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 Por Osvaldo Agripino

Decisão recente, de 11 de setembro, do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) determinou ao CRECI-GO que é proibido impor valores mínimos em tabela da entidade que regula os corretores de imóveis em Goiás. Dessa forma, a autoridade antitruste contribui para o dinamismo do mercado imobiliário e a efetividade do art. 724 do Código Civil que estabelece que “a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais.

No setor logístico, especialmente em áreas próximas a terminais de contêineres, como SUAPE, Santos, Paranaguá, São Francisco do Sul, Itapoá, Navegantes, Itajaí, Imbituba, Rio Grande, a tendência é de aumento da demanda por transações imobiliárias que envolvam a infraestrutura retroportuária, diante do aumento das operações de embarque e desembarque, através de terminais da zona secundária.

Esse cenário exige corretores especializados e valorizados, sem a imposição de preço mínimo nos serviços prestados por meio de tabelas de órgão de classe. Não confundir com o preço-teto nos serviços de infraestrutura de mercados regulados, que devem observar a modicidade.

Por tais motivos, o presente artigo trata dessa decisão. Primeiramente, devo mencionar, que a profissão de corretor de imóveis é fortemente regulada pelos Conselhos Regionais e possui alta relevância social e econômica, pois contribui de forma técnica e individualizada para a realização das operações de compra e venda de imóveis, permuta, dentre inúmeras outras atividades essenciais para o dinamismo da economia de mercado.

O trabalho do corretor imobiliário existe há milênios e não se limita à compra e venda de imóveis. É muito mais. O corretor, em qualquer área, prioriza a realização de bons negócios para as partes envolvidas. É um agente vital para a economia de mercado e a efetividade dos valores e princípios constitucionais da ordem econômica que é direcionada para o capitalismo, especialmente para a segurança jurídica, inclusive com função social dos contratos, e as defesas da concorrência e do consumidor

Segundo o Cade, não cabe a imposição dos valores mínimos em tabela criada por entidade de classe. A decisão no Processo Administrativo nº 08700.000284/2022-72, em representação ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis da 5ª. Região (CRECI/GO), através do voto do Conselheiro-Relator Diogo Thomson de Andrade, contribui para a desenvolvimento do mercado imobiliário através da corretagem, aumentando a livre iniciativa e o poder de negociação entre as partes, da seguinte forma:

Por todo o exposto, voto pela condenação, com base no art. 36, incisos I e IV c/c § 3º, inciso II, da Lei nº 12.529/2011, e pelo estabelecimento de multa no valor de R$ 320.000,00 (trezentos e vinte mil reais), com base no art. 37, inciso II, da Lei nº 12.529/2011 em relação ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis da 5ª Região (CRECI/GO).

Determino ainda, ao CRECI-GO que remova de seus endereços eletrônicos todas as referências remanescentes à tabela de preços, ao código de ética desatualizado aqui mencionado e aos contratos com valores pré-estabelecidos apurados no âmbito deste processo administrativo.

Ademais, determino que se abstenha de instituir regulamentos, sindicâncias e processos administrativos ou de recorrer a quaisquer outros meios para punir, retaliar ou ameaçar os corretores de imóveis do estado de Goiás que não adotem os preços tabelados pelas entidades especializadas.

Por fim, recomendo à SG/Cade que oficie, da forma que entender mais cabível, o COFECI, solicitando informações sobre as medidas de fiscalização e orientação adotadas junto aos Conselhos Regionais, com o objetivo de garantir o cumprimento da legislação vigente, especialmente no que se refere à proibição do tabelamento impositivo de honorários e, também, com vistas de assegurar a efetividade dos termos do TCC firmado com o Cade, que está em fase de monitoramento.

Em síntese, a decisão entende que a homologação de tabelas, mesmo sem caráter impositivo de fato, caso estas representem influência à adoção de conduta comercial uniforme, causa danos à concorrência.

