Segunda, 25 Novembro 2024

Bussinger 07NOV2016

“Just do it!”
[Lema de conhecida marca esportiva]

A Medida Provisória que criou o “Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República” – PPI (MP-727, de 12/MAI/2016) foi convertida em lei (Lei nº 13.334; de 13/SET/2016). Portanto, há agora marcos claros para se enfrentar a fragilidade institucional (para lidar com o processo), pouca disputa (pelos grandes projetos) e dificuldade de garantir-se segurança jurídica (em especial na fase de execução); essas as 3 principais causas apontadas para os insucessos e dificuldades dos programas de concessões e parcerias anteriores (PIL e PAC). Em particular, para sanar as falhas de governo na definição de políticas e planos de longo prazo, e falta de previsibilidade dos processos (procedimento de liberação caótico); dois principais sintomas da diagnosticada fragilidade institucional.

O conselho do PPI (um conselho ministerial, presidido pelo Presidente da República) já iniciou suas atividades (na mesma data da Lei) e emitiu duas primeiras resoluções: a primeira “estabelece diretrizes gerais e estratégicas a serem adotadas pelos órgãos e entidades da administração pública federal no processo de contratação de empreendimentos do PPI”; e a segunda define as 15 infraestruturas de transportes que comporão o 1º conjunto de processos a serem postos em marcha para serem licitados ao longo de 2017: 5 rodovias; 4 aeroportos; 3 terminais portuários; 3 ferrovias.

Do que se depreende da Resolução nº 1, tais processos devem ter 4 pilares: centralização, coordenação (intra-governamental; intra-institucional), padronização e previsibilidade. Aliás, dando curso à lógica e à estratégia da MP e da Lei:

Visando concentrar esforços (objetivo enunciado nos considerandos), determina que todos os órgãos devem dar prioridade a tais processos (art. 18) e que cada um deles tenha um gestor (art. 4º). Consagra, formalmente, a participação do TCU no processo decisório (art. 14, § 2º e art. 16). Prevê instrumentos para viabilização de transparência (art. 5º), em particular consultas e audiências públicas (art. 15); Licença Prévia-LP condicionando a licitação (art. 6º); explicitação de Matriz de Riscos (art. 7º) e de regras de governança (art. 10); exigência de mecanismos que desestimulem o cumprimento de compromissos contratuais (art. 12). Adoção de “práticas regulatórias modernas” (art. 8º) e instrumentos visando ao fortalecimento das agências (art. 13).

A implementação de tais expedientes certamente resultará em maior credibilidade do Programa!

Finalisticamente, importante ter sido explicitado nos considerandos, como objetivos do PPI: i) a competitividade (seja nos processos de contratação das concessões e parcerias, seja na prestação de serviços, propriamente dita); ii) e, nesta, também a qualidade e eficiência (como norte, em si, ou como um dos resultados da competitividade). Ou seja; atração e comprometimento de investimentos, mantra de discursos, eventos, cobertura da imprensa, artigos assinados, etc. é (ou passa a ser!?!), apenas, um dos objetivos do Programa. E, bem assim, instrumental; um meio.

Também, finalisticamente, as normas apontam no sentido da incorporação das chamas receitas acessórias à estruturação financeira dos projetos/empreendimentos (ao recomendar, “sempre que possível”, considerar a implantação de fibra ótica junto com as diversas infraestruturas) (art. 9º).

Mas talvez a maior inovação esteja nas especificações dos EVTEAs (art. 14). Chamam atenção: i) a exigência do “suficientemente consistentes e robustos”; ii) e, isso, como pré-condição para que o processo da concessão ou PPP seja submetido à apreciação do Conselho; iii) a exigência de que as premissas adotadas para os EVTEAs sejam “claras, objetivas e suficientemente adequadas para garantir a robustez e a consistência dos modelos”; iv) a flexibilidade para tratamentos “à la carte”; ou seja, para se contemplar “a complexidade e as particularidades de cada projeto”.

Quem já lidou com EVTEAs, seja produzindo, seja avaliando, sabe que, ao contrário do que muitos imaginam, eles não são Oráculos de Delfos. Ao contrário, são aplicativos, são “máquinas processadoras” de premissas assumidas; de dados e informações selecionadas.

Um exemplo prático são os estudos de demanda: uma coisa é constatar-se ou estimar-se que um dado hinterland, bacia ou região tem necessidade de movimentar “X” milhões de toneladas anualmente (demanda potencial). Algo muito diferente é estimar-se/estabelecer-se o percentual dela que utilizar-se-á de um determinado porto, ferrovia, rodovia ou arranjo logística (demanda efetiva): não são raros os casos de se verificar somatórias de demandas efetivas previstas, de EVTEAs de projetos contíguos/interfaceados, que superam a demanda potencial da área considerada (há casos de dobro, 3X ou mais!).

A dificuldade está, em muitos casos, da constatação de que essa premissa pode depender, justamente, do resultado do estudo (do seu output!): preços e condições operacionais; p.ex... criando um sistema interdependente de análises e, assim, aumentando sua complexidade.

Daí a importância de que as premissas sejam plausíveis; tenham alta probabilidade de se tornarem realidade; como indicam as recentes normas do PPI.

O Brasil tem uma centena de portos e TUPs relevantes. Várias centenas, se considerados todos eles. Distintos em dimensão, tipos de cargas movimentadas, destinação, conexão com outros modos; além das diferenças culturais, sociais e políticas; da empresa e da região. A padronização tem suas virtudes mas, também, inúmeros efeitos colaterais:

Difícil compreender-se, p.ex: i) o porquê imaginar-se que todos interessados em infraestruturas em portos organizados tenham a intenção de se tornarem arrendatários (o instituto previsto na Lei dos Portos): há inúmeras operações temporárias para atendimentos de exportações específicas ou de grandes montagens (plataformas marítimas; dutovias submarinas; implantação de hidrelétricas – como na Amazônia; equipamentos fora-do-padrão; etc). ii) tratamentos similares para portos de pequenas áreas (como o de Vitória ou Itajaí) como outros dispondo de áreas dezenas ou centenas de vezes maiores (como Sepetiba, Suape e Pecém); iii) de igual forma, portos de escassas áreas para expansão (como o de Santos) e os com grande extensão de áreas disponíveis (como de Vila do Conde): quantas oportunidades têm sido desperdiçadas por causa dos centralizados, longos, complexos e imprevisíveis processos decisórios?

Inicialmente, o Decreto nº 6.620/98 introduziu impedâncias tais no processo decisório que, ainda que não tenha sido seu objetivo, acabou por provocar travamentos, engessamentos no processo decisório. A Lei dos Portos vigente aprofundou e cristalizou as dificuldades. A flexibilização que as normas do PPI propugnam, reconhecendo complexidades e particularidades, como as exemplificadas, é um alento para o futuro do desenvolvimento portuário. Certamente também para projetos ferroviários, rodoviários e hidroviários.

Basta implementar! “Just do it!”.

Consultor. Foi presidente da Companhia Docas de São Sebastião (CDSS), SPTrans, CPTM e Confea. Diretor da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), do Departamento Hidroviário de SP e do Metrô de SP. Presidiu também o Conselho de Administração da CET/SP, SPTrans, Codesa (Porto de Vitória), RFFSA, CNTU e Comitê de Estadualizações da CBTU. Coordenador do GT de Transportes da Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC-SP). Membro da Comissão Diretora do Programa Nacional de Desestatização e do Conselho Fiscal da Eletrobrás.

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