A tenente Talita Reis Antunes Pereira foi a única militar mulher a embarcar na Unitas 47-05. Servindo a Marinha do Brasil desde o ano passado, a meteorologista formada em 2003 pela UFRJ, foi responsável pela previsão do tempo durante toda a comissão.
Todos os dias, especialmente no final da tarde, atualizava as informações enviadas pelo Centro de Hidrografia da Marinha e fornecia as condições meteorológicas para os sucessivos dias.
O seu trabalho é importantíssimo para quem vive no mar. Saber com antecedência os movimentos atmosféricos, como variações de temperatura, ventos e umidade é fundamental para a tomada de decisões.
Foi a primeira viagem dela na Marinha. Os dias que antecederam o seu embarque foram árduos, de muito trabalho. Relatórios, apresentações em inglês, eventos. O processo foi enriquecedor, pois teve a oportunidade de adquirir conhecimento em outras áreas como administração, navegação e relações públicas. Aliás, ainda acumulou a função de acompanhar os civis embarcados. E foi muito prestativa e eficiente.
“É uma experiência única, boa para o meu crescimento dentro da Marinha. Está sendo bacana acompanhar os repórteres”, conta. Mesmo sendo a única militar embarcada, prevaleceu o respeito e o coleguismo entre os militares.
Também pudera. A tenente Talita é uma pessoa muito agradável de conversar. Quem teve a oportunidade de conviver com ela pôde comprovar: é a alegria em pessoa! O seu sorriso e a sua risada são inconfundíveis. Mau humor, nem pensar.
Lembra com muito carinho da ocasião em que foi transferida para a 2ª Divisão de Esquadra. “Foi a primeira vez que sai de onde eu trabalhava onde conhecia todo mundo para ir a um lugar que não conhecia ninguém. Fui muito bem acolhida”, recorda.
De lá, só tem lembranças felizes. “Quando fui promovida a 2º tenente, o almirante me falou palavras tão bonitas que vou guardar para sempre”.
Hoje está realizada na Marinha, mas o primeiro contato com a vida militar não foi fácil. Ela explica que durante os 45 dias de treinamento na Escola de Oficiais a rotina era exaustiva. “Meu primeiro dia foi um choque. O aluno que vem sendo formado desde o colégio não estranha o dia a dia. Mas, nós, que somos universitários, precisamos de um período maior para entrar no ritmo”.
Foi obrigada a acordar bem mais cedo. Antes mesmo das 6h da manhã já estava de pé. No primeiro dia de aula já aprendeu a marchar, ficar em formatura e cantar o hino. Os instrutores eram exigentes com a forma e o compasso da marcha. Ah, se alguém reclamasse...
A rotina era pesada. Nos quatro primeiros dias entrava antes das 7h e seguia até às 22h. “Nas primeiras semanas eu estava morta. Chegava exausta em casa na sexta-feira. Não queria nem jantar, só dormir”.
Passado algum tempo a adaptação foi natural e, lentamente, foi se acostumando a rotina militar. O tratamento sempre foi igual entre homens e mulheres, apenas alguns exercícios físicos eram diferenciados. Além de marchar, ter aulas sobre a vida, carreira e estatuto militar ainda tinha que praticar corrida e natação.
O treino é desgastante, mas a repetição leva à perfeição.Tudo é avaliado, até como a pessoa reage diante de uma ordem, mesmo estando exausta.
Aulas de continência, claro, faziam parte do treinamento. A tenente explica que a continência é o comprimento militar e deve ser batida quando o militar está fardado e encontra uma autoridade pela primeira vez. A continência deve partir sempre do mais novo.
Há histórias divertidas. Certa vez, conta ela, um rapaz visitava um navio quando a sua calça rasgou. Sem saber costurar, se dirigiu ao camarote do comandante enquanto uma das mulheres costurava sua calça. Para o seu azar, quem entra no camarote? O comandante. Imagine a cena. Será que ele deveria bater continência? Na dúvida, ele levantou-se, fez continência e ainda pediu desculpas ao comandante.
A mudança de estilo de vida fez com que Talita enxergasse a Marinha com outros olhos. “Mudei muitas coisas que eu pensava sobre as forças armadas em geral, depois que entrei para a Marinha. Comecei a concordar com o ponto de vista de algumas militares. Os meus valores mudaram.” Hoje sente que tem mais controle na hora de dar um passo. “Hoje sou uma militar e tenho ainda mais responsabilidade”.