Quarta, 05 Fevereiro 2025

Anúncio de programa de investimento muda clima de negócios no País, diz IBS. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ainda não deslanchou. Mesmo assim, o setor de siderurgia brasileiro tem identificado um movimento maior da economia. Em entrevista a este jornal, o presidente do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), Luiz André Rico Vicente, que também comanda a Gerdau Açominas, afirmou que o clima criado pelo presidente Lula com o lançamento do programa tem sido muito importante no desenvolvimento do consumo. "Até então, não se falava de um plano de investimento. Falávamos apenas de estabilização, economia, distribuição de renda e ajuste fiscal." Para Rico Vicente, o novo discurso induz a uma mudança no clima de negócios no País. Como exemplo, citou o crescimento de 19% da venda de aços planos no mercado doméstico, para 841,9 mil toneladas no primeiro bimestre deste ano.

No entanto, Rico Vicente criticou a passividade do governo frente a expansão da China no comércio internacional e a falta de agilidade na criação de instrumentos de controle que imponham barreiras e disciplinem o comércio bilateral. "A China não é competitiva na produção do aço, mas na manufatura de produtos de aço é."

Gazeta Mercantil - Quais as expectativas do IBS para 2007?
Luiz André Rico Vicente - Evidentemente que a nossa expectativa é de que o PAC seja aprovado, com os vários projetos que dependem do Congresso, e esperamos um número superior a 3% de crescimento para o PIB. Há expectativa até de 4% e isso muda por completo as nossas previsões originais. Nós previmos originalmente que as vendas internas cresceriam 7%. Mas na área de planos, por exemplo, em que a gente previa alta de 8,3%, passando de 10,3 milhões para 11,2 milhões de toneladas em 2007, algumas empresas já estão falando em mais de 10%.

Gazeta Mercantil - Esse movimento maior já foi verificado no primeiro bimestre ?
Rico Vicente - Não, ainda é expectativa com o PAC, principalmente no setor de planos. Em longos também existe uma expectativa muito grande. O longo teve um crescimento mais forte, de 11,1%, entre 2006 e 2005, ou seja, em 2005 as vendas foram de 5,8 milhões de toneladas e em 2006, 6,5 milhões. Tínhamos previsto, por essa venda forte no ano passado, que esse ano iríamos a 6,7 milhões, uma previsão bastante pessimista de elevação de apenas 3,7%. Entretanto, agora estamos mais otimistas e esperamos que esse crescimento de 2006 possa se repetir, ou até ser maior, uma vez que o PAC afeta fortemente a construção civil. Nada disso havia sido pensado quando fizemos as nossas projeções, no final de 2006.

Gazeta Mercantil - E no segmento de semi-acabados, qual é a previsão de vocês?
Rico Vicente - Aí já é uma previsão mais certa, que não está diretamente influenciada pelo PAC, mas pela entrada em operação das expansões da Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) e da Gerdau Açominas. A estimativa é que as vendas passem de 683 mil toneladas para 799 mil, atingindo, dentro da previsão inicial, um crescimento de 17% de 2006 para 2007.

Gazeta Mercantil - Algumas distribuidoras verificaram no primeiro trimestre deste ano um crescimento de até 15%. Isso já é acima do esperado, mesmo sem impacto do PAC.
Rico Vicente - Mesmo sem o PAC algumas empresas estão anunciando incremento forte de vendas. Mas o próprio clima criado pelo presidente Lula tem sido muito importante no desenvolvimento da confiança do consumidor. Até então, no País não se falava de um plano de investimento. Falávamos apenas de estabilização, economia, distribuição de renda, ajuste fiscal. Só ajustes, ajustes, ajustes. Houve uma mudança muito forte por parte do discurso e da prática do Planalto, que colocou na agenda um projeto de desenvolvimento. Isso necessariamente induz a uma mudança muito forte no clima de negócios no País. Não só o consumidor, como os consultores e investidores mudam o ânimo. Então considero que esse efeito já vem acontecendo nesses primeiros meses, que estão registrando números fortes. Por exemplo, em planos, entre janeiro e fevereiro foram vendidas ao mercado interno 841,9 mil toneladas, uma alta de quase 19% ante os 707,8 mil toneladas de 2006. Em longos, tivemos um crescimento um pouco menor, mas porque já vem de uma base muito forte do ano passado.