O Processo Administrativo (“PA”) foi instaurado em 29.12.2022 para investigar suposta prática anticompetitiva de influência à adoção de conduta comercial uniforme ou concertada entre concorrentes, prevista no art. 36, incisos I e IV c/c §3º, inciso II, da Lei nº 12.529/2011, no mercado de serviços de corretores de imóveis no estado de Goiás, em face do CRECI/GO.

Isso se deu diante da:

(...) existência de uma superposição de instrumentos normativos internos que impõem aos corretores imobiliários a cobrança de honorários de acordo com tabelas elaboradas pelos respectivos sindicatos e homologadas pelos conselhos regionais, além de condições comerciais anticompetitivas, relacionadas à contratação de serviços de corretagem de imóveis com exclusividade. Tais imposições decorreriam do fato de que o descumprimento dos valores estabelecidos nas referidas tabelas e a formalização de contratos sem previsão de exclusividade seriam passíveis de punição por desvio ético, conforme previsto na Resolução-COFECI nº 326/95, que instituiu o Código de Ética dos corretores de imóveis, e na Resolução-COFECI nº 485/95 (NOTA TÉCNICA Nº 83/2016/CGAA6/SGA2/SG/CADE, SEI 0257000).

Em resumo, a relação entre as condutas destacadas e o Sistema COFECI-CRECI se deu pelo fato de os Conselhos Regionais dos Corretores de Imóveis (CRECIs) utilizarem sua competência, conforme o art. 17, IV, da Lei nº 6.530/78, para homologar tabelas de preços de serviços de corretagem, elaboradas e aprovadas pelos sindicatos respectivos, mas fiscalizando seu cumprimento. Essa fiscalização era embasada no Código de Ética profissional instituído pelo COFECI juntamente com suas Resoluções, que estabeleciam punições para o descumprimento da tabela.

Com o intuito de adequar seu sistema normativo à Lei de Defesa da Concorrência (“LDC”, Lei nº12.529/2011), destacam-se as seguintes obrigações – dentre outras – assumidas especificamente pelo COFECI no TCC firmado (SEI 0455612) no tocante às tabelas de preço:

a) O compromisso de modificar dispositivo de seu Código de Ética Profissional:

Art. 6º - É vedado ao Corretor de Imóveis: [...] V – receber comissões em desacordo com a Tabela aprovada ou vantagens que não correspondam a serviço efetiva e licitamente prestado.

Art. 6º - É vedado ao Corretor de Imóveis: [...] V – receber comissões ou vantagens que não correspondam a serviços efetiva e licitamente prestados.

b) O compromisso de revogar integralmente sua Resolução nº 334/92 e parcialmente sua Resolução nº 1.256/2012: Revogar integralmente Resolução-COFECI nº 334/92, que prevê em seus artigos 1º e 5º:

Art. 1º - Os Conselhos Regionais, ao homologarem as Tabelas de Honorários apresentadas pelos Sindicatos, obedecerão aos seguintes limites máximos: I – Para intermediação de locação, o valor correspondente a 01 (um) aluguel mensal, sem prejuízo da cobrança dos honorários devidos pelos serviços de administração; II – Para a administração de imóveis, um percentual de até 12% (doze por cento) do montante dos recebimentos mensais, salvo hipótese de aluguel garantido, por todo tempo de duração da locação; III – Para a elaboração de contrato de locação de imóveis, um percentual de até 5% (cinco por cento) sobre o valor de um ano

Art. 5º - O não cumprimento da presente Resolução, inclusive dos limites fixados nas Tabelas homologadas ou baixadas pelos CRECIs, ou, na sua falta, os limites fixados por esta Resolução, sujeitará o infrator às penalidades legais previstas para faltas graves.

