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Determinações e recomendações aprovadas em Acórdão vieram após denúncias da Logística Brasil, que segue em busca de metodologia contra práticas que prejudicam usuários.

O Tribunal de Contas da União (TCU) fez uma série de determinações e recomendações à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) sobre indícios de abusividade na cobrança de sobre-estadia (demurrage e detention) de contêineres, no curso do processo nº. TC 005.639/2019-0. Na sessão do último dia 4 de dezembro, o Plenário da Corte de Contas exarou um Acórdão determinando que a Agência Reguladora apresente ao Tribunal, no prazo de 30 dias, um plano de ação com vistas a sanear os problemas contendo, com medidas a serem adotadas, os responsáveis pelas ações e o prazo previsto para implementação.

TCU aponta melhorias à ANTAQ no tratamento dos casos de abusividade na cobrança de sobre-estadias de contêineres.jpgFonte: Freepik

Entre os diversos problemas identificados pelo Tribunal está a recorrência dos casos de possível abusividade na cobrança de sobre-estadia de contêineres, evidenciado pelo volume expressivo de ações judiciais sobre a matéria. A denúncia foi apresentada pela Associação Brasileira dos Usuários de Transportes e da Logística (Logística Brasil), que vem apontando a omissão da Agência Reguladora na regulação sobre os indícios de abusividade.

De acordo com o TCU, falta uma base de dados sobre os eventos de sobre-estadia de contêineres, incluindo os cobrados por agentes intermediários, essencial para subsidiar a atuação regulatória da Autarquia. O Tribunal também entendeu que não há identificação, fundamentada em evidências, sobre as causas que originam cobranças de sobre-estadia de contêineres.

A Acórdão recomenda a adoção de procedimentos que assegurem ampla publicidade e transparência ao plano de ação, permitindo que os diversos interessados (usuários, armadores, intermediários, sociedade civil, especialistas, órgãos públicos etc.) tenham a oportunidade de se planejar com antecedência, para viabilizar uma maior eficácia ao processo de participação social.

A Corte de Contas apontou a necessidade de os formatos de participação social garantirem a inclusão de interessados que, por temor de represálias, poderiam se abster de contribuir nas discussões relacionadas à sobre-estadia de contêineres. O TCU orienta que a ANTAQ institua um mecanismo formal e acessível que permita a contestação de cobranças indevidas, garantindo aos usuários um processo estruturado para registro, análise e resolução de disputas com justiça e eficiência, avaliando periodicamente os resultados alcançados.

O Acórdão sugere ainda que a Autarquia avalie a possibilidade de flexibilização ou isenção das cobranças em situações de força maior, como greves ou condições climáticas extraordinárias, além de autorizar é que a Agência adote processos de mediação para a resolução de disputas, com o objetivo de reduzir o tempo e os custos a Unidade de Auditoria Especializada em Infraestrutura Portuária e Ferroviária (AudPortoFerrovia) a proceder ao monitoramento da determinação e das recomendações expedidas na deliberação.

Para o advogado Osvaldo Agripino de Castro Junior, representante da Logística Brasil no processo, a discussão avançou bastante na esfera do TCU, mas falta uma metodologia para coibir a abusividade da ANTAQ. O advogado defende que toda cobrança de demurrage ou detention seja informada à Agência. Agripino entende que a Lei de Liberdade Econômica (13.874/2019) diz que, em um mercado regulado, a precificação não é livre, precisa ter um limite estabelecido. “O TCU não está satisfeito com o modelo de regulação da Antaq. As decisões que temos recorrido não são suficientes para trazer o serviço adequado”, afirma.

Agripino viu os apontamentos do TCU como uma ‘puxada de orelha’ ao trabalho da agência reguladora. O advogado lembra que, antes de encaminhar a primeira denúncia ao Tribunal, as questões foram levadas ao conhecimento da ANTAQ e que a Análise de Impacto Regulatório (AIR) ocorreu somente após a ida da associação ao TCU. “A ANTAQ tem que inovar para si a resolução dos seus conflitos”, analisa.

O advogado rebate o argumento de que não há um número suficiente de denúncias para o estabelecimento de uma metodologia. Segundo Agripino, existe uma acumulação dos processos no Judiciário, que não possui, em regra, magistrados com capacitação adequada para entender a complexidade desses casos, o que acaba favorecendo armadores e agentes de carga. “A ANTAQ tem que fazer procedimentos que estimulem a participação do usuário nas consultas, nas denúncias e, também, que qualquer cobrança de demurrage ou detention seja informada para que a Agência saiba o que ocorre no mercado, para não fazer essa ‘regulação avestruz’", propõe o advogado.

