador por um lado, parece qualificar os late-movers das grandes economias emergentes para buscar oportunidades e lidar com as adversidades de forma distinta da das empresas dos países desenvolvidos.
Em certo sentido, o processo de internacionalização seria uma forma de as empresas se protegerem das turbulências enfrentadas em seus países de origem.
Assim, quando buscamos um referencial teórico para a análise da internacionalização das empresas brasileiras, ficamos numa encruzilhada: não existem teorias específicas e as teorias existentes foram desenvolvidas com base em diferentes quadros de referência.
O que observamos é que a literatura sobre o processo de internacionalização das empresas das grandes economias emergentes não foi ainda devidamente estruturada.
No sentido de cobrir essa lacuna e gerar conhecimento novo para a nova realidade da indústria brasileira o NPGT-Núcleo de Política e Gestão de Tecnologia iniciou projeto temático para estudar “Gestão Empresarial para a Internacionalização da Empresas Brasileiras”.
Fonte: DCI - 16 MAR 07