Sexta, 29 Novembro 2024

Luciano Nakabashi é professor associado do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (Campus de Ribeirão Preto). Nessa entrevista ao Portogente fala sobre o desafio do Brasil de qualificar seu mercado exportador, investindo na indústria de transformação que agregue valor aos produtos e supere a supremacia das commodities e traga uma maior valorização da força de trabalho e um incremento no Produto Interno Bruto (PIB).

Luciano entrevista

O professor fez seu doutorado em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais, mestrado em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná e graduou-se pela Universidade Estadual de Campinas. Suas reflexões espelham os trabalhos que tem realizado em suas pesquisas acadêmicas, voltadas para a área de economia, com ênfase em crescimento e desenvolvimento econômico, conjuntura econômica e economia regional, abordando temas como capital humano e crescimento econômico e instituições, impactos da mudança estrutural sobre o crescimento, pobreza e desenvolvimento econômico.

Portogente – O senhor tem falado que um dos principais fatores para o Brasil crescer no ranking internacional de exportação é a relação entre commodities e taxa de câmbio. Ao mesmo tempo sugere que o Brasil, para incrementar sua exportação, deve investir na indústria de transformação, pois esta agrega valor aos commodities e impacta positivamente na balança comercial. Poderia nos falar mais a respeito?
Nakabashi – Hoje o País é muito dependente das commodities, representando mais da metade das exportações, como soja, açúcar, milho, carne, que tem um peso relevante. Nos anos 1980 não era assim, mas mudou a partir de 1990, 2000 e atualmente majoritariamente exportamos commodities. O câmbio deu uma auxiliada nos anos 2017/2018, assim como teve momentos em que deu uma depreciada, pois aumentou a receita em reais, pois nem todos os custos são em dólar. Essa importância é a geração de valor agregado: as commodities tem uma variação muito mais alta de preços quando a gente compara com produtos industriais, por que é um mercado onde oferta e demanda mundial determina o preço. Por essas condições a oferta acaba variando pelas condições climáticas, atividade do preço no ano anterior e isso geral uma instabilidade maior nos preços quando você compara com produtos industrializados. Estes tem uma diferenciação e muitas vezes a concorrência não é tão grande em termos globais quanto as commodities. Geralmente tem mais especialização em alguns tipos de produtos industrializados, reduzindo um pouco o tamanho da concorrência, variação de produtos, preços e quantidades. Diversificar é bom, produzir mais produtos industrializados é melhor, pois reduz essa instabilidade que é proveniente da variabilidade do preço dos commodities. Como por exemplo, uma indústria que poderia ser relacionada à agropecuária de modo geral, ao invés de mandar os produtos brutos, agregar mais valor aqui no país, gerando oportunidades de emprego (inclusive que exigem maior qualificação para agregar valor aos produtos, incluindo a equipe gerencial nessas empresas e industrias) e aumento do PIB da economia brasileira. Isso pode ser benéfico para o País.


Portogente - A respeito dos blocos econômicos com quem o Brasil tem priorizado o seu comércio exterior, como BRICs e Mercosul, qual sua avaliação sobre a tendência de permanecer ou não dentro das relações diplomáticas que vem sendo estabelecidas nesse novo momento do país e, em que medida, isso pode interferir no comércio exterior?
Nakabashi – Em relação aos parceiros comerciais, estão muito relacionados ao que a gente produz. Claro que tem a diplomacia, mas essa é uma questão secundária. Se a gente for analisar, hoje a China é a maior compradora de produtos brasileiros por que é uma grande compradora de commodities. Se a gente pegar os países do Mercosul, são importantes parceiros comerciais pela proximidade que tem com om Brasil e pelo menor custo de transporte. O Brasil é um dos grandes produtores da América Latina, pela especialização da produção que existe e por serem esses países mais próximos com menores custos. Esses fatores são econômicos e estão relacionados ao que produzimos. Outros parceiros importantes são os Estados Unidos, que tem um grande mercado, assim como a Europa, e a tendência é manter esses mercados, pois existem relações comerciais há muito tempo. A China tende a se manter como um parceiro importante, pois hoje é a segunda maior economia do mundo e uma das que mais cresce. Há uma tendência em se manter a importância desses países com quem a gente já comercializa, mas temos potencial com o Oriente Médio e com os países da América do Sul, sobretudo exportando para esses últimos bens industrializados.

