Não será nada fácil a tarefa do novo presidente da operadora de telefonia móvel italiana TIM, Andrea Mangoni. Recém-empossado no cargo, sua principal missão será recuperar a desgastada imagem da operadora no Brasil, imersa numa crise, sem precedentes.
Não bastassem os transtornos nas relações com o governo, a justiça, as agências reguladoras e os órgãos de defesa do consumidor, decorrentes em grande parte dos graves problemas na qualidade dos serviços prestados aos seus clientes, Mangoni enfrentará ainda o descontentamento dos acionistas minoritários com a gestão e os resultados da companhia.
A JVCO Participações, um dos acionistas minoritários da TIM, ajuizou, na semana passada, uma ação. Nela, reivindica que o controlador italiano, a Telecom Italia, Pague à TIM brasileira uma indenização de mais de 8 bilhões de reais por perdas que causou à companhia brasileira (TIM) devido a abuso do seu poder de controle.
A disputa envolve acionistas minoritários e o controlador. O italiano Mangoni foi vice-presidente financeiro da Telecom Italia. Cargo que trocou pela presidência da TIM no Brasil aonde também tem assento no Conselho de Administração.
Como executivo da TIM brasileira ele não poderá agir em benefício dos antigos colegas da Telecom Italia, mas em defesa dos interesses da empresa brasileira que agora preside. Do contrário, estará confirmando a acusação de prática de abuso do poder de controle por parte da Telecom Italia.
Como administrador de uma das maiores sociedades anônima listadas no Novo Mercado, segmento especial da Bolsa de Valores que abriga empresas com o mais avançado nível de governança corporativa, ele estará à frente de uma companhia que terá obrigatoriamente que fazer da transparência uma prática.
Entenda o caso
O antecessor de Mangoni, Luca Luciani, assumiu a presidência da TIM em 2009, após o início das investigações pela promotoria pública de Milão que acusa a Telecom Italia e seus executivos de falsificarem milhões de sim cards (chips de celular) com o intuito de aumentar artificialmente sua participação de mercado na Europa. Alguns destes sim cards teriam sido ativados para usuários falecidos ou inexistentes, segundo os investigadores.
Tendo sido o principal administrador da divisão de serviços móveis da Telecom Italia durante a época em que as falsificações ocorreram, Luciani é acusado pelos promotores de prestar falso testemunho à justiça italiana e de tentar obstruir o trabalho de autoridades regulatórias, dentre outros crimes. Como parte beneficiada pelas fraudes, pesam acusações pelos mesmos promotores também contra a própria Telecom Italia.
Em sua gestão no Brasil, Luciani, como executivo, mudou a TIM “da água para o vinho”, tornando-a a segunda maior companhia de telefonia móvel do Brasil em participação de mercado, além de uma das vedetes da Bolsa de Valores. Tal desempenho melhorou substancialmente o resultado econômico-financeiro da Telecom Italia, que há muito tempo responde por um endividamento da ordem de dezenas de bilhões de euros. Não é por acaso que a Telecom Italia indicou o seu ex-diretor financeiro, Mangoni, para assumir a operação brasileira, quando demitiu Luciani.
O espetacular crescimento da sua base de clientes decorrente da agressiva e temerária estratégia comercial “ilimitada” dos planos Infinity e Liberty teve seu preço: um excessivo aumento de tráfego na rede da TIM, que passou a figurar entre as mais reclamadas no judiciário e nos órgãos de defesa dos consumidores.
A situação se agravou a tal ponto que, em julho de 2012, a ANATEL determinou a suspensão das vendas da TIM em 19 estados.
Demissão inexplicada
As razões que levaram o conselho de administração da Telecom Italia a tomar a decisão de demitir sumariamente Luciani ainda não foram totalmente esclarecidas. A evasiva entrevista concedida à Exame pelo chairman da Telecom Italia, Franco Bernabè, só serviu para piorar as especulações existentes.
Os acionistas da TIM protestaram, sem sucesso, na ocasião, pela divulgação pública da auditoria realizada pela consultoria Delloite, na base de clientes da companhia no Brasil. Foi a mesma consultoria que apurou as fraudes ocorridas na Itália.
Pouco após a suspensão das vendas imposta pela ANATEL, que já havia ocasionado grande perda de valor das ações da TIM, foi divulgado, pela mesma agência, um relatório acusando a TIM de “desligar” propositalmente chamadas dos seus assinantes para faturar as novas chamadas geradas. A ANATEL ainda não se manifestou definitivamente sobre o assunto.
As acusações no Brasil e na Itália serviram para que acionistas minoritários passassem a questionar os fundamentos da estupenda melhora do desempenho financeiro da TIM durante a gestão Luciani, o que vem gerando toda a sorte de rumores e especulações.
Ainda durante a gestão de Luciani, as provisões registradas nos balanços da TIM para cobrir o seu risco tributário foram progressivamente reduzidas de 10% para 2% das autuações existentes. A JVCO solicitou à CVM e à SEC (CVM americana) uma investigação da adequação dessas provisões e da realidade dos lucros apurados pela companhia brasileira.
Na ação ajuizada, os acionistas minoritários da TIM responsabilizam a Telecom Italia pela indicação de Luciani para a presidência da empresa, apesar de ter amplo conhecimento das acusações e da investigação da promotoria pública de Milão.
A falta de clareza da Telecom Italia e do próprio Andrea Mangoni ao abordarem os atos de gestão e as razões da demissão de Luciani só faz piorar a percepção de que ainda há muito a ser esclarecido. Nesse contexto, a ação proposta pela JVCO pode ser apenas a ponta do iceberg.
Fonte: Correio do Brasil