Quinta, 21 Novembro 2024

Apesar de já ter me manifestado desde a época da Companhia Docas de Santos (CDS) a esse respeito, volto ao assunto na intenção de provocar uma ampla discussão técnica sobre esse tema.

Por Luiz Alberto Costa Franco é engenheiro civil, ex-diretor da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e consultor de dragagem. Foi chefe do serviço de dragagem do Porto de Santos e é colaborador do Portogente

draga3 Ivan BuenoFoto ilustrativa: Ivan Bueno/Appa 

Trata-se, na realidade, de objeto extremamente importante nas definições a serem adotadas no novo modelo de dragagem que resolva, em caráter definitivo, os impasses à navegação que se verificam a miúde, amplamente discutidos, mas desfocados das reais necessidades do Porto.

Os erros, aos quais me refiro, são de natureza exclusivamente técnica no que diz respeito à mecânica dos solos, suas características, quantificações e consequências nas operações de dragagem, e que oneram desnecessariamente tais serviços.

Como tudo começou
Em 04/01/1978 recebemos para análise e pronunciamento o “Relatório Final do Comportamento Hidráulico e Sedimentológico do Estuário Santista”, elaborado pela Sondotecnica e encaminhado pelo diretor técnico da CDS à época, Clovis de Macedo Côrtes.

Em nossa manifestação expusemos que:

1- Fora utilizado pela consultora a equação de solo saturado para caracterizar a densidade de solo submerso;

2- adoção de densidades da mistura medidas nas cisternas de dragas e batelões nos valores de 1,16 e 1,15 respectivamente, sem qualquer justificativa plausível; e

3- adoção da equação de mecânica de solos para caracterizar a mistura nas cisternas o que considerávamos inadequados visto que essa mistura de ar, água e sólidos não possui as característica de solo. O que não ocorre, tão pouco, com a “vasa in situ” resultante de assoreamentos recentes.

Tais conceitos ao serem adotados, para o cálculo dos índices de assoreamento, apresentaram resultados de cerca de mais de 80% a maior que aqueles obtidos com a utilização das equações corretas, apenas no que diz respeito ao uso da equação do solo saturado na definição do solo submerso. Isto é os valores apresentados seriam no mínimo menores que 20% daqueles apresentados.

Por outro lado, contrastavam com os conceitos emitidos anteriormente pelos estudos feitos pela “Kings & Gavaris” juntamente com o “Laboratório de Hidráulica da USP” que definiam o Estuário e o Lagamar de Santos como estratificados, considerando pequenas as contribuições fluviais face aos rios de pequeno curso e bastante meandrados sugerindo gradientes hidráulicos moderados com pouco sólidos em suspensão.

Novo paradigma de dragagem
Em razão dessas observações, fomos estimulados a elaborar o trabalho apresentado no III Congresso Latino-Americano de Dragagem, sob o título “Dragagem de Material Fino – Areia Fina/ Silte/ Argila - Problemas e Soluções Encontradas no Porto de Santos”, e publicado, em agosto de 1979, na revista “Portos e Navios”. Nele, definindo mais adequadamente os estados do “solo” diferenciando-os em solos virgens, solos de assoreamento recentes e a mistura transportada nas cisternas das dragas autotransportadoras, demonstramos que:

• Pela fórmula proposta por Dr. John F. Riddell- Dredging Performance Yield and Efficiency - para a medida de eficiência de uma operação de dragagem, como sendo Eficiência total= eficiência de bombeamento x eficiência de projeto. Ou seja: (Ym- Ya) / (Yp-Ya) = (Ym – Ya) / (Yi – Ya) x (Yi – Ya) / (Yp – Ya) onde:
Ym= peso específico da mistura;
Ya= peso específico da água;
Yi= peso específico do solo “in situ”;
Yp=peso específico para o qual a draga, com sua cisterna totalmente cheia, atingem o deslocamento máximo de projeto.

• Chegamos, também, à conclusão teórica que a eficiência da dragagem está associada à maior densidade do solo in situ, possível de ser dragado. Assim, ainda de acordo com a equação proposta, busca-se aproximar a densidade da mistura à densidade do solo in situ, sendo que a adoção de sobre dragagem aumenta a densidade do solo “in situ”. Nesse mesmo trabalho registramos, já naquela época, que o porto de Rotterdam adotava a sobre dragagem de 2,5m com essa finalidade.

• De nada serviriam tais conclusões se não tivéssemos obtido na prática os resultados desejados. Com efeito, Com efeito, a partir de junho de 1977, foi feita uma dragagem "sui generis" no canal de acesso, por conta da Portobrás e sob a fiscalização da CDS. As medições mensais abrangiam: - horas de operação; - produções medidas na cisterna; - profundidade média do canal (sondagens batimétricas); - apuração das despesas mensais.

Iniciou-se a dragagem com a profundidade média do canal com -11,5m. Após a dragagem nos meses de junho e julho/1977 atingiu-se a profundidade de -12,5m, e, em agosto - 13,10m. Profundidade a ser atingida 13,5m. Não era permitida a sobre dragagem. A produção foi de junho - 1.394.000m³; julho -1.333.000m³; agosto - 893.000m³ chegando a 400.000 m³ em novembro.

Os custos mantiveram-se dentro de uma média aceitável, enquanto a produção caía sensivelmente à medida que a densidade do material a ser dragado diminuía.

Se tivéssemos mantido a produção da draga próxima à encontrada no início dos serviços, com a dragagem em profundidades maiores (sobre dragagem), teríamos retirado em torno de 2.500.000m³ (50%) a mais que o efetivamente dragado, pelo mesmo custo. Ou seja, o custo do m³ seria metade do verificado. E ainda, esse volume representaria um espaçamento maior entre as dragagens consecutivas, e mais, maiores produtividade destas, face ao adensamento do material assoreado posteriormente.

Isto posta, ao adotar uma nova proposta de dragagem no Porto de Santos é de fundamental interesse que tais questionamentos sejam levados em consideração uma vez que: há, no mínimo, uma incerteza dos volumes de assoreamentos anuais. Se o que se cogita for verdadeiro, haverá uma sensível redução dos volumes a serem dragados na manutenção das profundidades desejadas. Ainda que não se configure uma redução tão significativa como a que obtivemos, qualquer que seja representará reduções dos custos desses serviços a médio e, sobretudo em longo prazo.

Dragar com menor custo
Há, no mínimo, a certeza de redução de custos de dragagem, com a simples adoção de sobre dragagem, a curtos e médios prazos.

É de se considerar, no entanto, que para que essas medidas sejam sensíveis é necessário que o contrato de dragagem não se vincule exclusivamente aos volumes dragados, ou a serem dragados. As condições ideais na execução dos serviços dependem dos tipos de dragas empregadas, das épocas mais oportunas e de possibilidades não convencionais em realiza-los.

A sugestão de estabelecer a manutenção das profundidades desejáveis no Porto, canais, bacias de evolução e berços, parecem-me a mais adequada para a remuneração desses serviços. Recentemente, ao discutirmos oficiosamente esse novo paradigma da dragagem, foi colocado à possibilidade do executante não atender essa premissa e receber por um serviço não e/ou mal prestado. Para evitar que isso possa ocorrer foi imaginado, na oportunidade, que os pagamentos só seriam efetuados após 80% das profundidades alcançadas e a partir daí os mesmos seriam feitos parcialmente até atingir-se 100% da navegação nos limites estabelecidos pelos interesses do Porto.

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