A Logística Brasil considera que a avaliação da unidade técnica do TCU a respeito dos trabalhos da Agência nessa decisão aprimorou ainda mais o acórdão anterior de 2021, mas resta caminhar para a regulação, por meio de norma de critério de abusividade. “De zero a 10, a nota dessa decisão, resultante da nossa denúncia, é 8. Vamos correr atrás da norma de critério de abusividade para obtermos a nota máxima. Sobre-estadia é um câncer no setor, uma verdadeira bagunça que os armadores promovem, sem que nada seja feito. É preciso regular valores e avaliar as condições dessa cobrança, que não podem virar fonte de receita. Os próprios cobradores afirmam que a cobrança é uma indenização. Tanto é verdade que, no primeiro Acórdão, o TCU determinou a remessa do processo à Receita Federal para apuração de sonegação fiscal”, afirma André de Seixas, Diretor-Presidente da Logística Brasil.

Seixas critica o voto condutor no processo de regulação da Agência, contrário à criação de uma metodologia para combater abusividades, afirmando que ele favoreceu sobremaneira armadores e agentes intermediários, num ato desastroso aos usuários. “O cenário no Brasil é péssimo. Existe uma farra generalizada na importação e na exportação feita por armadores e agentes intermediários. O modelo ex post de fiscalização da ANTAQ é ruim e não cabe ao segmento de contêiner. Precisamos mudar esse cenário, com propostas, pois os usuários estão à deriva, diante da falta de acompanhamento do mercado pelo regulador, alerta.

O Diretor-Presidente da Logística Brasil observa que o enfraquecimento contínuo da fiscalização da Antaq diante da evolução do mercado vem contribuindo em grande escala com a desordem no segmento de contêineres, dando margem para que os armadores confirmem bookings de exportação sem ter equipamentos, provocando rolagem de cargas, aumentos de fretes no curso da operação de exportação contratada, além da cobrança de despesas extras (“taxas”) dos exportadores, quando estes não deram causa aos problemas.

A lista de problemas inclui embarques frustrados por fechamento de gates, sem prévio aviso, obrigando exportadores a gastarem centenas de milhões de reais por ano em pre-stakings — quando o contêiner não entra no porto dentro da programação feita pelo armador, e o exportador, pego de surpresa, precisa encontrar um local para armazená-lo fora do porto, até que sua entrada seja autorizada. Nesses casos, além de pagar mais despesas não previstas, o usuário é cobrado pela sobre-estadia, “taxa” de rolagem, dentre outras.

“Precisamos encontrar mecanismos com o uso da tecnologia que permitam a fiscalização ostensiva sobre as externalidades negativas e condutas oportunistas praticadas por armadores, pois é um show de serviço inadequado que acontece e a fiscalização da Antaq não consegue enxergar. Não se pode atuar apenas sobre as denúncias. É preciso se antecipar aos fatos, pois os usuários, com medo de retaliação, devido à elevada concentração de mercado, com poucas opções de armadores e rotas, acabam não denunciando, como muito bem apontou o TCU”, lamenta.

Seixas discorda que este descontrole no sistema portuário, causado pelos armadores, esteja acontecendo por desconhecimento da capacidade dos portos. Ele alega que um mega transportador marítimo conhece muito bem a capacidade do terminal em que coloca seu navio para operar. O Diretor-Presidente da Logística Brasil cita números mensalmente divulgados pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (CECAFÉ) que demonstram o caos que está o setor.

“Basta avaliar os boletins do CECAFÉ e verificar quantas sacas de café deixam de ser exportadas. Agora, vamos expandir esses números para outros segmentos do próprio agronegócio e de outros perfis de cargas”, destaca. Seixas acrescenta que, quando uma carga de exportação não é embarcada, o exportador não recebe por ela e isso é péssimo para o plano de negócios das empresas, revertendo-se em enormes prejuízos. “Claramente, os armadores estão vendendo frete sem ter espaço nos navios, sem certeza de embarque e sem ter contêineres disponíveis. Pior, ainda cobrando sobre-estadias e outras “taxas”, aumentando fretes, ou seja, obtendo receitas sobre um caos que eles mesmos criam.

Clique aqui e leia o acórdão

10 Anos da Logística Brasil

O Diretor-Presidente da Logística Brasil avalia que a decisão dos Ministros do TCU consolida a maturidade da associação na defesa dos usuários do setor portuário nacional. Segundo Seixas, essa decisão marca a Logística Brasil como uma das principais entidades representante dos usuários do país, para os quais contribuiu para economizar bilhões de reais, e que vem ajudando na regulação de armadores e dos portos brasileiros nos últimos 10 anos.

Seixas considera que, pelas suas ações, a Logística Brasil é comprovadamente uma defensora das Agências Reguladoras e de seus servidores, pois sabe o quanto elas são importantes para a sociedade, em diversos setores e aspectos. Ele frisa que a associação defende a boa regulação, mas que, definitivamente, a Antaq, está totalmente descolada do dia a dia e das necessidades do mercado nesses temas.

 

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Dr. Osvaldo Agripino, advogado (UERJ, 1992), sócio do Agripino & Ferreira www.agripinoeferreira.com.br
Pós-Doutor em Regulação da infraestrutura, Harvard University, Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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