Num primeiro momento, sacos vazios de cimento e embalagens de leite longa vida (ELV) descartadas parecem estar destinados apenas a lixões ou a alguma proposta de reciclagem. Mas para o zootecnista Júlio César Machado Cravo esses dois elementos, somados à resina poliuretana a base de óleo de mamona, deram origem a um forro ecológico que funcionou como um isolante térmico em galpões de aves.
“Nas medições realizadas no protótipo com forro ecológico, as temperaturas internas foram menores na primavera, no verão e no outono em comparação ao protótipo controle”, destaca o pesquisador, lembrando que não houve diferença no inverno.
Os resultados estão na pesquisa de doutorado Painéis de partículas de saco de cimento e embalagem longa vida com vistas para aplicação como forro em protótipos de aviários de frangos de corte, em desenvolvimento pelo Programa de Pós-Graduação em Zootecnia da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, em Pirassununga, com previsão de defesa até fevereiro de 2016. O trabalho conta com a orientação do professor Juliano Fiorelli, do Grupo de Construção e Ambiência, e apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Produção do forro
A pesquisa foi realizada em quatro fases. Na primeira, Machado Cravo utilizou 15 sacos de cimento recolhidos em obras de Pirassununga e São Paulo. Eles ficaram imersos em água durante 12 horas. O material foi peneirado e a polpa resultante foi colocada em uma centrífuga para a retirada de água. Depois, a polpa transformada em partículas foi para uma estufa a 60 graus Celsius (°C) até atingir 8% de umidade. A matéria-prima obtida passou por uma análise de caracterização física e química.
Na segunda fase, o pesquisador utilizou esse material para formar painéis de partículas. Machado Cravo realizou diferentes combinações entre as várias densidades encontradas (04, 05 e 0,6 gramas por centímetro cúbico [g/cm³]) e com 12% e 15% de resina poliuretana a base de óleo de mamona. A resina e a polpa originada dos sacos de cimento foram misturadas e levadas a um molde de 40 cm x 40 cm x 1 cm. Esses painéis foram colocados em uma prensa, durante 10 minutos e na temperatura de 100ºC.
Após 72 horas (período de cura), os vários painéis de partículas, com diferentes densidades e quantidades de resina, passaram por uma série de análises: propriedades físicas (absorção de água e inchamento em espessura), mecânicas (módulo de ruptura e elasticidade) e térmicas (condutividade térmica, resistência térmica e fatos solar). Esses testes indicaram que os painéis de partículas com densidade de 0,6g/c³ e 12% de resina obtiveram os melhores resultados.
Foram esses os painéis utilizados para avaliar os diferentes revestimentos na terceira etapa. O pesquisador revestiu os painéis com embalagens de leite longa vida (ELV) e comparou com verniz marítimo mediante as análises físicas, mecânicas e térmicas da etapa anterior. Diante dos resultados, o painel com revestimento ELV foi o escolhido para ser utilizado como forro no protótipo experimental construído na FZEA e que representa a quarta fase da pesquisa.
O protótipo foi construído em escala reduzida e distorcida, com medidas de 1,5m de largura, 3 m de comprimento, 0,20cm de beiral, 1,5cm de pé-direito, 0,40cm de altura da parede e 0,10cm de espessura de parede, sendo que 18 paineis foram utilizados para construir o forro . Placas de fibrocimento no telhado e paredes laterais com chapas USB complementaram o protótipo.
Resultados
Foram realizadas medições de temperatura interna durante 10 meses, abrangendo todas as estações do ano. Na primavera, houve redução de 3,88% na temperatura; no verão, 5,15%; no outono, 4,11%. Já no inverno, não houve diferença com o protótipo controle. Além da temperatura, o pesquisador também mediu entalpia (concentração de energia no ar) e o Índice Térmico Ambiental de Produtividade para Frangos de Corte (IAPfc) e os resultados foram positivos. “Após o período de dez meses, as propriedades mecânicas e físicas foram afetadas negativamente, enquanto que as propriedades térmicas mantiveram o mesmo desempenho”, destaca o zootecnista.
Para o pesquisador, os resultados mostram que o forro ecológico pode ser uma alternativa para os produtores. “Eles gastariam menos e poderiam utilizar um material alternativo de modo sustentável. Se a placa quebrar, seria possível fabricar outra”, finaliza. Agência USP de Notícias