Vice-presidente de Comunicação do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM
A exportação de uma tonelada de grãos gira em torno de US$ 430, atualmente, enquanto o embarque do mesmo volume de carne representa mais de US$ 1,7 mil. Olhando para o futuro, essa relação de retorno já demonstra bem em que direção o agronegócio brasileiro deve investir e priorizar focos.
Isso não é uma projeção abstrata. Segundo a FAO/OCDE, por exemplo, até 2022 o consumo mundial de carnes terá um crescimento firme, sendo 13% para a carne suína, 14% para a bovina e 19% para a de frango. E, se há um país que tem fortes vantagens comparativas para aproveitar oportunidades nesses mercados, esse país é o Brasil. Tanto que, em setembro último, assumiu a liderança no ranking dos principais exportadores mundiais de frango.
Para quem tem dúvidas, vamos pensar na crise que atravessamos no país e vamos pensar na competitividade dos produtores, individualmente. Toda crise, pelas dificuldades conjunturais que traz, ressalta os pontos fortes e diferenciais competitivos de produtores e empresas que construíram vantagens sobre seus concorrentes, de forma sustentável, ao longo no tempo.
Para essas organizações o momento é para fazer valer essas vantagens e investir para avançar no mercado, conquistar novas áreas ou segmentos e impactar o mercado com inovações. A visão conservadora de ficar parado e esperar o pior passar até pode nos poupar de stress econômico ou financeiro. Mas, de outro lado, tende a não levar a lugar nenhum. Se temos confiança em nossos diferenciais competitivos – seja pensando como país ou como empresário, temos que ir para cima da crise.
O suinocultor brasileiro, por exemplo, é um dos melhores do mundo. O salto tecnológico que nossa suinocultura deu em três décadas, saindo do porco piau para a automação de granjas e abrindo espaço no mercado internacional, bem mostram a capacidade empreendedora do setor. A nossa avicultura e bovinocultura também não deixam por menos e dão lições de competitividade para o mundo.
O que não pode acontecer é todo esse potencial realizador ficar entorpecido pelos ditames da crise, pela falta de confiança, pelo temor da conjuntura. Realismo e pé no chão sim. É saudável. Imobilismo e temor não, pois não é assim que se superam situações e conquistam coisas. Aliás, a história das três cadeias produtivas brasileiras de carne é a melhor prova disso.
Sabemos que aumentar e dar estabilidade à produção de grãos, principal insumo da indústria de carnes, é estratégico para a expansão competitiva e de valor do agronegócio brasileiro. Mas olhando para o futuro, o grande desafio é agregar ainda mais valor, transformando commodities em alimentos beneficiados – conquistando se possível o consumidor final dos mercados do exterior e não apenas o importador de commodities.
Como fazer isso, não é um caminho rápido, nem suave. Além de coragem empreendedora, exige conhecimento, gestão de precisão e um olhar constante sobre o consumidor, pois o consumo alimentar passa hoje por mudanças radicais nas tendências de alimentação, em todo mundo, e aí certamente estarão oportunidades para diferenciar produtos e gerar valor percebido para nossas ofertas.