Gazeta Mercantil - Especialistas do setor sempre consideraram empresas como a Votorantim e a Usiminas como mais contidas, mas recentemente justamente elas apresentaram planos mais expressivos de expansão. Podemos considerar com isso que as empresas brasileiras têm apresentado uma postura mais agressiva para se colocar no cenário mundial do setor, que vem passando por uma consolidação?
Rico Vicente - O Brasil tem tido um comportamento bastante positivo e agressivo no que tange a consolidações. Se analisarmos, existe a presença já conhecidíssima do Grupo Gerdau na Europa, nos Estados Unidos, na América Latina. O Gerdau tem publicamente sido um dos mais agressivos do País. Mas a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) também tem que ser lembrada, porque tem algumas incursões nos Estados Unidos, na Europa, não só em Portugal como recentemente na Holanda-Inglaterra, com o episódio Corus, que ficou com a Tata. Agora, a entrada da Barra Mansa/Votorantim na Colômbia. Evidentemente que se você for comparar com os episódios das concentrações na Europa nós estamos muito atrás, mas acredito que esse clima deve permanecer. Nós cada vez acreditamos mais que o crescimento da siderurgia no mundo vai ter uma duração muito longa, porque acreditamos que o desenvolvimento da China, como o da Índia, são desenvolvimentos estruturados e terão longa duração, como foi o acesso do Japão a países de economia superior, como teve lá atrás o crescimento americano, o crescimento da Europa. Isso traz um estímulo muito grande a empresas que estão no setor decidirem novos investimentos. E você tem de crescer para poder continuar. O jogo hoje é de caça e pesca, quem não caçar é pescado.

Gazeta Mercantil - E neste sentido vale crescer tanto com aquisição como com crescimento da produção interna?
Rico Vicente - Certamente. Se você tem uma infra-estrutura preparada, condições internas de desenvolver seus projetos, eu acho que é um caminho. É um caminho mais lento de crescimento porque entre decidir, projetar, construir e "startar" é um caminho lento. O caminho rápido é realmente adquirir o que for possível, evidentemente bons ativos.

Gazeta Mercantil - Diante deste quadro mais otimista, aumentou o volume de investimentos que o setor deve realizar nos próximos anos?
Rico Vicente - Coisa definida, que vai entrar até 2010, são 7,4 milhões de toneladas. Com isso, em 2010 a capacidade seria de 44 milhões de toneladas das empresas que hoje fazem parte do IBS. Além dessas, tem a CSA (Companhia Siderúrgica do Atlântico), do ThyssenKrupp, no estado do Rio, e tem também - possivelmente, nós não sabemos como esse projeto vai caminhar - a Ceará Steel. Isso daria 6 milhões de toneladas e nós chegaríamos a 50,5 milhões de toneladas em 2010, caso o projeto Ceará Steel seja viabilizado. Para frente, entre 2010 e 2015, temos projetos em estudos que oscilariam entre 18,5 milhões de toneladas até 25 milhões de toneladas. Então até 2015 o parque nacional seria ou de 79 milhões de toneladas de capacidade instalada ou de 75,5 milhões de toneladas, dependendo do desenvolvimento destes projetos, que naturalmente estão ligados não só ao bom clima de investimento nacional como internacional. Em outras palavras: nós contamos com PAC, nós contamos que a China continue crescendo, que a Índia continue crescendo, acreditamos no equilíbrio da economia americana, sem nenhum rebate. O mundo atravessa uma fase que a gente acredita que vai perdurar por um bom tempo. Otimistas "pra burro".

