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Osvaldo Agripino
Advogado especializado em comércio exterior e logística, sócio do Agripino & Ferreira com Pós-Doutoramento na Harvard University em Regulação de Transportes e Portos

Em indústrias de rede, com altos valores de investimentos, concentração horizontal no mercado relevante (IHH > 2500), verticalização, assimetria de informação e de representação como os serviços portuários, é comum condutas oportunistas por parte de alguns prestadores de serviços. Por sua vez, a regulação setorial, cuja razão de existir, é dar efetividade ao interesse público, e garantir, de um lado, o retorno via lucro ao investidor privado e, de outro lado, o serviço adequado ao usuário. Não é tarefa fácil.

No setor portuário, até que se tenha evidências que o atual modelo regulatório é o melhor, pois os relatórios de várias agências como o Banco Mundial e do Fórum Econômico Mundial, e o Doing Business, demonstram que a nossa infraestrutura precisa melhorar, assim como a qualidade e os preços, é preciso uma regulação que reduza os custos de transação, como a preventiva (ex ante), por exemplo, com a definição de critérios para evitar abusos nos preços do setor regulado pela Antaq,
Ela já vem fazendo isso relação ao Serviço de Segregação e Entrega (SSE), para alguns, THC2, agora por meio de um convênio de cooperação com o CADE, e à sobre-estadia de contêiner, cuja falta de regulação adequada possibilita ainda valor de demurrage de R$ 1,6 milhão, ou seja oitenta vezes o valor do frete (EUR 4 mil) e trinta vezes o valor da carga (R$ 30 mil) cobrados por um agente intermediário a um pequeno importador de carga PET da região Sul, transportada em três contêineres dry, e vem contribuindo para afastar pequenos e médios usuários do comércio exterior e, aumentando o desemprego no país.

Poderíamos citar dezenas de outros casos nos quais atuamos ao longo desses trinta anos de advocacia, nos quais os abusos são flagrantes, assim como decisões judiciais que não contribuem para a efetividade do serviço adequado. A Agência vem se preocupando com esse problema e, recentemente, apresentou um relatório de Análise de Impacto Regulatório que contribuirá para a definição de critérios para identificar o abuso.

Outro problema, ainda sem solução, em face da intensa judicialização por parte de terminais e usuários, é a Inspeção Não Invasiva (scanner) que, em alguns portos brasileiros, custa cerca até mais do que R$ 1.000, por inspeção, possivelmente os maiores valores do mundo, com o problema que são pagos, não para o Estado, mas a operadores portuários que, obviamente, possuem despesas para a manutenção do mesmo, vital para o seu negócio.

Nesse cenário, ainda persiste essa insegurança jurídica para os usuários dos serviços portuários, que se submetem ao controle aduaneiro no país e pode prejudicar o seu direito ao serviço adequado. Como resolver esse problema? Como equilibrar os interesses?

A Diretoria da Antaq, ao analisar denúncia da Confederação Nacional da Indústria (CNI) para declarar ilegal a problemática cobrança da inspeção não invasiva de contêiner, criada por portaria da Receita Federal em 2011 e efetuada por terminais portuários sem que houvesse qualquer regulação ou controle da Antaq, resolveu mantê-la, por meio de uma regulação repressiva e sem preço-teto.

Não devemos confundir price cap, autorizado pela Lei de Liberdade Econômica em mercados regulados, com preço-teto, que é comum em atividade regulada, tendo iniciado no Reino Unido nos anos 1980, com o “tabelamento de preço da extinta SUNAB”. São coisas totalmente distintas.

Isso se dá porque a agência decidiu “reconhecer a legalidade e conformidade regulatória da cobrança estratificada da rubrica ´Inspeção Não Invasiva de Contêineres´ por parte das instalações portuárias que operam em regime de arrendamento (nos portos organizados) ou em regime autorizativo (Terminais de Uso Privado -TUPs) e determinar à Superintendência de Regulação - SRG, desta Agência, que promova análise em relação à aderência regulatória da cobrança ora deliberada em relação aos termos da Resolução Normativa nº 34-ANTAQ, recentemente editada, com vistas a avaliar a necessidade e conveniência de inserir o presente assunto no bojo das providências subsequentes à aprovação da referida norma, dentro dos limites regulatórios lá estabelecidos.” Mas qual “conformidade regulatória”?

A referida decisão, apesar de precedida de audiência pública, com diversas contribuições e da constatação de preços muito acima dos custos de operação, não desobriga a Antaq de cumprir institutos tradicionais do Direito, como o poder de polícia e taxa (espécie de tributo que só pode ser criada por lei), assim como tratados internacionais ratificados pelo Brasil, que tratam da modicidade no desembaraço.

A portaria determinou que os terminais alfandegados disponibilizassem o scanner sem custo para a União. Ocorre que alguns daqueles, sem controle adequado por parte do Estado, compraram tais equipamentos e começaram a cobrar por uma atividade de poder de polícia (segurança, vigilância sanitária), que não é serviço portuário requisitado pelo usuário.

Salta aos olhos, portanto, a motivação da decisão da Antaq pois, apesar de reconhecer que o escaneamento gera custos aos terminais (CAPEX e OPEX), a mesma insiste em não criar uma política ex ante, via price cap, para evitar abusos em relação ao preço, defendendo que a regulação ocorra somente em caso de abuso (ex post).

E como ficam as cobranças efetuadas até o momento? E os atuais valores? A decisão poderia retroagir até o início da cobrança feita “a reboque” de uma norma da Receita Federal? Como a agência permitiu que ela fosse feita durante tantos anos, sem que houvesse qualquer medida para evitar o abuso?

Não obstante o esforço do seu qualificado quadro de servidores e a sua curva de aprendizado ao longo dos anos, conhecendo cada vez mais o setor por ela regulado, a Antaq ainda não tem sido capaz de resolver esse problema causado pelas externalidades negativas decorrentes dessa política de apurar as denúncias de abuso somente depois que ocorrem e, quando for o caso, aplicar uma multa (passível de judicialização). Parece-nos que a ratio da política-decisão merece uma análise detalhada e eventual ajuste.

Por tais motivos, o problema continua sem solução adequada e os prejudicados com a decisão e eventualmente insatisfeitos com o valor abusivo da cobrança possuem elementos suficientes para exigirem redução do valor e, se for o caso, a devolução do que foi pago acima dos custos marginais, até que melhor solução seja dada. Como dito, não será tarefa fácil, mas a Antaq vem, cada vez mais, destacando-se na busca de soluções para equilibrar os interesses.

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