Segunda, 29 Abril 2024

“Uma imagem vale mais que mil palavras”
[Confúcio]

Dentro de algumas semanas, quando forem concluídos os respectivos laudos técnicos, será possível saber as causas (normalmente nunca é uma, isoladamente!) da queda (02, 03, 04) de um trecho de cerca de 50m da recém-inaugurada (17/JAN/2016) “Ciclovia Tim Maia” no Rio de Janeiro (a Cidade-Olímpica): 3,9 km de extensão, ligando o Leblon a São Conrado. E, além disso, se teria sido possível evitar aquelas mortes, mesmo ante a consumação da tragédia.

Incidental e ironicamente ela ocorreu no dia em que foi acesa a tocha (02) na Grécia; da morte de Tiradentes (líder e mártir da independência brasileira) e aniversário da inauguração de Brasília (02) (orgulho da engenharia nacional)!

Inicialmente, como recomendam as normas e protocolos, não se pode descartar nenhuma hipótese: concepção; projeto; materiais; execução; fiscalização, operação, etc. Todavia, ante as primeiras evidências, especialistas do CREA-RJ, Clube de Engenharia, UFRJ e COPPE, dentre outros, não se furtaram a indicar a causa mais provável: o projeto (01, 02, 03, 04).

Também, pela apuração da imprensa, já vai sendo aclarado que inexistiam planos de contingências. E que, tanto a natureza (ressaca prevista) como a própria obra, em si (trincas), haviam dado seus alertas a tempo. Neste caso, intrigantemente (vale uma reflexão, em si!), por uma instituição não integrante do mundo da engenharia: o TCM do RJ, em relatório 9 meses antes (JUL/2015)!

Além disso, mesmo sem invocar exemplos estrangeiros (como a “Atlantic Ocean Road”, em condições tão ou mais severas, no Mar do Norte), e como uma Espada de Dâmocles ou a impávida Esfinge, a foto frontal da tragédia, que percorreu o mundo (inevitável, pois associada aos Jogos Olímpicos que a cidade sediará dentro de poucos meses), maculando a reputação/imagem da engenharia brasileira, é um misto de roteiro de investigação e de acusação: por que a ciclovia, recém inaugurada, não resistiu; enquanto que o velho viaduto sobre a “Gruta da Imprensa” lá permanece enfrentando as ressacas dos últimos 100 anos? (Como registrou o Presidente do, também centenário, Clube de Engenharia do RJ, Pedro Celestino Pereira Filho).

Infelizmente esse não é caso isolado!

É verdade que o País tem importantes núcleos de excelência em engenharia. Aliás, são eles os responsáveis pelo fato do Brasil integrar um seleto grupo de 15 países que, regularmente, exportam serviços de engenharia (projetos, obras, gerenciamento, etc); e que, na América Latina, seja exemplo único.

Mas, a par deles, há inúmeros exemplos, distribuídos por quase todos os setores da engenharia e regiões do País, que destoam desses padrões; e da própria história da engenharia brasileira: escavações de túneis que “não se encontram”; aeroporto inaugurado sem estrada de acesso; parque eólico pronto sem linha de transmissão; porto sem ferrovia, ferrovia sem porto; frota nova de trens entregue (e ociosa) por falta de via permanente e/ou capacidade energética; acesso de navio a terminal portuário turístico de passageiros impedida por falta de calado aéreo de ponte (construídos quase simultaneamente), re-trabalhos, obras paralisadas (muitas por mais de uma vez!), extensão de prazos e aumento de custos; etc. etc.

Para muitos profissionais há, até, a sensação de que, em alguns casos, “andamos para trás”! “Já fomos melhores”!

As causas e as responsabilidades do acidente/tragédia da ciclovia dentro de poucas semanas serão conhecidas. Mas, além do pontual, do individual, será que questões sistêmicas não estão a afetar a engenharia nacional?

Qualificação dos profissionais? Ética? Haveria correlação entre a corrupção, que vai sendo revelada (envolvendo algumas empresas do setor) e a própria engenharia? Se identificadas, seriam decorrentes da queda no padrão dos cursos? Mudança na forma de contratação de planos, projetos e obras (com destaque para a introdução do RDC - 02)? Primado da marquetagem no processo decisório brasileiro (principalmente governamental)? Esvaziamento das áreas técnicas nas empresas estatais? (01, 02, 03, 04, 05).

A valorização do profissional, tão cara e bandeira das entidades, depende e será tão mais exitosa quando mais respeitada for a engenharia brasileira: Pouco adiantará seguirmos brandindo o orgulho do seu histórico de sucessos (que é amplo!); que “somos mais de 1 milhão de profissionais”; que “mais de 70% do PIB envolve engenheiros e profissionais do sistema” (como também, pessoalmente, já repeti inúmeras vezes!); que “a engenharia e engenheiros têm participação decisiva no processo decisório em países desenvolvidos”; etc; etc.

Cada acidente desse tipo, além de ser um golpe às vítimas, especificamente; e, no caso, ao querido Rio de Janeiro e às Olimpíadas, é mais um golpe à engenharia nacional; visto que “a profissão realiza-se pelo cumprimento responsável e competente dos compromissos profissionais, munindo-se de técnicas adequadas, assegurando os resultados propostos e a qualidade satisfatória nos serviços e produtos, e observando a segurança nos seus procedimentos” (Art. 8º, IV do “Código de Ética Profissional”, em consonância com a lei regulamentadora da profissão - Lei nº 5.194/66).

Essa reflexão/discussão precisa ser trazida à mesa. Aliás, alguns até já ensaiam.

CONFEA, CREAs e entidades representativas de profissionais e empresas do setor não podem estar alheios. E, antes que se cogite de “chamar o síndico” (relembrando o inesquecível Tim Maia; que deu nome à Ciclovia), seria melhor se, de forma estruturada, elas capitaneassem tais reflexões/discussão.

A 73ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia – SOEA, que ocorrerá no Paraná no final de agosto próximo, é uma excelente oportunidade para tanto. Aliás, bem sintônica com seu tema central: “Engenharia a favor do Brasil – Mudanças e Oportunidades”.

(*) Da série “Passando o Brasil à Limpo”: XII

Frederico Bussinger. consultor. Foi presidente da Companhia Docas de São Sebastião (CDSS), SPTrans, CPTM e Confea. Diretor da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), do Departamento Hidroviário de SP e do Metrô de SP. Presidiu também o Conselho de Administração da CET/SP, SPTrans, Codesa (Porto de Vitória), RFFSA, CNTU e Comitê de Estadualizações da CBTU. Coordenador do GT de Transportes da Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC-SP). Membro da Comissão Diretora do Programa Nacional de Desestatização e do Conselho Fiscal da Eletrobrás.

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*Todo o conteúdo contido neste artigo é de responsabilidade de seu autor, não passa por filtros e não reflete necessariamente a posição editorial do Portogente.

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