Revogar o quarto “Considerando” e o art. 2º e parágrafo único da Resolução-COFECI nº. 1.256/2012, que dispõem:

CONSIDERANDO que é obrigação do Corretor de Imóveis, pessoa natural ou jurídica, respeitar a tabela mínima de honorários homologada por seu respectivo Regional (Conselho Regional de Corretores de Imóveis)

Art. 2º - Nos contratos a que se refere o artigo 1º, os profissionais e empresas inscritos no Regional terão que obedecer à tabela de honorários mínimos homologada pelo Regional.

Parágrafo Único – Dos honorários a que se refere este artigo, não poderão ser deduzidos valores para compensação de premiações por produtividade, taxas de gerenciamento, de coordenação ou qualquer outro tipo de desconto, seja a que título for

c) E o compromisso de revogar todas as demais eventuais resoluções que possam ser contrárias à livre-concorrência.

Nesse passo, como um dos resultados do TCC, foi encerrada a obrigação dos corretores de imóveis de obedecer às tabelas de honorários no contexto do Sistema COFECI-CRECI diante da compreensão que, apesar da Lei nº 6.530/78 prever a possibilidade de elaboração de tabelas de preços para a profissão de Corretor de Imóveis, não há amparo legal que justifique o caráter obrigatório e impositivo dessas tabelas.

Evidencia-se, contudo, que o CRECI/GO não foi incluído entre os representados no caso julgado devido à ausência de indícios de violação à ordem econômica por parte da referida autarquia durante o período em que o processo foi instaurado.

À época das investigações, em resposta ao Ofício nº 2614/2016/Cade (SEI 0208094), o CRECI/GO esclareceu que, apesar da fiscalização do cumprimento da tabela de honorários ser autorizada pelo COFECI, em virtude de decisão proferida na ação judicial nº 583897520124013400 não exigia o acatamento de tal norma.

A partir da investigação desenvolvida pela SG/Cade foram identificados, em 14.01.2022, no sítio eletrônico do CRECI-GO (https://crecigo.gov.br), documentos que denotariam a influência à adoção de conduta comercial uniforme entre os corretores de imóveis ligados àquele Conselho, quais sejam:

a) Uma tabela de honorários contendo percentuais a serem cobrados por serviços de corretagem da categoria
b) Uma versão desatualizada do código de ética dos corretores de imóveis, o qual contém instruções relativas à obrigatoriedade de cobrança de honorários em acordo com as tabelas de precificação aprovadas pelo Conselho, assim como previsões de penas para o descumprimento de tal mandamento; e
c) Um modelo de contrato com valores referentes a honorários já preestabelecidos.

O Cade, que sistematiza alguns riscos aventados em seus julgados no tocante a tabelas–, abordou que a inserção destas em ambientes concorrenciais leva à mitigação da liberdade contratual dos agentes sujeitos a ela para estipulação de seus preços conforme as peculiaridades concretas da pactuação (poder de barganha) e, dessa forma, pode reduzir a competitividade entre concorrentes, tendo em vista a possibilidade de:

a) Provocar uma elevação artificial vinculante no preço final do produto (repasse), em prejuízo ao consumidor, seja ele da cadeia de produção ou final (limitação da possibilidade de barganha);
b) Reduzir os incentivos à inovação, por levar a um arrefecimento concorrencial e, consequentemente, diminuir a pressão por diferenciação e melhoria contínua; e
c) Levar à queda de qualidade do produto/serviço em razão da acomodação dos concorrentes.

Neste cenário, considerando o grande volume de julgados da matéria, é possível observar uma atuação incisiva do CADE na condenação de entidades representativas das categorias que congregam profissionais liberais que realizam tabelamento de preços.

Segundo o voto do Relator, a título de exemplo, um estudo do DEE/Cade demonstrou que – no período entre junho de1996 a dezembro de 2021 – 88,3% das decisões de julgamento de Processos Administrativos referentes a tabelas médicas resultaram em condenação.

