Amadeu Roberto Garrido de Paula é advogado e membro da Academia Latino-Americana de Ciências Humanas
Lamentavelmente, nosso povo, conquistada a democracia formal, não resgatou suas liberdades públicas e direitos substanciais.
Os monopólios estão aí. Rasgam a Constituição e nos oprimem.
Posto isto, falemos do monopólio dos serviços de telecomunicações. Esses serviços fazem - ou não - funcionar nossos telefones físicos e celulares, aparelhos de televisão e computadores. Em geral, a despeito do bom Código de Defesa do Consumidor que temos, ignoramos nossos direitos em relação a essas ilícitas concentrações econômicas. E, quando nos dispomos a exercê-los, temos de esperar anos por decisões judiciais.
As empresas são concessionárias de serviços públicos. A relação é contratual. As principais são controladas do exterior, destacadamente do México e da Espanha. Não puseram um tostão furado em seu empreendimento. Receberam de mãos beijadas, como de pai para filho, os equipamentos necessários à transmissão, da administração pública do Brasil. É dizer, não gastaram com torres, fiações, geradores e até mesmo com prédios e automóveis, que lhes foram disponibilizados.
Se tais equipamentos ficaram fatigados, foi em razão de seu uso e dos lucros dele consequentes. Bens do povo brasileiro têm de ser restituídos na íntegra. Os romanos falavam em restitutio in integrum. O que não é mais matéria sólida e boa converte-se em dinheiro. Nosso Código Civil fala em frutos econômicos dos bens, que devem ser indenizados a seu proprietário.
Não somos de esquerda, mas tampouco marionetes. Vencidos os contratos de concessão no segundo semestre de 2015, todos os bens disponibilizados às empresas deveriam ser restituídos. O prazo foi adiado para 2016 e 2017.
Neste ano, um plano maquiavélico e tosco foi abortado pela coragem de alguns senadores e pela independência do Supremo Tribunal Federal (STF). Um PLC (Projeto de Lei da Câmara 79/2016) foi urdido numa comissão e remetido ao Senado. Sem passar pelo Plenário. Matéria sem nenhuma importância. Senadores e o Planalto prepararam a festança para a véspera do Natal. Salgadinhos e doces estragaram e os garçons foram para casa. A suspensão foi determinada na undécima hora, por liminar concedida pelo saudoso Teori Zavazcki.
Ocorre que o perigo permanece. O mandado de segurança junto ao STF tratou apenas de questões formais do processo legislativo. Superadas essas, o crime será perpetrado, em que pesem advertência do atual relator, Ministro Luís Roberto Barroso.
O Tribunal de Contas da União (TCU) estima que o prejuízo ao erário público, considerados todos os bens, será de R$ 110 bilhões, fora atualização e multas.
Pretende-se reduzir o valor para R$ 17 bilhões e descontar a fadiga do material, mas sem considerar os lucros incontáveis que advieram de seu uso. Em suma: falam as empresas, com o curioso apoio da agência reguladora (Agência Nacional de Telecomunicações, Anatel), em torno de 15% do que diz o TCU. Seria demais informar qual o montante dos lucros das poucas empresas monopolistas nesses anos, também em bilhões?
E o circo de marionetes segue em frente; tem sessões todos os dias.