De acordo com levantamento anual, feito há 25 anos pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o serviço de transporte público coletivo urbano continua em declínio no País. Dados do Anuário 2017-2018 revelam que, no ano passado, a redução média de demanda foi de 9,5% (a terceira maior desde o início da série histórica), equivalente à perda diária de 3,6 milhões de passageiros em todo País, em comparação a 2016.
Segundo o estudo da NTU, o transporte público por ônibus perdeu 35,6% dos passageiros pagantes em pouco mais de 20 anos. Isso ajuda a explicar, por exemplo, o aumento das tarifas, já que agora há menos usuários rateando os custos da operação, já que a oferta do serviço não é reduzida na mesma proporção da queda do número de usuários.
Outro agravante da situação é a sobrecarga das gratuidades concedidas a estudantes, idosos e outros passageiros definidos em lei, que em um ano passou de 17% para 20,9%. Isso significa que um em cada cinco passageiros viaja de graça atualmente; como esse custo também é rateado entre os usuários pagantes, o maior o peso das gratuidades também encarece o valor das tarifas.
A diminuição da demanda foi agravada especialmente nos últimos cinco anos (a partir de 2014), culminando em uma perda média acumulada de 25,9% dos usuários pagantes. O estudo é feito com base em nove capitais analisadas na série histórica - Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo - e compara o desempenho do setor levando em consideração os meses de abril e outubro de cada ano.
A redução expressiva de usuários do serviço agrava o desempenho do setor, que só acredita na retomada do crescimento e níveis de produtividade mais seguros mediante a adoção de um conjunto de ações focadas em três eixos fundamentais: melhoria da qualidade dos serviços ofertados; transparência do setor para a sociedade e preços acessíveis aos passageiros.
"Infelizmente, o número de demanda vai continuar caindo enquanto não houver políticas públicas de prioridade ao ônibus nas vias e enquanto o passageiro for o único a arcar com os custos da tarifa", afirma Otávio Cunha, presidente executivo da NTU. Ele também atribui o agravamento da situação ao impacto negativo do cenário econômico do país, que favorece o aumento do desemprego e restringe até os deslocamentos para quem busca trabalho.
Tarifas e gratuidades
Segundo a NTU, o modelo tarifário brasileiro, centrado unicamente no passageiro pagante, limita o crescimento do setor e contribui diretamente para afastar o passageiro do ônibus. Atualmente, o custo de transporte das gratuidades é repassado diretamente aos demais usuários que pagam a tarifa integralmente. Ou seja, além do valor unitário do transporte, o cálculo da tarifa inclui ainda o custo das gratuidades. “O financiamento das gratuidades por fontes exclusivas de custeio, além de reduzir imediatamente o valor das tarifas, garante justiça social aos usuários do transporte público”, esclarece Otávio Cunha.
Óleo diesel
De acordo com o levantamento, indicadores como passageiros equivalentes ou pagantes, quilometragem produzida, mão de obra, índice de frota e outros têm reflexo direto no desempenho do setor. O preço do litro do óleo diesel chama atenção porque dados do monitoramento realizado pela NTU (2018), com base em informações publicadas pelo IBGE, apontam que a variação acumulada do diesel foi 11,2% superior ao Índice Nacional de Preços Amplo ao Consumidor-IPCA em 2017. Ainda de acordo com o acompanhamento da Associação, nos últimos 19 anos o aumento do óleo diesel foi 254,1% superior ao IPCA e 171,5% superior ao valor da gasolina no mesmo período.
O impacto do combustível está entre os principais itens de custo do sistema, menor apenas que o custo da mão de obra. Segundo simulação realizada pela NTU (2017), somente o óleo diesel representa 22% do custo total do sistema, em média. Considerando a variação acumulada do óleo diesel ao longo do ano de 2017, que foi de 8,4%, isso representa um impacto direto de 1,9% nos custos e, consequentemente, nas tarifas.
Simulação realizada pela NTU (2017), a partir do novo método de cálculo dos custos (ANTP, 2017), demonstrou que cerca de 50% do custo total é resultante do pagamento de salários e encargos para toda a folha de pessoal.
Frota
A frota, outro indicador que impacta no comportamento do setor de ônibus, foi reduzida novamente nas cidades avaliadas. Houve encolhimento de 6,7% no ano de 2017 em relação a 2016, de acordo com os índices médios alcançados nos dois meses analisados. Desde o início do monitoramento do índice, em abril de 2013, houve uma redução de 10,9% da frota de ônibus total dos nove sistemas de transporte considerados.
Da mesma forma, o ano de 2017 foi novamente marcado pelo aumento da idade média da frota, o sexto ano consecutivo, conforme a série histórica. Em 2017, a idade média aumentou 9,6%. E passou a ser de cinco anos e seis meses nas nove capitais analisadas, considerando o valor médio dos meses de abril e outubro do último ano.
Projetos de mobilidade urbana
O congelamento dos projetos de mobilidade urbana, particularmente os empreendimentos de priorização do transporte público por ônibus (Sistemas BRT, corredores e faixas exclusivas), é mais um fator que contribui diretamente para a redução do desempenho do setor. Acompanhamento realizado pela Associação desde 2009 revela que após um período marcado pela construção e início de operação de uma quantidade significativa de empreendimentos, entre 2012 e 2016, somente 12 projetos de priorização do transporte público por ônibus foram inaugurados em 2017 e 2018.
Segundo o acompanhamento da NTU, existe atualmente um total de 685 empreendimentos de mobilidade ativos. Desse total, 283 estão em operação, 121 ainda não finalizaram as obras e 281 encontram-se no nível de projeto. Esse universo de empreendimentos compreende toda infraestrutura de mobilidade urbana anunciada ou concluída, independente do modo de transporte a ser beneficiado e do ano de surgimento.