Além disso, também são encontrados relevantes julgados de condenações relacionadas à adoção de condutas comerciais uniformes em diferentes órgãos de classe e empresas, como ABRINQ- Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos, Sindicon - Sindicato dos Transportadores Autônomos de Contêineres do Litoral Paulista, Sindisan - Sindicato das Empresas de Transporte Comercial de Carga no Litoral Paulista, Sindicam - Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens da Baixada Santista, Sindicato das Empresas de Conservação, Manutenção e Instalação de Elevadores do Estado de São Paulo – SECIESP, Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do Pará e Amapá, Sindicato das Empresas de Transporte de Combustível e Derivados de Petróleo do Estado de Minas Gerais – Sinditanque – MG, Brazilian Educational & Language Travel Association (Associação Brasileira de Organizadores de Viagens Educacionais e Culturais - BELTA), Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (BRAZTOA), Fórum das Agências de Viagens Especializadas em Conta Comerciais (FAVECC),Federação Nacional do Turismo (FENACTUR), Michel Tuma Ness, Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo (SINDETUR-SP), Marciano Gianerini Freire e Associação Brasileira de Agências de Viagens de São Paulo (ABAV-SP).

Vale destacar que é possível identificar cenários em que o uso de tabelas foi considerado lícito, principalmente no mercado relevante de saúde suplementar, evidenciado pelo Caderno do Cade "Mercado de Saúde Suplementar: Condutas" (2021), porque a dinâmica de negociação entre profissionais de medicina, representados pelas entidades médicas, e operadoras de planos de saúde é marcada por uma assimetria de poder de barganha.

O processo no Cade trata da divulgação no sítio eletrônico do Representado (https://crecigo.gov.br/) de documentos que indicariam influência à adoção de conduta comercial uniforme entre os corretores de imóveis vinculados ao CRECI/GO, conforme apurado pelo Cade em 14.01.2022, quais sejam:

a) Uma tabela de honorários contendo percentuais a serem cobrados por serviços de corretagem da categoria, redigida e aprovada pelo Sindicato dos Corretores de Imóveis do estado de Goiás (Sindimóveis-GO), conforme apresentado na Figura 1 – Tabela sugestiva de honorários Sindimóveis-GO, conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade:

Figura 1 Tabela sugestiva de honorários Sindimóveis GO conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade

b) Uma versão anterior e desatualizada do código de ética dos corretores de imóveis, que precede a atualização realizada pelo COFECI após a assinatura de um Termo de Cessão de Conduta ("TCC") com o Cade em 2018, o qual contém instruções relativas à obrigatoriedade de cobrança de honorários em acordo com as tabelas de precificação aprovadas pelos Conselhos regionais, assim como previsões de penas para o descumprimento de tal mandamento, conforme apresentado na Figura 2 – Código de ética, conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade:

Figura 2 Código de ética conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade

c) Um modelo de contrato com valores referentes a honorários preestabelecidos, conforme apresentado na Figura 3: Modelo de contrato com referência a honorários do contratado, conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade:

Figura 3 Modelo de contrato com referência a honorários do contratado conforme apresentado no sítio eletrônico da entidade

Segundo o voto do Conselheiro-Relator, passando à análise de mérito propriamente dito, percebe-se que no bojo da conduta em exame está justamente a estipulação de tabela de honorários para os corretores de imóveis do estado de Goiás. Essa tabela estabelecia não apenas os percentuais mínimos cobrados por cada serviço prestado pelo corretor aos seus clientes (como venda e locação de imóveis, administração de carteira de recebíveis, entre outros), mas também o valor mínimo da hora técnica cobrada e até as taxas de locomoção para atendimento (SEI 1009692).

Enquanto um ilícito por objeto, a imposição de tabela unilateral presumivelmente gera distorções no mercado e, não sendo descaracterizada por algum excludente de ilicitude, caracteriza ilícito concorrencial previsto na Lei nº 12.529/2011, pois altera os incentivos para que a livre iniciativa alcance uma situação negocial constitucionalmente amparada.