Gazeta Mercantil - Mas a China também pode se mostrar como uma ameaça para a indústria nacional, e isso já se observa, com o recente aumento das importações de produtos siderúrgicos chineses pelo Brasil. Como vocês estão vendo esse movimento?
Rico Vicente - A China realmente é um paradoxo. Ao mesmo tempo em que é um grande estimulador de toda economia do mundo é uma grande ameaça, porque eles definiram ser o grande manufaturador do mundo. Mas acreditamos que em termos de aço, a China não é competitiva. Em aço, a China é competitiva na medida em que integra e elabora os produtos. Nisso ela é uma ameaça. Então será preciso aprender a viver com a economia chinesa. Temos defendido diante do governo federal que é preciso estar absolutamente atento e fazer o que muitas outras economias do mundo estão fazendo: tratá-la como ela nos trata, quer dizer, se o iuan é subvalorizado, temos de nos proteger aqui. A Europa já se protegeu impondo barreiras e disciplinando o comércio. Isso também já está sendo feito pelos Estados Unidos, por vários países do Sudeste Asiático, por alguns países da América Central. Então é preciso que o Brasil conviva com a China aproveitando do seu crescimento, mas disciplinando as distorções que o país tem pelas desigualdades no tratamento da mão-de-obra, pelo tratamento tributário, pelos excessivos subsídios que ainda pratica e principalmente pela relação de valor da moeda chinesa. O Brasil tem que estar atento e dosando de tal forma que a gente troque mercado mas não mutile a indústria nacional.

Gazeta Mercantil - Mas até agora a solicitação do IBS de aumentar a tarifa de importação não ecoou no governo.
Rico Vicente - A Camex (Câmara de Comércio Exterior) mais uma vez se reuniu e confirmou que o aço ficará na mesma posição. E nós estamos inteiramente desprotegidos nesse cenário. Temos mostrados que essa medida foi injusta, de natureza política, atingindo unicamente o nosso setor e questionamos muito seus efeitos, mas não conseguimos convencer o governo.

Gazeta Mercantil - Como estão as importações chinesas?
Rico Vicente - Em 2003 a China importava 37 milhões de toneladas de produtos de aço acabado. Em 2006 foram 18 milhões, uma queda de 30%. Por outro lado, enquanto em 2003 a China exportava 7 milhões de toneladas de produtos acabados, em 2006 foram 40 milhões de toneladas, um crescimento de 95%. Você vê que em produtos acabados a China realmente deu um salto muito forte. Em semi-acabados, em 2003 a China importou 5,9 milhões de toneladas e em 2006 foram 500 mil tonelada. Por outro lado, exportou 1,5 milhão em 2003 e 9,1 milhões em 2006, um crescimento de 27%. Então, como você vê, ela é um grande mercado, um grande impulsionador, mas é preciso ter muito mecanismo de proteção e saber atuar de forma cirúrgica, como tem sido feito pelos europeus, americanos e asiáticos.

Gazeta Mercantil - As empresas brasileiras estão perdendo vendas no mercado internacional por conta do avanço das exportações chinesas?
Rico Vicente - O produto chinês vai ganhando espaço no mercado internacional e vai desviando todo o comércio. É o famoso desvio de comércio que tem provocado sérias barreiras na Europa e nos Estados Unidos. Mas eu acho que o Brasil está bem. Estamos presentes hoje, com as nossas empresas, em vários países da América Latina. Crescemos bastante na Europa e nos Estados Unidos. Crescemos muito também em qualidade. Porque você tem que ter dois movimentos: um é o de buscar novos nichos de mercado no Oriente Médio, na Europa, na África, enfim no mundo inteiro. Mas também tem de oferecer produtos de alta qualidade, fora da commodity. Então em vez de vender aços para qualquer utilização, vai vender aço para industria de linha branca, aço para parafuso, enfim aços que demandam qualidade melhor para aplicações mais nobres. O Brasil se coloca entre os melhores do mundo em tecnologia de produto. Desde que houve a privatização, houve uma tremenda modernização de todo o parque industrial. Em produção nós também temos a melhor tecnologia disponível, estamos entre os mais avançados. O setor de aço no Brasil você não pode chamar, como chamam em outros lugares, de setor tradicional. É um setor extremamente dinâmico e moderno.

Gazeta Mercantil - O desempenho financeiro das empresas foi mais fraco em 2006. Qual a expectativa para este ano?
Rico Vicente - A expectativa é positiva. Os preços que vinham caindo nos últimos meses do ano passado retomaram de uma forma muito forte este ano, com reflexo nas exportações dos meses de abril, maio e junho de 2007. A sucata também tem subido de uma maneira muito forte. Então, estamos otimistas com relação ao ano.

Fonte: Gazeta Mercantil - 16 ABR 07

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