Portogente – Na sua opinião qual é o papel do comércio exterior para a saúde econômica de um país e principalmente no que diz respeito não só ao crescimento, mas ao desenvolvimento que inclui também distribuição de renda e sustentabilidade?
Nakabashi – As exportações são importantes por que são parte da produção e a gente consegue ter acesso a mercados e com isso produzir mais do que a nossa demanda interna. Então exportações e importações tem muito essa questão da especialização, o que é fundamental para a produtividade dos países. Outra questão é que traz divisas, já que o Brasil é um país deficitário na conta corrente externa, onde tendemos a pagar muitos juros e remessa de lucros. Então a gente precisa de divisas para pagar por esse dinheiro que sai pela conta de serviços. Nesse sentido é importante ter um superávit na balança comercial para deixar essa parte externa mais estável. Mas quando a gente pensa numa questão social, pois se por um lado a melhoria das exportações cria mais emprego e geração de renda, é uma questão de política interna. Se queremos um país crescendo com justiça social, devem ser tomadas medidas internas independentemente se está exportando ou não, como escolaridade para as crianças, condições de saúde, de acompanhamento das crianças na primeira infância como tem mostrado a ciência. Essas questões são mais relevantes para pensar as questões sociais e desigualdade de renda no Brasil.

Portogente - E sobre as normas internacionais de exportação, poderia nos falar sobre a questão da sustentabilidade e de mercados verdes e se os processos de produção, transformação e distribuição tem impacto no comércio internacional?
Nakabashi – As questões ambientais vem ganhando importância há algumas décadas e se a gente quiser manter certos mercados – como a Europa e o Japão - a gente vai ter que adequar às questões de sustentabilidade ambiental e também socioeconômica. Entra nessa avaliação qual tipo de mão-de-obra que se utiliza, pois várias empresas já tiveram problemas em relação a isso, quando países deixaram de importar por questões sociais e ambientais. São elementos paras os quais precisamos prestar cada vez mais atenção pois que tendem a ganhar importância e limitar mercados dos produtos brasileiros, tanto de commodities como industrializados, além de ser uma questão de sustentabilidade para as próximas gerações. Não se trata só de uma questão econômica, mas de pensar que no futuro se possa viver de uma forma harmônica.

Portogente - Que impacto teria na nossa balança comercial uma indústria de transformação com um manejo ecologicamente correto, um processamento ligado aos interesses de consumidores conscientes?
Nakabashi – Por um lado, essas questões ambientais tendem a aumentar os custos, são maiores exigências na produção desses bens e serviços exportados. Por outro, criam produtos diferenciados, que podem criar um nicho de mercado, que se a gente aproveitar bem e se adequar às demandas, principalmente nos países da Europa, e manter uma rastreabilidade desses produtos em toda a cadeia de produção, mostrando que cumprem as exigências, seja de orgânico, seja de não utilização de mão de obra infantil ou outras. Se a gente tiver essa capacitação e fortalecer ela ao longo do tempo, criaremos um diferencial do nosso produto, onde existe uma tendência de se fortalecer esse tipo de mercado. Os países europeus têm mais consciência nesse sentido, muitas vezes até utilizada como barreira comercial, mas temos capacidade de transpor isso, de fortalecer essa parte que aumenta custo, mas gera um valor no que você produz e eles estão dispostos a pagar por isso. Essa maior consciência social e ecológica do que está sendo produzido e como está sendo tende a passar para outros mercados consumidores internacionais.

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