Rafael Antunes Padilha é mestrando pelo Programa de Pós-Graduação Multidisciplinar em Culturas e Identidades Brasileiras pelo Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo
Em 1920, John Maynard Keynes publica uma das suas obras mais importantes, “As Consequências Econômicas da Paz” , livro que tratava da sua experiência como membro da Conferência de Paz de Paris no ano anterior. A grande preocupação de Keynes àquela altura eram as consequências desastrosas que a humilhação e os pesadas indenizações que o povo alemão deveria pagar.
A imposição destes pesados encargos, como previu o brilhante economista inglês, promoveriam a degradação e servidão de toda uma geração de jovens alemães. Keynes também previu a terrível hiperinflação, cujas consequências eram vistas na Alemanha do entre-guerras, onde milhões de marcos não compravam um pão sequer. Keynes tornou-se um profeta da ascensão do nazismo na Alemanha da década de 1930.
Do norte do continente europeu, ao sul, outro importantíssimo pensador do século XX, Umberto Eco, também teve algo a dizer sobre a humilhação. Presenciou as consequências, quando criança, das crises financeiras e a que caminho elas podem nos levar. Em seu famoso artigo de 1995, “O Fascismo Eterno”, Eco volta à sua infância na Itália dos tempos de Mussolini e estabelece quatorze características que garantem a sobrevivência do pensamento fascista nos dias atuais.
Não é de surpreender, que entre os mais diversos traços, desde o anti-intelectualismo até o tradicionalismo e nacionalismo, apareçam entre os seus argumentos a questão econômica e a humilhação, em seu sexto ponto sobre o tema, o escritor e filósofo revela:
“6. O Ur-Fascismo provém da frustração individual ou social. O que explica por que uma das características dos fascismos históricos tem sido o apelo às classes médias frustradas, desvalorizadas por alguma crise econômica ou humilhação política, assustadas pela pressão dos grupos sociais subalternos. Em nosso tempo, em que os velhos “proletários” estão se transformando em pequena burguesia (e o lumpesinato se auto exclui da cena política), o fascismo encontrará nessa nova maioria seu auditório. “ 1
A dívida individual, a submissão à subempregos, retrocesso em direitos sociais universais e a castração da inovação nos setores mais importantes da nossa economia, como os pequenos negócios e a educação não nos levarão à salvação do fosso financeiro em que nos enfiamos. Com a sua política econômica e as nomeações feitas neste governo, Michel Temer, o aposentado precoce, pavimenta com tijolos dourados a estrada para o autoritarismo e o caos social.
Nosso povo apresenta-se desorientado, revoltado, imobilizado pela falta de representação, pela incapacidade de interpretar e propor soluções que fujam às mãos do Estado. O sentimento de humilhação nunca foi uma novidade para nós, porém a inovação agora é vender gato por lebre: forma-se uma ideia de que os cortes são necessários, que o Estado não pode ajudar à todos e os aposentados drenam recursos, para que famintos e despedaçados, alimentemos uns tanto quantos indivíduos que nada produzem.
Não podemos investir as nossas energias na venérea ideia da desregulamentação do Estado, como também não podemos depender do mesmo para cuidar de todos os aspectos da nossa vida econômica. É preciso elaborar um projeto nacional, ao mesmo tempo empoderar o cidadão comum e o pequeno empresário. Canalizando os fluxos de recursos novamente para aqueles que produzem com eles, teremos a recuperação do sentimento de dignidade.