As defesas do CRECI-GO podem ser resumidas nos seguintes pontos:

a) Em abril de 2018, o título da tabela de honorários em seu sítio eletrônico foi alterado para "Tabela Sugestiva de Honorários", indicando seu caráter meramente sugestivo;

b) Seguiu a orientação do COFECI de não mais homologar tabelas de honorários, sendo que a última homologação ocorreu em 2008;

c) Não foram iniciados procedimentos disciplinares contra inscritos que não observaram os valores da tabela, devido a decisão judicial de nº 583897520124013400, exarada pelo Juízo da 33ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;

d) A publicação da versão desatualizada do código de ética dos corretores de imóveis em seu sítio eletrônico foi um equívoco;

e) Não houve intenção de violar as regras do mercado de corretagem imobiliária ou prejudicar a livre concorrência entre os agentes.

f) O CRECI/GO tem competência para decidir sobre inscrições de profissionais e empresas, manter registros profissionais, emitir carteiras e certificados, impor sanções disciplinares conforme a legislação vigente, dentre outras (art. 17, da Lei nº 6.530/78).

De acordo com o voto do Relator, percebe-se que o CRECI-GO detém grande capacidade de influência sobe seus credenciados, consubstanciado assim o poder de influência à adoção de conduta comercial uniforme no mercado relevante supra definido.

Conforme já abordado no Processo Administrativo nº 08700.004974/2015-71, nos termos do art. 17, IV, da Lei nº 6.530/78, cabe aos Conselhos Regionais “homologar, obedecidas as peculiaridades locais, tabelas de preços de serviços de corretagem para uso dos inscritos, elaboradas e aprovadas pelos sindicatos respectivos”.

Entretanto, o judiciário, conforme apontado pelo próprio CRECI/GO, no Processo nº 0058389-75.2012.4.01.3400, já estabeleceu em decisão transitada em julgado que (i) a imposição de valores mínimos expressos na tabela de honorários da categoria pelo CRECI/GO viola o princípio da liberdade contratual; e (ii) não há previsão legal para aplicação de sanção por descumprimento dos valores previstos na tabela homologada, conforme ementa:

ADMINISTRATIVO. CONSELHO FEDERAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS – COFECI. RESOLUÇÃO Nº 1.256/2012. ARQUIVAMENTO DO CONTRATO DE CORRETAGEM. INEXIGIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. TABELA DE HONORÁRIOS. IMPOSIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

(...)2. Advirta-se que a “Constituição Federal prevê que a definição de infração, bem como a imposição da respectiva sanção, mesmo administrativa, sujeitam-se ao princípio da legalidade. Assim, para que a multa possa ser aplicada, é necessário que haja expressa previsão legal nesse sentido. 3. Vedação à tipificação de condutas e conseqüente aplicação de multas com previsão em simples ato administrativo (Resolução). Inteligência do art. 5º, II, da Constituição Federal”(AC 550010, rel. Desembargador Federal Francisco Wildo, DJE de 29/11/2012, pág. 403).

3. Além disso, verifica-se que o arquivamento do contrato de corretagem nos Conselhos Regionais constitui indevida interferência do Conselho Federal de Corretores de Imóveis nos contratos celebrados pelos corretores de imóveis, haja vista que a imposição dos valores mínimos expressos na tabela de honorários da categoria viola o princípio da liberdade contratual.

4. “Muito embora a adoção de critérios objetivos na fixação da remuneração de serviços profissionais não fira, por si só, a livre concorrência ou impeça o exercício do trabalho, tem o Superior Tribunal de Justiça entendido que não pode o Conselho Regional de Medicina impor sua tabela de honorários (CBHPM) aos planos de saúde, pois isso violaria a liberdade contratual. Precedentes: (AGTAG nº 2004.01.00.020286-8/MA - Relator Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral - TRF/1ª Região - Sétima Turma - UNÂNIME - D.J. 06/9/2004 - pág. 78.) e (STJ, REsp nº 8.490/RJ, Rel. Min. PEÇANHA MARTINS, T2, maioria, DJ 27/9/1999, pág. 68.)” (AGRAC0005411-39.2004.4.01.4100/RO, Rel. Desembargador Federal José Amilcar Machado, Sétima Turma, e-DJF1 p. 2545 de 08/05/2015).

5. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, não providas. Sentença confirmada

Os corretores de imóveis eram levados a crer – com base nos documentos presentes do sítio eletrônico do CRECI-GO – que deveriam seguir os valores mínimos definidos na tabela de preços e que o seu descumprimento levaria a sanções diante de sua proibitiva exposta no referido artigo 6°inciso V da Resolução supracitada do COFECI, que, entretanto, já havia sido alterado em virtude do TCC firmado entre o Cade e a entidade.

Conforme destacado pela PFE/Cade, “o simples receio de condenação de natureza ética impediu que os profissionais agissem de forma autônoma, ensejando prejuízo aos consumidores dos serviços prestados” (SEI 1390565).

A divulgação de um modelo de contrato de honorários pelo Representado com valores fixos reforçava a ideia de que o cumprimento da tabela era obrigatório, promovendo uma conduta comercial uniforme entre os profissionais ligados ao Representado.

Conforme destacou a Conselheira Ana Frazão no Processo Administrativo nº 08012.004020/2004-64 que condenou o Conselho Regional de Medicina da Bahia (Cremeb), a jurisprudência do Cade evidencia que:

"as entidades representativas têm sido punidas mesmo na ausência de evidências de coação sobre os associados para adotarem os valores definidos na tabela. Nesses casos, a existência de condições estruturais favoráveis à prática anticoncorrencial e o relevante poder de influência das associações têm sido considerados suficientes para a caracterização da infração à ordem econômica" (SEI 0001396).

Dessa maneira, conforme bem destacado pelo Conselheiro Celso Fernandes Campilongo, relator do Processo Administrativo nº 08000.015515/97-0222 – mutatis mutandis para o setor de corretagem de imóveis:

(...) “a divulgação de uma lista visando à uniformização dos honorários médicos de toda a região, ignorando as particularidades do serviço médico, que varia entre localidades, hospitais e profissionais leva a crer que tal fixação de preços não visa à proteção do consumidor em face de um eventual abuso de preços, mas, que sua função é buscar um valor ideal para a fixação de honorários médicos, sem, no entanto, preocupar-se com o valor de mercado”.

No caso do CRECI-GO, segundo o relator, trata-se de uma tabela veiculada pelo Conselho Profissional responsável legal pela fiscalização e regulamentação do exercício daquela atividade na região referida, inclusive com poder sancionatório. A capacidade de influenciar deriva, pois, da natureza jurídica que a própria lei lhe atribui.

Ao extrapolar sua competência legal e, ainda que sob o nome de “sugestiva”, estabelecer uma referência de preço e contrato, mencionando a possibilidade de punição, não há como negar que a ação influenciou a adoção de conduta uniforme entre os corretores.

Diante desse fatos e argumentos, o Conselheiro-Relator reputou configurado o ilícito de influência à adoção de conduta comercial uniforme ou concertada entre concorrentes, prevista no art. 36, incisos I e IV c/c §3º, inciso II, da Lei nº 12.529/2011, no mercado de serviços de corretores de imóveis no estado de Goiás, pelo Conselho Regional de Corretores de Imóveis da 5ª Região (CRECI/GO).

Em conclusão, a decisão do Cade é um precedente relevante para os negócios imobiliários, impõe maior negociação na prestação de serviços de corretagem e, por sua vez, valorização da corretagem imobiliária.

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Dr. Osvaldo Agripino – Advogado (UERJ, 1992), sócio do Agripino & Ferreira, Pós-Doutor em Regulação da infraestrutura, Harvard University, especializado em negócios imobiliários – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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